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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Tomo II–Parte 1

 

Índice do BlogParte 1Parte 2

 

OS QUATRO EVANGELHOS (II) i Conteúdo

MATEUS, Cap. VII, v. 7-11-LUCAS, Cap. XI, v. 5-13..................................55

MATEUS. Cap. VII, v. 12 — LUCAS. Cap. VI. v. 31....................................60

Justiça. — Amor e Caridade....................................................................60

MATEUS. Cap. VII, v. 13-14.........................................................................61

Porta estreita que conduz à vida.............................................................61

LUCAS, Cap. XIII, v. 23-30.........................................................................62

Esforçai-vos por entrar pela porta estreita..............................................62

MATEUS, Cap. VII, v. 15-20 —LUCAS, Cap. VI, v. 43-45...........................66

Falsos profetas. — Frutos da mesma natureza que a árvore.................66

MATEUS, Cap. VII, v. 21-29. —LUCAS, Cap. VI, v. 46-49..........................68

Deus julga pelas obras............................................................................68

MATEUS, Capítulo VIII, v. 1-4 — MARCOS, Cap. I, v. 40-45. — LUCAS, Cap. V, v. 12-16........................................................................71

O leproso.................................................................................................71

MATEUS, Cap. VIII, v. 5-13. —LUCAS, Cap. VII, v. 1-10..........................75

O centurião..............................................................................................75

LUCAS, Cap. VII, v. 11-17...........................................................................84

O filho da viúva de Naim.........................................................................84

MATEUS, Cap. VIII, v. 14-17. — MARCOS, Cap. I, v. 29-34. —LUCAS, Cap. IV, v. 38-41.....................................................................92

Cura da sogra de Pedro. — Enfermidades curadas...............................92

MARCOS, Cap. I, v. 35-39. —LUCAS, Cap. IV, v. 42-44............................96

Retirada para o deserto. —Prece. — Pregação......................................96

MATEUS, Cap. VIII, v. 18-22. —LUCAS, Cap. IX, v. 57-62.........................98

Seguir a Jesus. —Deixar que os mortos enterrem seus mortos. —Não olhar para trás.......................................................................98

MATEUS, Cap. VIII, v. 23-27. —MARCOS, Cap. IV, v. 35-41. —LUCAS, Cap. VIII, v. 22-25...................................................................104

Tempestade aplacada...........................................................................104

i OS QUATRO EVANGELHOS (II) ii

MATEUS, Cap. VIII, v. 28-34. -- MARCOS, Cap. V, v. 1-20. —LUCAS, Cap. VIII, v. 26-40....................................................................114

Legião de maus Espíritos expulsos. —Libertação dos subjugados. — Porcos precipitados no mar..................................114

MATEUS, Cap. IX, v. 1-8. — MARCOS, Cap. II, t'.1-12. — LUCAS, Cap. V, v. 17-26.....................................................................130

Paralítico................................................................................................130

MATEUS, Cap. IX, v. 9-13. — MARCOS, Cap. II, v. 13-17. —LUCAS, Cap. V, v. 27-32.......................................................................133

Vocação de Mateus...............................................................................133

MATEUS, Cap. IX, v. 14-17. — MARCOS, Cap. II, v. 18-22. —LUCAS. Cap. V, v. 33-39.......................................................................137

Jejum. —Pano novo. — Odres velhos. — Vinho novo. — Vinho velho...............................................................................................137

MATEUS, Cap. IX, v. 18-26. — MARCOS, Cap. V, v. 21-43. — LUCAS, Cap. VIII, v. 41-56...................................................................145

A filha de Jairo. —A hemorroíssa..........................................................145

MATEUS, Cap. IX, v. 27-31......................................................................152

Cegos curados......................................................................................152

MATEUS, Cap. IX, v. 32-34. — LUCAS, Cap. XI, v. 14-20........................156

Possesso mudo. — Blasfêmia dos fariseus..........................................156

MATEUS, Cap. IX, v. 32-34. — LUCAS, Cap. XI, v. 14-20Erro! Indicador não defin

Possesso mudo. — Blasfêmia dos fariseusErro! Indicador não definido.

MATEUS, Cap. IX, v. 35-38........................................................................159

Ovelhas sem pastor. — Seara. — Trabalhadores................................159

MATEUS, Cap. X, v. 2-4. —MARCOS, Cap. III, v. 13-14, 16-19. —LUCAS, Cap. VI, v. 12-16......................................................................162

Nomes dos apóstolos. — Suas vocações.............................................162

LUCAS, Cap. VI, v. 17-19...........................................................................164

Descida do monte. — Curas.................................................................164

MATEUS, X, v. 1 e 5-15. — MARCOS, III, v. 15 e VI, v. 7-13. — LUCAS, IX, v. I-6...................................................................................165

A missão, o poder, a pobreza, a pregação dos apóstolos. —

ii OS QUATRO EVANGELHOS (II) iii

Instruções que lhes foram dadas...................................................165

MATEUS, X, v. 16-22. —LUCAS, XII, v. 11-12..........................................182

Prudência. — Simplicidade. —Desassombro diante dos homens. —Assistência e concurso do Espírito Santo...................182

MATEUS, X, v. 23-27. —LUCAS, XII, v. 1-3 e VI, v. 39-40.....................189

Fugir às perseguições. — Imitar a Jesus. — Predição da revelação nova. —Fermento dos fariseus. A hipocrisia; nada oculto a Deus. — Cego conduzindo outro cego...................189

MATEUS, Cap. X, v. 28-31. — LUCAS, Cap. XII, v. 4-7.........................199

Só temera Deus, sem cuja vontade nada sucede................................199

MATEUS. Cap. X, v. 32-36. —LUCAS, Cap. XII, v. 8-9 e 49-53...............205

Jesus veio trazer fogo à terra. —Não veio trazer a paz e sim o gládio, a divisão, a fim de que chegue a ser conhecido e até que o seja................................................................................205

MATEUS, Cap. X, v. 37-39. LUCAS, Cap. XIV, v. 25-27...........................209

Amor da família. — Cumprimento do dever acima de todas as coisas. — Paciência e resignação nas provações terrenas..........209

LUCAS, Cap. XIV, v. 28-33........................................................................214

Examinar antes de obrar. —Não parar na estrada do progresso. —Não dar apreço aos bens materiais senão como meio de fazer caridade................................................................................214

MATEUS, Cap. X, v. 40-42 e Cap. XI, v. 1.................................................216

Aquele que cumpre a lei de amor e de caridade terá sua recompensa...................................................................................216

LUCAS, Cap. X, v. 1-12 e 16......................................................................217

Missão e instrução dadas aos setenta e dois discípulos......................217

LUCAS, Cap. X, v. 17-20............................................................................223

MATEUS, Cap. XI, v. 2-6. —LUCAS, Cap. VII, v. 18-23............................225

Discípulos de João mandados por este a Jesus...................................225

MATEUS, Cap. XI, v. 7-15. —LUCAS, Cap. VII, v. 24-30 e Cap. XVI, v. 16...............................................................................................227

João. precursor, e Jesus. — Pedra fundamental do edifício da regeneração — Missão nova e futura de João..............................227

iii OS QUATRO EVANGELHOS (II) iv

MATEUS, Cap. XI, v. 16-19. —LUCAS, Cap. VII, v. 31-35........................235

João e Jesus incompreendidos pelos Hebreus. João e Jesus compreendidos hoje pelos que são os filhos do Senhor...............235

LUCAS, Cap. VII, v. 36-50..........................................................................239

Pecadora que banha de lágrimas os pés de Jesus e os enxuga com seus cabelos, derramando bálsamo sobre eles....................239

MATEUS, Cap. XI, v. 20-24. —LUCAS, Cap. X, v. 13-15..........................244

Cidades impenitentes............................................................................244

MATEUS, Cap. XI, v. 25-27. —LUCAS, Cap. X, v. 21-22........................251

Cegos, tidos entre os homens por sábios e prudentes. Esclarecidos, que os homens consideram como obscuros...........251

MATEUS, Cap. XI, v. 28-30.......................................................................256

Jugo suave e fardo leve........................................................................256

MATEUS, Cap. XII, v. 1-8. — MARCOS. Cap. II, v. 23-28. — LUCAS, Cap. VI, v. 1-5..........................................................................258

O sábado foi feito para o homem e não o homem para o sábado. — Deus, sempre indulgente com as suas criaturas fracas e falíveis, lhes faculta o arrependimento e a reparação....................................................................................258

MATEUS. Cap. XII, v. 9-14. — MARCOS, Cap. III, v. 1-6. --LUCAS, Cap. VI, v. 6-11........................................................................264

Cura da mão paralítica, em dia de sábado...........................................264

MATEUS, Cap. XII, v. 15-21.......................................................................268

Missão do Messias. — Seus poderes. — Vias de purificação sempre abertas aos Espíritos culpados, que, como todos os outros, têm que chegar ao fim..................................................268

MATEUS, Cap. XII, v. 22-28. — MARCOS, Cap. III, v. 20-26...................272

Subjugado. — Cego e mudo por efeito da subjugação. — Blasfêmias dos fariseus. Reino dividido........................................272

MATEUS. Cap. XII, v. 29-37. — MARCOS. Cap. III, v. 27-30. — LUCAS. Cap. XI, v. 21-23 e Cap. XII, v. 10...........................................283

O forte armado. —Pecado remido. —Blasfêmia contra o Espírito Santo. — Tesouro do coração. Palavra ímpia. — Quem não está com Jesus está contra ele. —Pelo fruto é

iv OS QUATRO EVANGELHOS (II) v

que se conhece a árvore...............................................................283

MATEUS, Cap. XII, v. 38-42. — LUCAS, Cap. XI, v. 29-32.......................295

Prodígio pedido pelos fariseus. — Resposta de Jesus. — Prodígio de Jonas. —Ninivitas. Rainha do Meio-dia.....................295

MATEUS, Cap. XII, v. 43-45. — LUCAS, Cap. XI, v. 24-28.......................300

Dever, que tem o homem, de resistir aos maus instintos, às más paixões. — Respostas de Jesus ao que, do meio do povo, lhe disse uma mulher...........................................................300

MATEUS, Cap. XII, v. 46-50. — MARCOS, Cap. III, v. 31-35. —LUCAS, Cap. VIII, v. 19-21....................................................................307

O irmão, a irmã e a mãe de Jesus são os que fazem a vontade de seu pai, ouvindo a palavra de Deus e pondo-a em prática............................................................................................307

MATEUS, Cap. XIII, v. 1-23. —MARCOS, Cap. IV, v. 1-20 e 25. —LUCAS, Cap. VIII, v. 1-15 e 18; Cap. X, v. 23-24.................................316

Parábola do semeador. —Explicação dessa parábola.........................316

MATEUS, Cap. XIII, v. 24-30......................................................................337

Parábola do joio semeado entre o trigo.................................................337

MATEUS, Cap. XIII, v. 31-35. —MARCOS, Cap. IV, v. 26-34. —LUCAS, Cap. XIII, v. 18-22....................................................................341

Grão de mostarda. — Fermento da massa. — Semente lançada à terra...............................................................................341

MATEUS, Cap. XIII, v. 36-43......................................................................351

Explicação da parábola do joio..............................................................351

MATEUS, Cap. XIII, v. 44...........................................................................359

Tesouro oculto.......................................................................................359

MATEUS, Cap. XIII, v. 45-46......................................................................360

Pérola de alto preço..............................................................................360

MATEUS, Cap. XIII, v. 47-52......................................................................361

Parábola da rede lançada ao mar.........................................................361

MATEUS, Cap. XIII, v. 53-58. —MARCOS, Cap. VI, v. 1-6.......................363

Nenhum profeta é desestimado senão no seu país, na sua casa e entre seus parentes...........................................................363

v OS QUATRO EVANGELHOS (II) vi

MATEUS, Cap. XIV, v. 1-12. —MARCOS, Cap. VI, v. 14-29. —LUCAS. Cap. III, v. 19-20 e Cap. IX, v. 7-9...........................................366

Morte de João Batista. — Palavras que, ditas com relação a Jesus, confirmam a crença dos Hebreus na reencarnação..........366

MATEUS, Cap. XIV, v. 13-22. — MARCOS, Cap. VI, v. 30-45. —LUCAS. Cap. IX, v. 10-17......................................................................371

Multiplicação dos cinco pães e dos dois peixes....................................371

MATEUS, Cap. XIV, v. 23-33. —MARCOS, Cap. VI, v. 46-52...................380

MATEUS, Cap. XIV, v. 34-36. —MARCOS, Cap. VI, v. 53-56...................387

Curas operadas pelo contacto com as vestes de Jesus.......................387

MATEUS, Cap. XV, v. 1-20. —MARCOS, Cap. VII, v. 1-23........................388

Mãos não lavadas. — Tradições humanas. — Escândalo a desprezar. — Guias cegos. Verdadeira impureza. — O que vem do coração é que suja o homem, que o torna impuro............................................................................................388

MATEUS, Cap. XV, v. 21-28. —MARCOS, Cap. VII, v. 24-30...................400

A mulher cananeiana.............................................................................400

MARCOS, Cap. VII, v. 31-37......................................................................405

Cura de um surdo-mudo........................................................................405

MATEUS, Cap. XV, v. 29-39. —MARCOS, Cap. VIII, v. 1-10....................408

Multidão de doentes curados. — Multiplicação de sete pães...............408

MATEUS, Cap. XVI, v. 1-4 —MARCOS, Cap. VIII, v. 11-13......................411

Recusa do prodígio pedido pelos Fariseus e Saduceus.......................411

MATEUS, Cap. XVI, v. 5-12. —MARCOS, Cap. VIII, v. 14-21...................414

Fermento dos Fariseus e dos Saduceus...............................................414

MARCOS, Cap. VIII, v. 22-26.....................................................................416

Cura de um cego...................................................................................416

MATEUS, Cap. XVI, v. 13-20. —MARCOS, Capítulo VIII, v. 27-30. —LUCAS, Cap. IX, v. 18-21..................................................................424

Palavras de Jesus confirmativas da reencarnação. Alusão às relações mediúnicas que podem existir entre os homens e as potências espirituais. Missão de Pedro na Igreja do Cristo. Verdadeira confissão..........................................................424

vi OS QUATRO EVANGELHOS (II) vii

MATEUS, Cap. XVI, v. 21-23. —MARCOS, Cap. VIII, v. 31-33. — LUCAS, Cap. IX, v. 22...........................................................................452

Predição. — Palavras de Pedro. —Resposta de Jesus........................452

MATEUS, Cap. XVI, v. 24-28. —MARCOS, Capítulo VIII, v. 34-38 e IX, v. I —LUCAS, Capítulo IX, v. 23-27..............................................461

Meios e condições sem os quais não se pode ver na terra o reino de Deus, em todo o seu poder.............................................461

MATEUS, Cap. XVII, v. 1-9. — MARCOS, Cap. IX, v. 2-10.LUCAS, Cap. IX, v. 28-36

Transfiguração de Jesus no Tabor. — Aparição de Elias e de Moisés. — Nuvem que cobriu os discípulos. — Voz que saiu dessa nuvem e palavras que proferiu....................................468

MATEUS, Cap. XVII, v. 10-13. —MARCOS, Cap. IX, v. 11-13..................491

O Espírito de Elias reencarnado na pessoa de João, o Precursor, filho de Zacarias e de Isabel........................................491

vii OS QUATRO EVANGELHOS (II) 55

EVANGELHOS

SEGUNDO MATEUS, MARCOS, LUCAS E JOÃO

REUNIDOS E HARMONIZADOS CONTINUAÇÃO

"O Espírito é que vivifica; a carne de nada serve; as palavras que vos digo são ,espírito e vida."

(JOÃO, VI, v. 64.)

“A letra mata e o espírito vivifica."

(PAULO, II Epíst. aos Coríntios, cap. III, v. 6.)

MATEUS, Cap. VII, v. 7-11-LUCAS, Cap. XI, v. 5-13.

A prece. — Pedi e se vos dará. — Buscai e achareis. — Batei e se vos abrirá.

MATEUS: V. 7. Pedi e se vos dará; buscai e achareis; batei e se vos abrirá; — 8, porquanto, quem pede recebe, quem procura acha e àquele que bate se abre. — 9. Qual dentre vós dá uma pedra ao filho, quando este lhe pede pão? — 10. Ou, se pedir um peixe, qual lhe dará uma serpente? — 11. Ora, se, sendo maus como sois, sabeis dar boas coisas aos vossos filhos, com mais forte razão vosso Pai, que está nos céus, boas coisas dará aos que lhas pedirem.

LUCAS: V. S. Disse-lhes ainda: Se alguém que tiver um amigo o for procurar alta noite dizendo: Meu amigo, empresta-me três OS QUATRO EVANGELHOS (II) 56

pães, — 6, pois um de meus amigos, que está viajando, acaba de chegar a minha casa e nada tenho para lhe dar; — 7, e o amigo lhe responder, de dentro de casa: Não me importunes; minha porta já está fechada e meus servos deitados assim como eu; não posso levantar-me para te dar o que pedes; — 8, se, apesar disso, o primeiro insistir em bater, — digo-vos que, quando o segundo não se levante para dar o que lhe é pedido por ser seu amigo o pedinte, se levantará pelo menos por causa da importunação e dará ao outro tudo o que lhe seja necessário. — 9. E eu vos digo: Pedi e se vos dará; procurai e achareis, batei e se vos abrirá; — 10, porquanto, quem pede recebe, quem procura acha e àquele que bate se abre. — 11. Se alguém de vós pedir pão a seu pai, este lhe dará uma pedra? Ou, se lhe pedir um peixe, lhe dará uma serpente? — 12. Ou, se lhe pedir um ovo, lhe dará um escorpião? — 13. Ora, se maus como sois, sabeis dar boas coisas a vossos filhos, com mais forte razão vosso Pai, que está nos céus, dará um bom espírito aos que lho peçam.

N. 98. Por estas palavras Jesus punha seus discípulos em guarda contra o desalento que muitas vezes nasce de um aparente insucesso.

Elas se aplicam a todas as gerações. A perseverança pode tocar a todos.

A perseverança vos fortifica as resoluções, vos aperfeiçoa as obras, vos dá segurança na fé e vos faz dignos da atenção do Mestre que concederá aos vossos reiterados esforços o que não vos quisera dar, enquanto não estáveis ainda seguros de vós mesmos.

O homem nada deve fazer, nem empreender, sem primeiramente implorar ao Senhor, do fundo do coração, a sua assistência.

O Senhor, cheio de bondade, sabe o que convém a seus filhos e sempre lhes dá fartamente o que convenha, se bem que estes, ingratos e cegos, só muito raramente compreendem os desígnios da Providência.

Um pai não dá uma serpente ao filho que lhe pede pão. Vosso pai não vos recusa nunca os favores OS QUATRO EVANGELHOS (II) 57

que vos são necessários. Mas, sabeis o que vos é necessário?

Estais em estado de decidir por vós mesmos qual o alimento que convém ao vosso estômago? Estais em estado de compreender o gênero de provação por que deveis passar? Não. Vosso pai, porém, o sabe e vos alimenta de acordo com a vossa constituição.

Quanto mais a luz se espalhar por entre vós, mais aptos estareis a compreender estas palavras: — O pai de família não dá pedras ao filho que lhe pede pão. Pedi, portanto, a vosso pai o pão da vida e ele vos facultará abundantes meios de o adquirirdes.

"Pedi e se vos dará, disse Jesus, procurai e achareis, batei e se vos abrirá: porquanto, quem pede recebe, quem procura acha e a quem bater se abrirá."

Compreendei bem estas palavras, mas, como sempre, segundo o espírito que vivifica e não segundo a letra que mata.

Pedi ao Senhor que vos torne compreensíveis suas verdades e o vosso entendimento se abrirá. Batei às portas da eternidade e chegareis ao santuário. Dirigi-vos ao dispensador de todas as graças puras e divinas, dirigi-vos a ele com pureza e amor, pedi-lhe a luz que esclareça os vossos irmãos e ele próprio vos colocará nas mãos o facho cujos raios iluminarão o mundo.

O homem não conseguirá jamais mudar os desígnios de Deus; mas, se pedirdes a força e a luz, lograreis compreender o porquê dos vossos sofrimentos e sabereis sofrer com paciência e resignação, mesmo com amor, por mais rigorosas que sejam as vossas provas.

Se puderdes, por um arrependimento sincero, apagar as faltas recentes, podereis, pela prece, rogan- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 58

do a graça de não mais as cometerdes, alcançar, se deles vos fizerdes dignos tornando-os possíveis1, o amparo e os conselhos que vos sustentarão e guiarão, esclarecendo-vos acerca das provações que escolhestes e acerca da maneira por que conseguireis vencê-las com felicidade aos olhos do Senhor.

Quando se vos diz: "Pedi e se vos dará", isto não significa que possais pedir a Deus que mude vossas provas, que detenha de súbito o curso dos acontecimentos cuja realização a sua sabedoria decidiu. Significa que o Senhor vos concederá a compreensão das vistas secretas da providência, que vos concederá entrar assim em comunhão de pensamento com ele e compreender o bem que, na eternidade, vos advirá dos sofrimentos morais ou físicos que vos atormentam na existência humana. O livre arbítrio do homem pode mudar a face aos acontecimentos da sua existência, mas o fundamento sério destes será sempre o mesmo.

Não vos podem ser contadas como provações as mil contrariedades oriundas da existência em comum e da vossa civilização, ainda bárbara sob tantos pontos de vista. São particularidades ínfimas que não têm importância alguma no conjunto das provas que vos cumpre suportar.

"Vosso pai que está nos céus", disse Jesus, "dará um bom espírito aos que lho pedirem."

O Senhor não se mantém nunca surdo, bem o sabeis, às vozes de seus filhos, quando se dirigem a ele com confiança e fé. O pai da grande família nem sempre concede as graças como lhe são pedidas, porque, em vez de constituírem um bem, redundariam em confusão para o homem. Àquele, porém, que o depreca com sinceridade, ele abre o entendimento que dá o bom espírito, isto é, o amor de Deus, a inteligência

1 Quer por inspiração, quer por comunicação.OS QUATRO EVANGELHOS (II) 59

das coisas sob a influência espírita, permitindo que seus mensageiros o cerquem para esclarecê-lo.

O homem a quem o pai celeste deu bom espírito é aquele que compreende as palavras do Mestre, que se aplica em praticá-las e nunca desespera do seu amor e da sua justiça. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 60

MATEUS. Cap. VII, v. 12 — LUCAS. Cap. VI. v. 31

Justiça. — Amor e Caridade

MATEUS: V. 12. Tudo que quereis que os homens vos façam, fazei-o também a eles; pois é nisto que consistem a lei e os profetas:

LUCAS: V. 31. Fazei aos homens o que quereis que eles vos façam.

N. 99. Ama o teu próximo como a ti mesmo. Teu próximo, qualquer que ele seja, conhecido ou desconhecido, amigo ou inimigo, é teu irmão, pois que é filho do mesmo pai, que está nos céus.

Por toda parte e sempre, em todas as circunstâncias, coloca-te no seu lugar, a fim de procederes com ele como quererias que procedesse contigo. Assim, nunca digas ou faças o que não queiras que ele diga ou faça com relação a ti. Ao contrário, dize ou faze, do ponto de vista do que for bom e justo, na ordem material, moral e intelectual, tudo o que quiseres que, invertidas as posições, ele dissesse ou fizesse por ti, praticando a caridade material e moral, em toda a extensão do teu poder, de teus meios e das tuas faculdades, pela palavra e pelos atos e sob todas as formas: com o coração, com a boca, com os braços e com a inteligência. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 61

MATEUS. Cap. VII, v. 13-14

Porta estreita que conduz à vida

V. 13. Entrai pela porta estreita, pois que larga é a porta e espaçoso o caminho que levam à perdição; e grande é o número dos que por ela entram. — 14. Quão estreita é a porta, quão apertado o caminho que conduzem à vida; quão poucos o encontram!

N. 100. A porta estreita e o caminho difícil indicam os esforços que o Espírito encarnado tem de empregar e as penas que tem de suportar para chegar à vida eterna, isto é, para se despojar de seus vícios, para marchar pela estrada do bem, fazendo nascer no seu íntimo os sentimentos opostos aos vícios de que se for libertando.

Os que encontram a porta estreita e o caminho apertado são os que praticam o trabalho, o amor, a caridade e, conseguintemente, a humildade, a tolerância, o desinteresse, o devotamento a todos; são os que, desse modo, bem cumprem as suas provações, resistindo aos maus instintos, às tendências más que precisam ser combatidas e que tornam indispensáveis as sucessivas reencarnações para a purificação e o progresso do Espírito.

A porta larga e o caminho espaçoso, que conduzem à perdição e pela qual entram em tão grande número os homens, são o orgulho, o egoísmo, a ambição, com todos os seus derivados, a avareza, a cupidez, a inveja, a luxúria, a intemperança, a cólera, a preguiça, o materialismo, a incredulidade, a intolerância, o fanatismo, a predominância da matéria sobre o Espírito, ou mesmo a sujeição do Espírito à matéria e, de modo geral, a maldade, pela palavra ou pelos atos, sob todas as formas e em todas as gradações. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 62

LUCAS, Cap. XIII, v. 23-30

Esforçai-vos por entrar pela porta estreita

V. 23. E alguém lhe perguntou: Senhor, tão poucos são os que se salvam? Ao que ele respondeu: — 24. Esforçai-vos por entrar pela porta estreita; porquanto eu vos digo que muitos procurarão entrar e não poderão.

N. 101. Muitos dentre vós tentam percorrer a estrada que leva à casa do pai, mas, aborrecidos com os obstáculos a vencer, com os esforços a empregar, com os sacrifícios a suportar, param e não vão adiante. São os que não podem passar pela porta estreita. Aquele, porém, que segue a estrada que a sua consciência lhe traçou, não lhe suplantando os conselhos por meio de sofismas e subterfúgios, esse passará facilmente pela porta, por mais estreita que pareça. Quando se aproximar dela, vê-la-á larga e aberta para lhe dar passagem.

Dizemos com Jesus: 'Muitos procurarão entrar e não poderão". São os que tentam e não perseveram.

Sobretudo a vós, espíritas, se aplicam estas palavras. Muitos, vendo entreaberta a porta, se encaminharam para ela, mas com passo incerto e levando atrás de si o cortejo de fraudes, de vícios, de impurezas que os acompanha. Não avançam. Julgam caminhar, porém a estrada de contínuo se renova diante deles e a porta se torna a fechar gradualmente.

Antes, pois, de enveredardes por esse caminho árido e pedregoso, despojai-vos de tudo quanto vos possa estorvar a marcha. Não chegareis nunca, se não fordes conduzidos por uma consciência pura.

Só esta pode ter a certeza de ver abrir-se a porta estreita e de por ela passar. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 63

V. 25. E quando o pai de família houver entrado e fechado a porta, se, do lado de fora, começardes a bater dizendo: Senhor, abre-nos; o Senhor, respondendo, dirá: Não sei donde sois.

N. 102. Também a longanimidade do Senhor tem termo. Quando o Espírito, chamado a progredir na terra, se obstina em permanecer estacionário nas suas faltas, sem seguir a marcha ascensional impressa a tudo na natureza, não chega ao mesmo tempo que seus irmãos e não pode por conseguinte entrar com eles nas esferas dos felizes. E, se a obstinação, o endurecimento resistem a todos os esforços feitos, o Senhor repele o Espírito teimoso para planetas inferiores, onde recomeça as suas peregrinações, até compreender a necessidade do progresso.

V. 26. Se então disserdes: Bebemos e comemos na tua presença e ensinaste nas nossas praças públicas, — 27, ele vos responderá: Não sei donde sois; afastai-vos de mim vós todos que praticais a iniqüidade.

N. 103. Alusão aos que, sob a capa do culto que professam continuam a viver de modo condenado pela lei divina. Não basta intitular-se sectário de uma religião qualquer, cumpre que se lhe pratique a moral. Não basta dizer, "Senhor! Senhor!"; é preciso fazer a vontade do pai que está nos céus.

V. 28. Haverá prantos e ranger de dentes, quando virdes que Abraão, Isac, Jacob estão no reino de Deus e que vós sois repelidos de lá.

N. 104. Estas palavras de Jesus, apropriadas, pela forma da linguagem, aos homens a quem ele falava, não são alegóricas, sob o ponto de vista dos sofrimentos e torturas morais, simbolicamente figurados pelas expressões — pranto e ranger de dentes. Experimentá-los-ão os Espíritos que, por permanecerem cul- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 64

pados, rebeldes, no momento da depuração do vosso planeta e da sua humanidade, serão enviados para planetas inferiores. Tais Espíritos não vão para o degredo sem conhecerem a causa da sua condenação. Porventura punis os culpados sem julgamento?

Sim, eles saberão que o endurecimento de suas almas é a causa única de suas dores. Verão a grandeza da queda e medirão a extensão da perda que sofreram. Mas, a palavra do Mestre lhes dará a esperança e a visão dos bem-aventurados lhes despertará o desejo de chegarem a ser desse número.

Haverá entre eles prantos e ranger de dentes, mas também haverá uma meta a atingir. O Senhor jamais condena sem deixar uma porta aberta à esperança.

Dirigindo-se aos Hebreus, Jesus falava a Espíritos encarnados, dentre os quais alguns permanecerão culpados na época da depuração.

Pertencer ao número dos selvagens da Oceânia, carecer de ciência, de inteligência, não é o que constitui motivo para ser relegado. A esses o Senhor concede tempo. O motivo consiste em ser orgulhoso, materialista, em causar a perda das massas populares, arrastando-as para falsos caminhos, em pregar conscientemente uma corruptora moral.

Sim, dos que cercavam a Jesus alguns há que são da vossa era, que revivem entre vós, que ainda progredirão em ciência, em inteligência, mas que, desgraçadamente para eles, não progredirão em simplicidade de coração. Acreditam possuir tudo e, chegando o dia, verão a nudez de suas almas.

V. 29. Do Oriente e do Ocidente, do Setentrião e do Meio-dia virão os que se hão de sentar à mesa no reino de Deus. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 65

N. 105. Alusão à comunhão de pensamentos e de crenças que se estabelecerá entre os homens, na época da regeneração.

Alusão também aos Espíritos que virão de diversos planetas para a terra na época em que Jesus, espírito da verdade, aparecerá entre vós. As palavras do Mestre alcançam sempre o presente e o futuro.

V. 30. E eis que serão os últimos os que eram os primeiros e os primeiros serão os que eram os últimos.

N. 106. Muitos dos que se colocaram na frente, entre os primeiros, serão dos últimos a chegar ao fim, por não terem marchado com perseverança.

Os que confiam em si mesmos e crêem marchar com mais segurança e passar adiante de seus irmãos, se verão obstados pelo seu próprio orgulho e terão igualmente retardada a marcha.

Para o Senhor nada vale a duração da existência do Espírito. O arrependimento e as virtudes são tudo. Assim, o Espírito que tardiamente entrou na senda do bem, mas que caminha com perseverança, com atividade, pode, não só atingir, como ainda ultrapassar o Espírito preguiçoso, senão culpado, que nenhum esforço faz, mesmo que tenha começado mais cedo a sua rota ascensional. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 66

MATEUS, Cap. VII, v. 15-20 —LUCAS, Cap. VI, v. 43-45

Falsos profetas. — Frutos da mesma natureza que a árvore

MATEUS: V. 15. Acautelai-vos dos falsos profetas que vêm ter convosco sob aspecto exterior de ovelhas, mas que, por dentro, são lobos vorazes. — 16. Conhecê-los-eis pelos seus frutos. Porventura se colhem uvas nos espinheiros, ou figos nas sarças? — 17. Assim, toda árvore boa dá bons frutos, e toda árvore má dá maus frutos. — 18. Uma árvore boa não pode dar maus frutos, nem uma árvore má dar bons frutos. — 19. Toda árvore que não dá bons frutos será cortada e lançada ao fogo. — 20. É, pois, pelos frutos que os conhecereis.

LUCAS: V. 43. A árvore que produz maus frutos não é boa e a árvore que produz bons frutos não é má; — 44, pois cada árvore se conhece pelo seu fruto; não se colhem figos nos espinheiros nem uvas nas sarças. -45. O homem bom tira o bem do bom tesouro do seu coração; e o homem mau do mau tesouro tira o mal; porquanto a boca fala do que está cheio o coração.

N. 107. Que aquele que prega com os lábios comece por pregar pelo exemplo. Eis tudo. Pela obra se conhece o obreiro.

Os falsos profetas são os que pregam uma moral que não praticam.

Aquele que não mostra aos outros os frutos da moral que prega é uma árvore má. Se sois boa árvore, dai bons frutos. Se, pois, regrardes os vossos atos pela moral do Cristo e pelos seus ensinamentos, serão bons os vossos frutos. Se, porém, vos afastais dessa moral e desses ensinos, sejam quais forem as vossas palavras, não estando com elas acordes os vossos atos, sois árvores más destinadas a ser cortadas e lançadas ao fogo, isto é, destinadas à expiação e à reencarnação, como já explicamos. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 67

Espíritas, aos que vos chamarem falsos profetas exemplificai o que ensinais; mostrai os frutos da moral que pregais. Os cegos não admitem que possa existir o fulgor da luz. Abri-lhes os olhos e eles a verão. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 68

MATEUS, Cap. VII, v. 21-29. —LUCAS, Cap. VI, v. 46-49

Deus julga pelas obras

MATEUS: V. 21. Nem todo aquele que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus; aquele, porém, que fizer a vontade de meu Pai que está nos céus, esse entrará no reino dos céus. — 22. Muitos me dirão nesse dia: Senhor, Senhor, não profetizamos em teu nome, não expulsamos em teu nome os demônios e não fizemos em teu nome muitos prodígios? — 23. Eu então lhes direi: Nunca vos conheci; Afastai-vos de mim, vós que praticais a iniqüidade. — 24. Aquele que escuta as minhas palavras e as pratica é comparável ao homem ajuizado que construiu sua casa sobre a rocha. — 25. Veio a chuva, transbordaram os rios, os ventos sopraram e se arremessaram contra essa casa e ela não caiu por estar edificada sobre a rocha. — 26. Aquele, porém, que ouve as minhas palavras e não as pratica se assemelha ao insensato que construiu sua casa na areia. — 27. Veio a chuva, os rios transbordaram, sopraram os ventos, precipitaram-se sobre essa casa e ela desabou e grande foi a sua ruína. — 28. Ora, terminando Jesus esses discursos, a multidão se admirava da sua doutrina, — 29. porque ele a instruía como tendo autoridade e não como os escribas e os fariseus.

LUCAS: V. 46. Mas porque me chamais: Senhor! Senhor! e não fazeis o que vos digo? — 47. Vou mostrar-vos a quem se assemelha aquele que vem a mim — que escuta as minhas palavras e as pratica. — 48. Assemelha-se a um homem que edifica uma casa e que, cavando fundo, lhe constrói na rocha os alicerces. Um rio, transbordadas suas águas, se arremessou contra a casa e não conseguiu abalá-la, por estar edificada sobre a rocha. — 49. Aquele, que escuta as minhas palavras e não as pratica, se assemelha a um homem que edificou sua casa sobre a terra, sem lhe cavar alicerces. O rio se arremessou sobre ela, a casa caiu logo e grande foi a sua ruína. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 69

N. 108. Nem todos os que dizem: Senhor, Senhor! entrarão no reino de Deus. As palavras morrem no espaço sem chegar ao Senhor, quando não têm por apoio os atos. Portanto, praticai sempre o que ensinais, o que admirais, o que louvais. Não bastará que admireis a lei de Jesus, que digais: ela é perfeita, se nada fizerdes por cumpri-la e por vos aperfeiçoardes. Não vos bastará dizer: somos cristãos, se obrardes contra a vontade do Cristo. Não vos bastará declarar: somos espíritas, se continuardes a ser o que éreis antes. Não bastará declareis: somos médiuns e usamos das nossas diversas faculdades mediúnicas, se não praticardes os ensinamentos recebidos, se não puserdes, cordial e intencionalmente, essas faculdades ao serviço da causa de Deus, do melhoramento moral dos vossos irmãos, dando-lhes o exemplo dos esforços constantes e porfiados que empregais por vos melhorardes pessoalmente, se não vos utilizardes com humildade e desinteresse dessas mesmas faculdades para o fim exclusivo de fazer propaganda séria, útil, eficaz, da lei de Jesus e da sublime doutrina dos Espíritos do Senhor, que, despojando da letra o Espírito, vêm explicar essa lei, fazê-la compreensível, amada, praticada, preparando o cumprimento das promessas do Mestre.

Hoje, e sobretudo a vós, espíritas, a prática é necessária.

Quem quer que haja enveredado por esse caminho fique certo de que não mais pode deter-se, de que não mais deve desviar-se, porquanto, muito lhe tendo sido dado, muito lhe será pedido. Não terá desculpa. Não o protege mais o véu espesso da ignorância, pois que a luz o rasgou. Tampouco lhe servirá de escusa a sua fria indiferença. Dele se aproximou a caridade para aquecê-lo. Se o coração se lhe conserva enregelado é porque o quer. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 70

Ao espírita muito será reclamado. Que ele, portanto, se prepare para prestar contas exatas do que lhe foi confiado.

No momento em que estas palavras acabavam de ser escritas, o médium, colocado espontaneamente sob nova influêncía medianimica. escreveu, com uma grafia diferente e magistral, o seguinte:

Não basta se diga que certa moral é sublime; cumpre seja posta em prática. Não basta ser-se cristão e mesmo cristão-espírita, se se não pratica a moral por mim ensinada. Assim, pois, que os que querem entrar no reino de meu pai sejam seus filhos pelo coração e não pelos lábios, obedeçam com submissão, zelo e confiança às instruções que receberam e recebam hoje dos Espíritos enviados, de acordo com as minhas promessas, para ensinarem progressivamente aos homens todas as coisas, para conduzi-los à verdade e lembrar-lhes o que eu lhes disse.

"Que digam: Senhor, Senhor! mas que o digam do fundo de seus corações; que seus atos correspondam às suas palavras e o reino dos céus lhes pertencerá.

Por aquele cuja mão protetora sustenta os humildes e os fracos e humilha os orgulhosos e poderosos.

ISABEL."

Depois, também de modo espontâneo, o médium escreveu mediunicamente e em caracteres idênticos aos com que fora traçado o ensinamento que acabava de ser recebido, esta última comunicação:

"Bendizei ao Senhor a graça que vos fez e pedi-lhe, de coração, o apoio daquele que se vos manifestou hoje por intermédio do seu enviado. Perseverai no caminho que trilhais, tende confiança e fé, mas fé séria, e o Senhor estenderá suas mãos por sobre vós, para afastar os obstáculos que vos pudessem deter.

JOÃO, MATEUS E LUCAS." OS QUATRO EVANGELHOS (II) 71

MATEUS, Capítulo VIII, v. 1-4 — MARCOS, Cap. I, v. 40-45. — LUCAS, Cap. V, v. 12-16

O leproso

MATEUS: V. 1. Tendo Jesus descido do monte, grande multidão o acompanhou; — 2, e, aproximando-se dele, um leproso se pôs a adorá-lo, dizendo: Senhor, se quiseres, podes curar-me. — 3. Jesus, estendendo a mão, tocou-o e disse: Quero-o; estás curado. E no mesmo instante lhe desapareceu a lepra. — 4. E Jesus acrescentou: Não fales disto a ninguém; mas vai mostrar-te aos sacerdotes e faze a oferenda prescrita por Moisés, a fim de que lhes sirva de testemunho.

MARCOS: V. 40. Aproximou-se dele um leproso e, de joelhos, o implorava, dizendo: Se quiseres, podes curar-me. — 41. Jesus se apiedou do homem e, estendendo a mão, tocou-o e lhe disse: Quero-o, fica curado. — 42. Assim que pronunciou estas palavras, a lepra deixou o homem, ficando este curado. — 43. Mandando-o embora, proibiu-lhe terminantemente Jesus que falasse do fato, dizendo: — 44. Não fales disto a ninguém, mas vai mostrar-te aos príncipes dos sacerdotes e oferece, pela tua cura, o que Moisés ordenou, a fim de que lhes sirva de testemunho. — 45. O homem, porém, tanto que dali se afastou, começou a falar da sua cura e a anunciá-la por toda parte, de sorte que Jesus não podia mais aparecer ostensivamente na cidade; permanecia fora, nos lugares desertos, mas de toda parte vinham ter com ele.

LUCAS: V. 12. Sucedeu que, achando-se Jesus em certa cidade, um homem coberto de lepra o viu, dele se aproximou e, prostrando-se, com o rosto em terra, o implorou dizendo: Senhor, se quiseres, podes curar-me. — 13. Estendendo a mão, Jesus o tocou, dizendo: Eu o quero, fica curado; e a lepra desapareceu no mesmo instante. — 14. Jesus lhe ordenou que não falasse a ninguém. Mas vai, disse-lhe, mostrar-te aos sacerdotes e oferece pela tua cura o que Moisés determinou, a fim de que lhes sirva de testemunho. — 1S. Sua fama cada vez mais se dilatava e a ele acorria grande multidão de pessoas que vinham aos bandos para o ouvir e ser curadas de suas enfermidades. — 16. Ele, porém, se retirava para o deserto e orava.

N. 109. Jesus conhecia e recompensava a fé, mas também sabia não serem chegados os tempos de publicar abertamente as graças que prodigalizava. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 72

Ainda hoje assim é: o Senhor vos concede o seu apoio e se digna de curar a lepra dos vossos corações; mas, nem todos se acham em estado de compreender a graça que recebem. Eis porque vos dizemos: procedei com prudência.

Na indiscrição e na desobediência do leproso tendes um sinal de que os benefícios do Senhor serão conhecidos, faça-se o que se fizer.

A cura instantânea daquele homem, efeito da vontade poderosa de Jesus e da sua ação sobre os fluidos apropriados, se operou pela concentração magnética desses fluidos.

O magnetismo humano pode operar curas que ainda não compreendeis e quanto mais o homem se aproxima da vida espiritual, mais se depurará, mais em relação se porá, conseguintemente, com os fluidos que o cercam e tanto mais facilmente os dominará e empregará como meios curativos.

Ainda não sabeis o que pode o homem com o magnetismo e sobretudo o que poderá daqui a algum tempo.

A cura instantânea do leproso não foi, portanto, mais do que um fato natural, mais do que uma concentração dos fluidos de que Jesus podia dispor e que, penetrando a pele do doente, devoraram, aniquilaram as matérias impuras nela contidas, impedindo fossem interiormente lançadas no organismo e na circulação geral. A purificação dos fluidos sangüíneos destruiu o princípio interno da lepra. O tecido da pele foi instantaneamente limpo e o doente se achou curado. Nisso consistiu, aos olhos dos homens, o "milagre", pela razão de que ao homem ainda não é possível conseguir semelhante efeito em virtude da sua impureza moral. Quando for capaz de produzir por essa forma a cura física, sua cura moral estará realizada. A sub- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 73

missão e a fé expelirão de vossos corações as influências impuras que os corroem, tornando-os limpos aos olhos do Senhor.

Repetimos: quanto mais o homem se aproximar da vida espiritual, tanto mais se depurará, tanto mais se porá em relação com os fluidos magnéticos que o cercam, tanto mais os dominará e poderá empregar como meios curativos. A depuração do homem, assim no físico como no moral, se operará mediante uma revolução lenta e progressiva, de modo, por assim dizer, insensível aos que a testemunharem; mas, a revolução moral terá que preceder de muito à revolução física.

Que fazem os médicos para chegarem a purificar a pele de um leproso? Tratam a massa do sangue, procurando despojá-la de tudo que a corrompe.

O mesmo trabalho nos toca: antes que o vosso organismo material se torne de natureza elevada, temos que limpar a fonte das vossas impurezas. O corpo vos mantém cativa a alma. Tempo virá em que vossas almas desferirão o vôo, elevando-vos os corpos às regiões puras.

Dizendo ao leproso: "Vai mostrar-te aos príncipes dos sacerdotes e oferece pela tua cura o que Moisés ordenou, a fim de que lhes sirva de testemunho", Jesus o fez para que aquele homem pudesse volver à vida comum, pois que os leprosos eram excluídos do convívio de seus irmãos. Os sacerdotes dispunham, senão da ciência, pelo menos do direito de julgar se o homem atacado de lepra estava curado e podia voltar para o meio dos seus.

Não vos admireis de que o leproso tenha podido ir, por entre a multidão, à presença de Jesus, para provocar e obter a sua cura. Jesus percorria os campos, indo constantemente de um ponto a outro. Não podeis comparar a vossa organização civil à daqueles OS QUATRO EVANGELHOS (II) 74

tempos. Os leprosos eram expulsos do recinto das cidades, mas os campos não lhes ficavam interditos. Eles se viam afastados dos seus, mas não encarcerados. Ainda não havia asilos para as misérias e os sofrimentos dos pobres.

Quanto à oferenda que devia ser feita, atenda-se a que tudo era emblemático na lei de Moisés. Assim como se sacrificavam as primícias dos rebanhos, imitando-se a consagração do primogênito das famílias, assim como se degolava a vítima propiciatória para resgatar as faltas dos povos, assim também aos leprosos se impunha a obrigação de levarem sua oferenda ao Senhor, a título de penhor da purificação alcançada e de gratidão pelo benefício recebido. Nenhuma lei inevitável dispunha .sobre a natureza desse penhor. Podia ser, conforme a posição do leproso, um pássaro, um cordeiro ou frutos. Cada um oferecia o que estava a seu alcance e o que mais oferecia era, pelos homens, como hoje, considerado limpo.

Não se vê entre vós diariamente o interesse do julgador influindo no julgamento?

Quando os evangelistas dizem que, em conseqüência de haver o leproso divulgado por toda parte o que lhe sucedera, Jesus se viu impossibilitado de aparecer mais na cidade, sendo forçado a conservar-se nos lugares desertos, porque de todos os lados vinham ter com ele, isso significa que as multidões, mais curiosas de milagres materiais do que do reino dos céus, o assaltavam, forçando-o a procurar sítios espaçosos.

Destas palavras humanas: "Mas ele se retirava para o deserto e orava", já vos demos a significação, explicando que todas as vezes que Jesus desaparecia das vistas de seus discípulos, estes acreditavam que ele se retirara para algum lugar secreto, a fim de se entregar ao jejum e à oração. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 75

MATEUS, Cap. VIII, v. 5-13. —LUCAS, Cap. VII, v. 1-10

O centurião

MATEUS: V. 5. Tendo Jesus entrado em Cafarnaum, veio ter com ele um centurião e lhe dirigiu esta súplica: — 6. Senhor, meu servo está de cama, em minha casa, atacado de paralisia e sofre extremamente. — 7. Jesus disse: Irei lá e o curarei. — 8. Mas o centurião lhe ponderou: Senhor, não sou digno de que entres em minha casa; dize apenas uma palavra e o meu servo estará curado; — 9, porquanto sou um homem submetido a outro; tenho, sob minhas ordens, soldados; — digo a um: vai lá e ele vai; a outro: vem cá e ele vem; a meu servo: faze isto e ele faz. — 10. Ouvindo estas palavras Jesus se encheu de admiração e disse aos que o seguiam: Em verdade vos digo que ainda não encontrara em Israel tão grande fé. — 11. Também vos digo que muitos virão do Oriente e do Ocidente e se assentarão à mesa no reino dos céus com Abraão, Isac e Jacob; — 12, mas que os filhos do reino serão lançados nas trevas exteriores, onde haverá prantos e ranger de dentes. — 13. E, voltando-se para o centurião, disse: Vai e seja feito como acreditaste. Nessa mesma hora o servo ficou curado.

LUCAS: V. 1. Acabando de dizer estas coisas ao povo, entrou em Cafarnaum. — 2. Um centurião tinha doente, quase a morrer, um servo que lhe era muito caro. — 3. Tendo ouvido falar de Jesus, o centurião lhe mandou suplicar, por alguns anciãos judeus, que viesse curar o seu servo. — 4. Falando a Jesus, os anciãos o imploraram instantemente, dizendo: É um homem que merece lhe faças esta graça; — 5, pois que ama o nosso povo e nos edificou uma sinagoga. — 6. Jesus se pôs a caminho com eles; mas, quando chegaram perto da casa do centurião, este lhe mandou dizer por seus amigos: Senhor, não te dês esse incômodo, pois não sou digno de que entres na minha casa, — 7, como não me julguei digno de ir ter contigo; dize uma só palavra e o meu servo estará curado, — 8, porquanto sou um homem submetido à autoridade de outro; tenho, sob minhas ordens, soldados e, se digo a um: vai lá, ele vai; a outro: vem aqui, ele vem; a meu servo: faze isto, ele faz. — 9. Ouvindo isso, Jesus se mostrou admirado e, voltando-se para o povo que o acompanhava, disse: Em verdade vos digo que ainda não vira em Israel tão grande fé. — 10. E quando para a casa do centurião voltaram os que este mandara a Jesus, encontraram curado o servo que estava doente. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 76

N. 110. Tende fé. Para Deus não há diferença entre as suas criaturas, sejam quais forem as leis a que estejam submetidas. Todos os homens de boa vontade são seus filhos. Ide, pois, a ele com confiança, qualquer que seja o jugo humano que suporteis. Ide e ele vos aliviará. Mostrai-lhe vossas misérias, vossos sofrimentos, chamai-o em vosso auxílio e ele vos curará. Robusta seja a vossa fé e atraireis as bênçãos do Senhor.

Quanto à cura do servo do centurião, Jesus a operou pelo mesmo princípio de sempre: o princípio magnético. Todos os fatos de curas materiais qualificados de miraculosos, de milagres, emanam da mesma fonte.

A paralisia é um resfriamento dos fluidos animalizados que circulam no organismo humano. A vontade poderosa de Jesus mudou esses fluidos, modificando-os e vivificando-os de novo.

Assim como a pilha galvânica pode momentaneamente dar movimento aos músculos e aos nervos de um cadáver, também a concentração, por efeito magnético, de certos fluidos espalhados na atmosfera pode operar sobre o organismo vivo um abalo violento que o regenere.

Na força daquele que, pela ação exclusiva da sua vontade, obtinha tais efeitos é que o homem poderia ver um milagre; mas, a explicação faz ver que essa força é natural.

Do mesmo modo que juncou o solo que pisais de plantas benéficas, cujas propriedades curativas ainda não conheceis inteiramente, o Senhor também carregou a atmosfera que vos envolve de propriedades fortificantes, purificadoras e regeneradoras, que nem sequer suspeitais, que para vós ainda são letra morta, por isso que, para vos servirdes delas eficazmente, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 77

tendes que fazer os estudos necessários, estudos morais, únicos que vos podem elevar à altura da ciência que desejais adquirir.

Os estudos morais que vos darão a ciência são os que, em vos elevando, vos libertarão dos instintos brutais. Quanto mais o homem se purificar, mais senhor será da sua vontade, de seus instintos, de seus sentidos, mais se aproximará da perfeição que lhe cumpre atingir, mais aumentará seus poderes.

Só a purificação moral lhe tornará possíveis os estudos necessários ao conhecimento dos fluidos magnéticos dotados dessas propriedades fortificantes, depurativas e regeneradoras, ao conhecimento da natureza e da maneira de atuar de cada um deles e das aplicações a que se prestam, sob o ponto de vista curativo, conforme à moléstia. Sim, à medida que o Espírito se desprender da matéria, ampliar-se-lhe-ão e desenvolverão os conhecimentos a respeito de tudo quanto ainda lhe é obscuro e desconhecido. Porém, muito antes de conhecer os fluidos, o homem se ser-virá deles com bom resultado, graças ao auxílio dos Espíritos protetores da humanidade, os quais, mediante o magnetismo espiritual, intervindo ocultamente, se sentirão felizes de lhos colocarem, por assim dizer, ao alcance da mão, a fim de que os empregue de acordo com as necessidades.

O conhecimento desses fluidos será progressivo, acompanhando o progresso do estado moral, já o temos dito. Segue-se que só será completo quando o homem houver alcançado a perfeição que pode esperar na terra.

O magnetismo humano ainda tem que progredir muito para chegar ao seu apogeu, para chegar à época em que a força da vontade do Espírito bastará para reunir ou dispersar os fluidos sobre que queira atuar. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 78

A ciência adquirida, porém, já produziu algum bem e preparou para o futuro um bem imenso, pondo-vos em condições de ler através de todos os obstáculos e de perscrutar o seio da terra, para descobrir as riquezas que ela contém. Não falamos aqui das riquezas que o homem deve desprezar como geradoras do orgulho, do egoísmo e da sensualidade, mas das que Deus lhe concede para recobrar a saúde e a força, quando aniquiladas ou diminuídas.

Aludimos ao sonambulismo lúcido, produzido e revelado pelo magnetismo humano, às faculdades de visão espiritual e aos instintos que o sonâmbulo lúcido possui, pelo desprendimento sob a ação magnética, e às descobertas que, do ponto de vista curativo, ele pode e há de proporcionar à humanidade, nos reinos mineral, vegetal e animal e no seio mesmo da terra, entre os detritos e produtos aí sepultados.

Até que se ultime a depuração moral e, como conseqüência, a depuração tísica do homem, a ação magnética humana não bastará por si só, a maior parte das vezes, para a cura das enfermidades. Na maioria dos casos essencialmente físicos, orgânicos, serão necessários o auxílio e o concurso, tanto da ciência médica, como do sonambulismo magnético, das propriedades curativas já conhecidas e das que virão a ser descobertas, nas substâncias minerais, vegetais e animais.

Ficai sabendo: os auxílios estranhos aos fluidos magnéticos podem servir, combinando-se com estes. Há simpatia entre as plantas que curam e os fluidos que para esse fim se assimilam. Aquelas se saturam destes fluidos e os levam ao organismo. Atraí-os em seguida, por meio do magnetismo humano e obtereis duplo resultado. Eis porque os sonâmbulos lúcidos, livres, pelo desprendimento magnético, de quaisquer OS QUATRO EVANGELHOS (II) 79

influências, se mostram aptos a escolher as plantas curativas.

Não desprezeis nenhum dos meios que o Senhor vos confiou para atingirdes o fim.

A medicina não deve ser um sistema e sim um meio de restabelecer no organismo o equilíbrio desfeito, de restabelecer a harmonia das forças vitais quando perturbada. E os homens, quaisquer que sejam, que se consagram ao tratamento físico da humanidade, devem entregar-se a profundos e perseverantes estudos teóricos e experimentais, valendo-se da ciência médica, destinada a progredir sempre, do magnetismo humano e do sonambulismo magnético, lançando mão de todos os meios, usando de todos os recursos que aqueles estudos necessariamente facultam, recursos e meios tirados, pela observação e pela experimentação, das propriedades curativas das substâncias minerais, vegetais e animais, sobretudo das vegetais, e ao mesmo tempo dos fluidos de que se acha carregada a atmosfera que vos cerca.

Dissemos e repetimos: até que se complete a purificação moral e, conseguintemente, a purificação física do homem, a ação magnética humana não bastará por si só, na maioria dos casos, para a cura das enfermidades essencialmente físicas, orgânicas. Haverá, porém, casos excepcionais em que Deus permitirá ao homem adiantar-se, em que um privilegiado — privilegiado em virtude da elevação e da pureza alcançadas — com o auxílio oculto dos Espíritos superiores, produzirá, por ato de sua vontade e pela ação magnética, fenômenos de cura considerada impossível, fenômenos de cura dos que se chamam "milagres".

N. 111. Que é o que se dará com os sistemas médicos que, do ponto de vista terapêutico, dividem os homens, notadamente com os sistemas chamados "alopatia" e "homeopatia", sendo este OS QUATRO EVANGELHOS (II) 80

último aquele que, por meio de experiências no homem são, determina os sintomas morais e os sintomas físicos e mórbidos?

Todos os sistemas médicos terão que se unir para formar um único, que se aliará ao magnetismo humano e ao sonambulismo magnético, prestando-se os três mútuo apoio e constituindo o arsenal onde o homem irá buscar armas para combater a moléstia e restituir a saúde a seus irmãos.

O princípio dos contrários, o dos semelhantes, o magnetismo humano e o sonambulismo magnético são do domínio das leis da natureza.

Compete ao homem aprender, por estudos teóricos e experimentais, o caso em que deve empregar de pronto tal ou tal meio. A esse estudo é que tem que se aplicar para restabelecer, no organismo, o equilíbrio desfeito e a harmonia das forças vitais quando perturbada.

Remonte ele à origem do mal, sobretudo procure sempre a causa moral em todas as dores físicas, dores orgânicas — bem entendido.

Aquele que quebra um braço não pode acusar nenhuma dor secreta ou maus pendores; porém, nos inúmeros males que afligem a humanidade, pesquisai bem o fundo dos corações e das consciências e encontrareis a raiz dessa árvore que se estende por todos os membros. O coração ou a alma quase sempre estão atacados. Daí a perturbação do sistema nervoso, fonte de todas as enfermidades, de todos os sofrimentos. Perscrutai os antecedentes do que sofre e muitas vezes descobrireis o pesar oculto de uma ação, um acontecimento que interessou a saúde, viciando o sangue que devia circular puro nas veias.

Médicos, isto é, todos vós que vos consagrais a aliviar os males dos vossos irmãos, sede clarividentes e não apliqueis o remédio na chaga do doente à guisa da OS QUATRO EVANGELHOS (II) 81

criança que pensa um boneco, representação, para ela, de um homem.

N. 112. Em face destas palavras do v. 10 de MATEUS e do v. 9 de LUCAS: "Em verdade vos digo que ainda não encontrara tão grande fé em Israel", quais são, tanto com relação à época em que Jesus falava a seus discípulos, como em relação à época atual do Espiritismo, o sentido e o alcance deste versículo (MATEUS, v. 11): "Também vos digo que virão do Oriente e do Ocidente muitos que terão lugar no reino dos céus com Abraão, Isac e Jacob"?

Essas palavras encerravam um ensino visando destruir, no espírito dos Judeus, a idéia de que só eles eram filhos de Deus e tinham direito às graças divinas. Por aquela forma, Jesus lhes ensinava que, seja qual for o homem, venha donde vier, se tiver fé, é verdadeiramente filho de Deus; que, ao contrário, os que pertenciam à grande família judia, acreditando-se privilegiados, seriam repelidos, se não seguissem o caminho que o Senhor traçou e Moisés lhes mostrara, chamando-os à prática do amor de Deus e do amor ao próximo.

Podeis aplicar esse ensino à Igreja romana que repele quem não curve a cabeça ao jugo da sua lei, que o repele não só do seu seio, como também do do Senhor.

Filha orgulhosa dos bens que recebeu, não admite que possa e deva partilhá-los e assim rechaça o cãozinho que procura alimentar-se com as migalhas que lhe caem da mesa, sem pensar que aquele que a fez pode desfazê-la.

Vem de molde lembrar aqui a resposta da Cananeana quando, provocada por Jesus, que visava dar um ensino para o momento e sobretudo para o futuro, disse: "O cãozinho não se alimenta das migalhas que caem da mesa do amo?" A igreja, incumbida de continuar a obra dos primeiros cristãos, tinha uma tarefa OS QUATRO EVANGELHOS (II) 82

2 Estas palavras foram mediunicamente ditadas no mês de maio de 1862.

a desempenhar. Começou a executá-la com zelo, desprendimento e coragem; mas, o êxito a embriagou e ela se habituou à grandeza e às honras. Sacrificou a Mamon, ela que era um modelo oferecido aos filhos do Senhor. Esqueceu a humildade do chefe que a instituiu e a lei evangélica que se encarregara de ensinar. Cheia de orgulho, expulsa os que tentam abrir-lhe os olhos. Espessa e difícil de arrancar, é a venda que pôs sobre estes. Coragem, espíritas! Consegui-lo-eis, todavia, porque Deus o quer. Não será obra de um dia, porquanto os séculos passaram, colocando-lhe em cima, ano a ano, uma camada de obscuridade. Será, pois, tirando estas camadas uma a uma que se chegará a arrancar a venda que lhe oculta a luz.

Os Espíritos, anjos do Senhor, descem até vós, para vos ajudar no desempenho dessa missão, indicando-vos o meio de consegui-lo. Sede dóceis e sobretudo sede prudentes, por isso que demasiada precipitação poderia demorar a cura. Como médicos, tendes um tratamento importante a fazer. Consultai-vos mutuamente e procedei de acordo todos. Restitui assim a luz brilhante àquela que quer propagar a luz e fenece nas trevas de que se cercou2.

O senhor tudo criou puro e purificam tudo o que se viciou.

A Igreja do Cristo tem por templo o vosso planeta, por fiéis todos os homens que praticam a sua moral simples e sublime e por sacerdotes todos os corações puros que arrebanham os Espíritos transviados para os reconduzir àquele que empunha o grande cajado de pastor.

N. 113. Quais o sentido e o alcance destas palavras do v. 12 de MATEUS: "Mas, os filhos do reino serão lançados nas trevas exteriores, onde há prantos e ranger de dentes"? OS QUATRO EVANGELHOS (II) 83

Os que receberam a palavra do Senhor e dela não fizeram o uso que deviam fazer serão repelidos e compreenderão claramente o erro em que caíram. Quantos já houve e quantos há que choram as faltas cometidas e que se acreditavam salvos pela única razão de se julgarem com o direito de absolver ou de condenar! É que foram pesados nas mesmas balanças em que pesavam os outros.

Quanto às palavras "prantos e ranger de dentes" — sabeis que alegoricamente aludem aos sofrimentos e torturas morais, às expiações que, visando exclusivamente seu aperfeiçoamento moral e seu progresso, o Espírito tem que sofrer e sofre na erraticidade, de modo apropriado e proporcionado aos crimes e faltas que cometeu.

Sim, falando-se de sofrimentos, sempre se devem entender os sofrimentos morais do Espírito culpado e arrependido, inevitavelmente seguidos da reencarnação. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 84

LUCAS, Cap. VII, v. 11-17

O filho da viúva de Naim

V. 11. No dia seguinte Jesus se dirigiu a uma cidade chamada Naim, acompanhado de seus discípulos e de grande multidão. — V. 12. Ao aproximar-se da porta da cidade, aconteceu-lhe ver que levavam a enterrar um morto, que era filho único de sua mãe, sendo esta viúva; grande número de pessoas da cidade a acompanhava. — V. 13. Vendo-a, o Senhor se encheu de compaixão por ela e lhe disse: Não chores. — 14. Aproximou-se e tocou o esquife; os que o levavam pararam e ele disse: Mancebo, levanta-te, eu o ordeno. — 15. No mesmo instante, aquele que estava morto se sentou e começou a falar e Jesus o restituiu à sua mãe. — 16. Todos os presentes foram tomados de espanto e glorificaram a Deus, dizendo: Um grande profeta surgiu entre nós e Deus visitou o seu povo. — 17. O rumor desse milagre se espalhou por toda a Judéia e por todas as suas cercanias.

N. 114. Conheceis a relação que existe entre o Espírito e o corpo quando este, num estado de repouso a que chamais — sono, fraqueza, catalepsia — se acha separado da inteligência que o anima. O Espírito retoma uma liberdade momentânea e restrita, mas permanece ligado ao corpo, de que se separou, por uma cadeia elétrica, que é o laço fluídico do perispírito, laço que o reconduz ao invólucro material logo que as necessidades humanas o ordenam.

A morte, a morte real não tem despertar material e a vontade imutável do Senhor jamais força o Espírito a se unir à podridão. Dizemos — podridão — porque, uma vez quebrado o laço perispirítico, começa o apodrecimento da matéria, ainda mesmo que a vida orgânica não se tenha extinguido aos olhos dos homens. A vossa ciência, por enquanto, é incapaz de comprovar os primeiros efeitos e indícios da decomposição, mas, não obstante, eles existem. Segue-se OS QUATRO EVANGELHOS (II) 85

que, com relação ao filho da viúva de Naim, como com relação à filha de Jairo, a Lázaro e a todos os outros "mortos", aos olhos humanos bem entendido, não se quebrara o laço que une o Espírito ao corpo. A morte, pois, era apenas aparente, mas fora considerada real pelos homens. Jesus chamou o prisioneiro que se afastara do seu cárcere carnal e ele, submisso e dedicado, voltou incontinenti. Não têm outra causa qualquer os fatos desta natureza, referidos tanto no Antigo Testamento, como na Boa-Nova.

Acabamos de dizer, falando do filho da viúva de Naim, que, submisso e dedicado, o Espírito voltou à sua prisão carnal. Para que ocorressem todos os fatos que se haviam de produzir pela ação de Jesus, deixando, através da narração evangélica, traços e lembranças entre os homens, os Espíritos que, por pertencerem ao grupo dos participantes da obra do Mestre, deviam concorrer para a produção desses fatos, se colocavam voluntariamente, nas condições precisas, ao longo do caminho que ele percorria e desempenhavam assim a missão que trouxeram quando encarnaram. O fato ocorrido com o filho da viúva de Naim, como os que se deram com a filha de Jairo e com Lázaro, estava no número daqueles. O Espírito do filho da viúva obedecia, portanto, com submissão e devotamento à vontade de Jesus.

O estado real em que se encontrava o mancebo era o de catalepsia completa, único estado sincopal que pode apresentar por longo tempo as aparências da morte, de modo a ser tido pelo de morte real.

Jesus tocou o corpo e não o esquife, que os Hebreus não usavam para enterrar os mortos, e o fez com o fim de deter a marcha do cortejo. Sua vontade, expressa por estas palavras: "Levanta-te, mancebo; eu o ordeno", reconduziu o Espírito ao corpo, que despertou do seu prolongado sono e imediatamente OS QUATRO EVANGELHOS (II) 86

readquiriu, pela volta do Espírito e pela influência benéfica do Mestre, pela ação do seu poder magnético, a força e a lucidez que perdera.

Esse Espírito, já o dissemos, submisso e devotado, estava pronto a voltar, por ordem de Jesus, ao corpo. Mas, este, não se achando sustentado pela vitalidade da matéria, desde que, em virtude do afastamento do Espírito, o laço fluídico se distendera cada vez mais e se tornara assim muito fraco, necessitava da ação poderosa do Mestre para readquirir de súbito, graças aos fluidos que o penetravam, a força e a vitalidade. A restituição da vitalidade ao corpo foi devido àquela potência magnética, que restabeleceu a harmonia entre as forças vitais.

Repetimos: uma vez morto realmente, pela ruptura do laço espírita que une o Espírito ao corpo, isto é, por se haver o Espírito, com o perispírito, separado completamente do corpo, jamais pode o homem readquirir a vida corporal humana, pela volta de um e outro à podridão chamada cadáver.

Nesse caso, desde que o Espírito volveu à sua vida primitiva, à vida espírita, não lhe é mais possível retomar a vida corporal humana senão por meio da reencarnação, de acordo com as leis naturais e imutáveis da reprodução, em vigor na Terra.

Repetimos: a vontade imutável de Deus jamais força o Espírito a se unir à podridão; jamais derroga, quer para o vosso planeta e a humanidade terrena, quer para os outros mundos e para suas humanidades, as leis naturais e imutáveis que ele mesmo promulgou desde toda a eternidade e que se executam sob a ação espírita universal.

Repetimos também: em todas as "ressurreições" de mortos segundo os homens, operadas na Terra em todas as épocas; especialmente as de que falam tanto OS QUATRO EVANGELHOS (II) 87

o Antigo Testamento como a Boa-Nova, a do filho da viúva de Naim, a da filha de Jairo e a de Lázaro, não houve mais do que a volta do Espírito a um corpo que ele não abandonara inteiramente, isto é, a que se conservara ligado e preso pelo laço fluídico do perispírito. Assim, não havia cessação da vida, morte real, nem cadáver. Não havia mais do que suspensão da vida, morte apenas aparente e, por conseguinte, um estado de catalepsia completa, que passava aos olhos dos homens por um estado de morte real.

Quanto ao caso do filho da viúva de Naim, o cortejo seguia silenciosamente sua marcha, Jesus o faz parar e diz à mãe do mancebo, como disse aos que choravam e se lamentavam em casa de Jairo: "Não choreis". Tendo todos parado, ordenou: "Mancebo, levanta-te" exatamente como fizera com a filha de Jairo, a quem disse: "Menina, levanta-te". E, em seguida, se afasta.

Ninguém proferiu palavra na presença de Jesus, diante de seus discípulos, da multidão que os acompanhava e dos que compunham o cortejo.

Ninguém afirmou, referindo-se ao filho da viúva de Naim: "Ele está morto". Jesus, portanto, nada tinha que dizer para salvaguardar a interpretação futura, em espírito e verdade, do ato que acabava de praticar.

Pelo seu silêncio, deixou intencionalmente sujeito às interpretações futuras aquele fato, tido por milagroso pelos que o presenciaram e pelos que dele ouviram falar. Assim procedeu porque o fato em questão tinha que contribuir para tornar aceita a sua missão e para que esta produzisse frutos naquele momento e no futuro, cabendo à revelação do Espírito da Verdade por ele predita e prometida, à revelação atual, explicá-lo.

Os que formavam o cortejo, os discípulos, a multidão que os seguia, os que ouviram narrar o fato acreditaram todos na morte real do filho da viúva OS QUATRO EVANGELHOS (II) 88

de Naim e na sua ressurreição. Para todos, o mancebo estava morto e Jesus o ressuscitara no sentido que davam a esta palavra, acordemente com seus preconceitos e tradições.

Tal crença era fruto exclusivo das opiniões, das apreciações humanas, pois que Jesus nada dissera sobre o estado real do mancebo.

Os evangelistas, narradores do fato, tiveram, como sempre, que o relatar e relataram registrando o ato e as palavras de Jesus, segundo as opiniões, apreciações e interpretações humanas a que o mesmo fato dera lugar e que eles esposavam. De modo que, conforme haveis de notar, relatam o fato tal como fora por todos compreendido. Assim é que dizem, falando do mancebo: "um morto" (v. 12), "aquele que estava morto" (v. 15).

A resposta a esta pergunta: "o rapaz estava ou não morto?" tinha que ser confiada às interpretações humanas até aos vossos dias, durante longos séculos. A revelação atual, que vos vem explicar, em espírito e em verdade, a situação real daquele que estava morto no entender dos homens, a natureza e o caráter reais do ato que Jesus praticou, responde a essa pergunta e o faz quando os progressos realizados pela ciência humana, os estudos e as observações sobre o magnetismo é o sonambulismo magnético, quando a ciência espírita, que é o facho condutor, vos puseram em condições de compreender a resposta.

Em chegando o momento, explicar-vos-emos os fatos relativos à filha de Jairo e a Lázaro, porém, desde já, a título de nota, vos diremos o seguinte:

Quanto à filha de Jairo: os servos que levaram ao chefe da sinagoga a notícia da morte da menina lhe disseram, na presença de Jesus, dos discípulos e da multidão: "Tua filha morreu, não dês ao Mestre o incômodo de ir vê-Ia". Jesus, porém, foi e, chegando à casa de Jairo, disse aos que choravam e se lamen- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 89

tavam: "Não choreis; a menina não está morta, apenas dorme".

Aos tocadores de flauta e ao grande número de pessoas que lá se encontravam fazendo grande alarido, disse igualmente: "Retirai-vos, porquanto a menina não está morta, apenas dorme". Estas palavras foram por todos acolhidas com zombeteira incredulidade, por saberem, dizem os narradores, que ela estava morta. E essa opinião da massa ignorante prevaleceu sobre as declarações expressas e contrárias do Mestre. Os discípulos não viram senão um milagre no fato que Jesus produzira e que eles não podiam nem explicar, nem compreender. E tal opinião tinha que durar séculos, como durou. Até aos vossos dias, em que a incredulidade por sua vez a atacou e recusou admitir o fato, por não o saber explicar e não crer em milagre, o que os homens daquela época acreditaram é o que a Igreja ainda ensina: a morte real da filha de Jairo e a sua "ressurreição", no sentido da volta do Espírito a um cadáver.

Mas, já vo-lo dissemos, não censureis; tudo tem a sua razão de ser. Essas crenças constituíram uma condição e um meio de progresso para a Humanidade. Jesus conhecia o estado das inteligências, as necessidades e as aspirações da época e sabia que aquela opinião humana ia prevalecer. Por isso mesmo salvaguardou o futuro, quando disse: "A menina não está morta, apenas dorme", deixando à revelação atual o encargo de, diante da narração evangélica, explicar, em espírito e verdade, o suposto milagre.

Quanto ao fato relativo a Lázaro: Jesus apropriou sua linguagem à situação, ao que devia ser, e dispôs tudo por maneira a que servisse ao presente e preparasse o futuro, reservando aos tempos, então vindouros, da revelação atual, os elementos e os meios de explicar aquele fato em espírito e verdade.

Como no caso da filha de Jairo, ele disse: "Esta enfermidade não é mortal; não chega a causar a morte; vosso amigo Lázaro dorme — vou despertá-lo". É OS QUATRO EVANGELHOS (II) 90

verdade que disse também: "Lázaro está morto", porém disse-o respondendo a esta pergunta dos discípulos: "Mas, se ele está dormindo, curar-se-á?"

Lázaro estava morto aos olhos dos homens, estava-o para todos, menos para Jesus, que o sabia apenas adormecido e que, assim, o ia despertar e não ressuscitar no sentido em que os homens empregam esta palavra. A enfermidade de Lázaro não era mortal, não chegava a causar a morte. Ele, portanto, não morrera, não estava morto.

No momento oportuno, explicar-vos-emos quais são, em espírito e verdade, o sentido e o porquê das palavras: "Lázaro está morto", ditas por Jesus como resposta àquela pergunta dos discípulos.

Quando for ocasião, explicaremos o fato ocorrido com Lázaro e a origem da opinião humana de Marta que, como as demais pessoas, lhe acreditou na morte real, chegando a dizer: "Ele cheira mal, pois que está aí há quatro dias".

No desempenho da sua missão terrena, Jesus tudo dispunha tendo em vista a época em que pessoalmente falava aos homens e os séculos ainda distantes. Tinha por isso o cuidado de estabelecer as bases, de preparar os elementos e os meios para a explicação futura, em espírito e em verdade, dos seus atos e palavras, de modo que cada era recebesse o que pudesse comportar.

Não confundais nunca, nas narrações evangélicas, os atos e as palavras do Mestre com o que reflete e reproduz as opiniões, apreciações e interpretações humanas, que trazem o cunho da época e do meio em que ele desempenhou a sua missão. Quanto às suas palavras, não lhes dês nunca, querendo apreender-lhes o verdadeiro sentido, querendo penetrar o pensamento a que servem de roupagem, querendo apreciar e determinar a natureza e o caráter de seus atos, um sentido literal que as ponha em contradição consigo mesmas. Interpretai-as conforme ao espírito e OS QUATRO EVANGELHOS (II) 91

compreendei-as, como é necessário, sem as isolar umas das outras, de sorte que, consideradas na íntegra, em vez de se contradizerem, formem um composto harmonioso. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 92

MATEUS, Cap. VIII, v. 14-17. — MARCOS, Cap. I, v. 29-34. —LUCAS, Cap. IV, v. 38-41

Cura da sogra de Pedro. — Enfermidades curadas

MATEUS: V. 14. Tendo ido a casa de Pedro, Jesus aí encontrou a sogra deste de cama e com febre. — 15. Tocou-lhe na mão e a febre desapareceu; ela se levantou imediatamente e se pôs a servi-lo. — 16. Pela tarde apresentaram-lhe muitos possessos e de todos expulsou ele com a sua palavra os maus Espíritos e curou os que estavam doentes; — 17, a fim de que se cumprissem estas palavras do profeta Isaías: Ele tomou sobre si as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças.

MARCOS: V. 29. Saindo da sinagoga, vieram com Tiago e João a casa de Simão e de André. — 30. Ora, achando-se a sogra de Simão de cama com febre, logo falaram dela a Jesus; — 31, e este, aproximando-se, lhe pegou na mão e a fez levantar-se; no mesmo instante a febre a deixou e ela se pôs a servi-lo. — 32. Ao cair da tarde, quando o sol já se escondia, trouxeram-lhe muitos doentes e possessos; — 33, aglomerando-se à porta da casa todos os habitantes da cidade. — 34. E ele curou muitas pessoas atacadas de diferentes moléstias e expulsou muitos demônios aos quais não permitia que falassem, porque o conheciam.

LUCAS: V. 38. Saindo da sinagoga, entrou Jesus na casa de Simão, cuja sogra estava com muita febre e lhe pediram que se compadecesse dela. — 39. Inclinando-se sobre ela, Jesus ordenou à febre que a deixasse e a febre a deixou; ela se levantou imediatamente e começou a servi-los. — 40. Ao pôr do sol, todos os que tinham doentes atacados de moléstias diversas os traziam e ele, pondo sobre cada um as mãos, os curava. — 41. De muitos os demônios saíram gritando e dizendo: És o filho de Deus. Mas Jesus os ameaçava e não lhes permitia que falassem, por isso que sabiam ser ele o Cristo. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 93

N. 115. São sempre doenças e enfermidades físicas a curar, subjugações, tanto corporais, como corporais e morais, a fazer cessar; e os meios empregados, quer para a cura das moléstias, quer para a libertação dos subjugados, são sempre os mesmos, para edificação dos incrédulos.

Sim, tanto a cura da sogra de Pedro, como as dos outros doentes que se apresentaram ao pôr do sol, todas se operaram pelo mesmo processo: pela ação magnética. Aproximando-se da sogra de Pedro, Jesus lhe tomou da mão e a sua vontade imprimiu a esse contacto magnético a força necessária para determinar o desaparecimento da moléstia.

Não acrediteis que Jesus precisasse usar e usasse, para obter cada uma das curas que operou, de fluidos diferentes, especialmente apropriados a cada moléstia; não. Os fluidos mais ou menos se assemelham. Fluidos purificadores e regeneradores, quando se trata de um organismo vital viciado; fluidos fortificantes, quando se trate de restabelecer a ação dos músculos, dos nervos, do mecanismo — tais são os dois princípios fundamentais dos fluidos.

Jesus aplicava o remédio adequado ao mal, qualquer que fosse a sua natureza.

Não concluais, porém, que o magnetizador, por não ter consciência nem conhecimento daqueles fluidos e dos efeitos que devam produzir, se ache impossibilitado de obrar com segurança, do ponto de vista da cura, na medida da sua elevação, da sua pureza, das suas faculdades magnéticas, uma vez que tenha fé e o impulsione a vontade de fazer o bem; não. Pelo seu próprio poder vital ele atrai os fluidos, mas nunca atua sozinho. Os Espíritos protetores da Humanidade, que o assistem, escolhem os fluidos e os dispõem para que produzam o desejado efeito, dentro dos limites do que é permitido. Ajudam a boa vontade do operador, conformemente aos desígnios do Mestre. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 94

Pelo que respeita às curas morais, que operou afastando dos subjugados os Espíritos obsessores, fazendo assim cessar a subjugação, Jesus (como já o explicamos no n. 74, 1º vol.) expulsava os maus Espíritos pelo poder superior a que os Espíritos inferiores não podem resistir, quando é posto em ação.

Ele não permitia que os obsessores dissessem que o conheciam, que sabiam ser o Cristo quem os expulsava, porque cada coisa tinha de vir a seu tempo. Se o Mestre fora reconhecido mais cedo, os fariseus, os escribas, os príncipes da igreja teriam começado prematuramente a persegui-lo. Não esqueçais que ele tinha a presciência dos acontecimentos, que os Espíritos inferiores eram ignorantes, que, portanto, lhe cumpria dar-lhes ordens conformes ao fim a que desejava chegar.

Jesus não se mostrava aos maus Espíritos, aos obsessores, na glória que cerca o Santo de Deus, o Senhor e Mestre do vosso planeta e da sua humanidade. Mostrava-lhes apenas (já o dissemos no n. 74, 1° vol.) seu Espírito; mas, a força da sua vontade bastava para lhes demonstrar o seu imenso poder.

Quando, ao se afastarem, bradavam pela boca dos subjugados, então médiuns falantes: "És o filho de Deus", os obsessores reconheciam nele os sinais característicos dos Espíritos superiores e estes, como todos nós e vós, são filhos do onipotente, filhos do Altíssimo.

Chamando-lhe — "filho de Deus" — não lhe davam dessa filiação título diverso do que Jesus se atribuía diante dos homens, quando os tratava por "meus irmãos", quando lhes ensinava a dizer, referindo-se ao Senhor Deus: "nosso pai".

Os que se apóiam nestas palavras bem sabem quanto é frágil o apoio, tanto que só a tremer descansam nele a mão; não havendo um só que creia firmemente no princípio que apresentam como artigos de fé. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 95

Jesus, pela sua vida humana aparente e pelo desempenho da sua missão terrena, tendo uma e outra por objeto ensinar e exemplificar, deu cumprimento a estas palavras do profeta Isaías: "Ele tomou sobre si as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças". Desceu ao meio dos homens para lhes ensinar a sofrer a fim de se regenerarem. Curou os males que encontrou no seu caminho e, unicamente a título de lição e de exemplo, suportou, aos olhos dos homens, os males de que se carregara. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 96

MARCOS, Cap. I, v. 35-39. —LUCAS, Cap. IV, v. 42-44

Retirada para o deserto. —Prece. — Pregação

MARCOS: V. 35. No dia seguinte, tendo-se levantado muito cedo, saiu e foi para um lugar deserto onde se pôs a orar. — 36. Simão e os que com ele estavam lhe foram no encalço; — 37, e, quando o encontraram, lhe disseram: Toda gente te procura. — 38. Ele então disse: Vamos às aldeias e cidades próximas a fim de que também aí eu pregue, pois foi para isso que vim. — 39. E assim pregava nas sinagogas e por toda a Galiléia e expulsava os demônios.

LUCAS: V. 42. Ao nascer do dia, saiu e foi para um lugar deserto; a multidão que o procurava veio ter com ele e não o largava com receio de que se fosse embora. — 43. Ele, porém, lhes disse: É preciso que também nas outras cidades eu anuncie o reino de Deus; pois para isso é que fui enviado. — 44. E pregava nas sinagogas da Galiléia.

N. 116. Não esqueçais nunca que a linguagem humana e a narração dos evangelistas são conformes, debaixo da influência e da inspiração mediúnicas, às crenças dos apóstolos, dos discípulos e da multidão que acompanhava os passos de Jesus, crenças que, como homens, eles adotaram (já o explicamos) de acordo com os tempos e as fases da missão que desempenhavam.

Jesus não estava submetido, materialmente, às necessidades humanas; mas, aos olhos dos homens, as experimentava. Quer isso dizer que elas eram aparentes e não reais. Assim, o repouso noturno não lhe era necessário. Entretanto, ao que supunham os homens, ele se levantara muito cedo, mal despontara o dia, ensinando-lhes, com o exemplo de tão grande atividade, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 97

que não deviam dar-se a um repouso inútil, nem consagrar demasiado tempo aos cuidados pessoais.

Todas as vezes que desaparecia das vistas humanas, é que voltara, como o sabeis, às regiões superiores. Segundo os homens, porém, ele "se retirara para lugar deserto, onde se conservava em vigília, orando". Também nesse desaparecimento havia uma lição. Ensinava que todos devem estar constantemente vigilantes, a fim de se acharem sempre prontos a comparecer diante do Senhor.

De volta das regiões superiores, onde estivera durante a noite, foi visto saindo de casa ao despontar do dia, muito cedo, a fim de indicar a direção que deviam tomar os discípulos e a multidão para encontrá-lo. E, no momento em que o encontraram Simão e todos os que o procuravam, já ele retomara o seu corpo perispirítico, com a aparência da corporeidade humana.

Meditai nas palavras que lhes dirigiu, quando a multidão pretendia retê-lo. Encerram também um ensino dado a todos os apóstolos da palavra evangélica e da nova revelação. Ensinam-lhes que não se devem deixar ficar onde já tenham executado a sua tarefa, interessando a todos os seus irmãos o apostolado que desempenham. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 98

MATEUS, Cap. VIII, v. 18-22. —LUCAS, Cap. IX, v. 57-62

Seguir a Jesus. —Deixar que os mortos enterrem seus mortos. —Não olhar para trás

MATEUS: V. 18: Vendo-se Jesus cercado por grande multidão, resolveu atravessar o lago. — 19. Então um escriba se aproximou e lhe disse: Mestre, seguir-te-ei para onde quer que fores. — 20. Jesus lhe disse: As raposas têm suas tocas; os pássaros do céu têm seus ninhos; mas o filho do homem não tem onde repousar a cabeça. — 21. Outro discípulo lhe disse: Senhor, permite que primeiro eu vá enterrar meu pai. — 22. Jesus lhe retrucou: Deixa que os mortos enterrem seus mortos.

LUCAS: V. 57. Quando iam a caminho, um homem lhe disse: Senhor, eu te acompanharei para onde quer que fores. — 58. E Jesus lhe disse: As raposas têm suas tocas, os pássaros do céu têm seus ninhos; mas o filho do homem não tem onde repousar a cabeça. — 59. E disse a outro: Acompanha-me. Ao que ele respondeu: Senhor, permite que vá primeiramente sepultar meu pai. — 60. Jesus lhe disse: Deixa que os mortos enterrem seus mortos; tu, porém, vai e anuncia o reino de Deus. — 61. Disse-lhe outro: Eu te seguirei, Senhor, mas permite que vá antes dizer adeus aos de minha casa. — 62. Jesus lhe disse: Aquele que, tendo posto a mão no arado, olhar para trás não serve para o reino de Deus.

N. 117. Por estas palavras, certamente não pretendeu Jesus prescrever aos homens que, para trilharem o caminho por ele indicado e anunciarem o reino de Deus, isto é, para mostrarem as sendas e os meios que conduzem à vida eterna, renunciassem às exigências e necessidades da existência humana, relativas tanto à habitação como aos alimentos e ao vestuário, que renunciassem ao cumprimento dos deveres para com os despojos mortais daqueles a quem os prendiam os laços do sangue ou da amizade, que rompessem as ligações de família, que a repu- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 99

diassem os deixassem de cumprir as obrigações que lhes ela impõe.

Devendo sempre procurar o espírito, o homem freqüentemente esbarrou na letra.

O erro dos que comentam as palavras de Jesus consiste em admitirem, para umas, o símile, a figura oriental, que recusam às outras; em lhe falsearem ou modificarem o pensamento, de acordo com os tempos, desfigurando-o ao sabor das conveniências, atribuindo assim ao Mestre absurdos de que mesmo o homem se envergonharia.

Buscai nas palavras de Jesus o espírito sob o véu da letra e encontrareis sempre uma lição de justiça, de amor, de devotamento, de caridade imensa, uma luz sempre nova na estrada do progresso.

Tratai, pois, de compreende-Ias todas em espírito e em verdade, segundo o espírito que vivifica e não segundo a letra que mata.

O conjunto das que se contêm nos versículos que, neste momento, nos cabe explicar ensina que o homem antes de tudo deve cumprir as obrigações que o Mestre lhe impôs.

Cada uma de suas palavras comporta uma explicação à parte, cada uma encerra um ensinamento, um preceito.

Nas que dirigiu ao escriba, mostrava quão pouco caso devem os homens fazer das voluptuosidades da vida humana, se querem segui-lo e caminhar nas suas sendas.

Importa-lhes não procurar as doçuras e o repouso da vida material. A atividade, a energia, a confiança, tais os móveis da vida.

Ensinava-lhes a serem desprendidos de tudo, a nunca se preocuparem demasiadamente, mais do que seja preciso, com seus interesses particulares.

Por estas palavras: "Deixa que os mortos enterrem seus mortos"; e, "quanto a ti, vai e anuncia o OS QUATRO EVANGELHOS (II) 100

reino de Deus", dirigidas ao que pedia permissão para ir, antes de segui-lo, enterrar o pai, não disse Jesus: abandona às aves de rapina, aos cães famintos, os despojos mortais daqueles a quem amaste, daqueles a quem estiveste unido pelos laços do sangue ou da amizade, os despojos mortais de teus irmãos.

Deitaríeis fora, por acaso, as roupas que eles tivessem usado, os objetos que lhes fossem caros? — Não.

Fazei com os corpos mortos o que fazeis com esses nadas que vos lembram os que amastes. Não os profaneis, porquanto, se o Espírito não está mais aí, já esteve. Sepultai os mortos: que a profanação não os conspurque; que suas emanações não empestem o ar; mas, não façais do enterramento um culto, nem — o que é pior — objeto de ostentação e de luxo. A quantos dentre vós importa mais o estrépito de um enterro brilhante do que a lembrança daqueles cujos corpos são assim pomposamente levados à sepultura! Ah! deixai que os mortos enterrem seus mortos e dispensai, oh! bem-amados, ao envoltório material, a atenção devida a, um objeto que o defunto amou. Amai, porém, amai com todo o vosso amor aquele que se ausentou desse corpo inanimado. Para ele os vossos cuidados, o vosso amor. Consista o vosso luxo em orações íntimas, saídas do coração. Não deixeis que arrefeça o vosso zelo por aquele que abandonou o corpo, como arrefece com relação a esse corpo.

Entrai num desses recintos povoados de cadáveres e apreciai a progressão decrescente do afeto e da lembrança. Contemplai as flores que fenecem pouco a pouco e das quais não resta o mais ligeiro sinal ao cabo de alguns anos. Vede como o musgo e os parasitas progridem na pedra, tanto quanto os vermes no corpo. Compreendereis então não ser a morte material o que atrai o homem. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 101

Que são os despojos mortais deste? Matéria que os vermes decompõem, um composto tirado do todo universal e que a ele tem que voltar, subdividindo-se. Não deis, portanto, valor pueril a esses restos que a terra reclama. Só o Espírito que os animava não perece, só ele vê, sente, ama e sofre.

Os mortos de que Jesus falava são os que vivem exclusivamente para o corpo e não pelo Espírito e para o Espírito; são aqueles para quem o corpo é tudo e o Espírito nada, aqueles que, tendo ouvidos para ouvir e compreender, não ouvem nem compreendem, que são incapazes de ouvir e compreender, que têm olhos para ver e não vêem, que são incapazes de ver.

Abandonai, pois, os mortos. Que os mortos pelo Espírito e para o Espírito, vivos para o corpo, aos quais falecem outras consolações, se agarrem a esses amontoados de podridões. Deixai-lhos. Deixai que enterrem seus mortos. Abandonai-lhes esses mortos e ide vós pregar a vida eterna. Consolai, amparai, exortai os homens e fazei-os entrar nas veredas da vida, onde tudo é perfume e luz.

Quanto a estas palavras: "Aquele que, tendo posto a mão no arado, olha para trás de si, não serve para o reino de Deus", dirigidas ao que lhe pedia permissão para ir, antes que partisse com ele, despedir-se dos que deixara em casa, é preciso que o homem lhes busque o espírito e não sé atenha à letra.

Houve quem acusasse o Mestre de, por essas palavras, pregar a secura de coração, de despedaçar os laços tão brandos da família. Oh! bem longe estava isso do seu pensamento.

Como pudera Jesus, todo amor e devotamento, ensinar o egoísmo? Não, não!

O que, por aquela forma, dizia aos homens era: não olheis para trás, quando vos achardes na estrada OS QUATRO EVANGELHOS (II) 102

do bem, pois que sempre haverá um laço que vos retenha.

Refleti antes de vos pordes a caminho, antes de colocardes no sulco o arado; mas, uma vez feito isso, uma vez convencidos de que ele rasga o solo no ponto em que a semente deve ser lançada para produzir, não pareis mais, caminhai para diante.

No momento em que estas palavras acabavam de ser escritas, o médium, sob outra influência mediúnica que se fez sentir espontaneamente, escreveu, com uma caligrafia diferente e magistral o seguinte:

"Deixa que os mortos enterrem seus mortos e vai tu e anuncia o reino de Deus; deixa entregues a si mesmos os que se mostram incapazes de ver a luz; trata, primeiramente, de levá-la aos que a desejam.

"Aquele que, tendo posto a mão no arado, olha para trás de si, não serve para o reino de Deus: É preciso que as condições pessoais, egoísticas, não te façam voltar atrás e abandonar a obra que tens de executar. Começaste a caminhar para a frente, segue teu caminho, pois parar é recuar".

Ante tal manifestação, dirigimos aos Espíritos purificados que presidem à execução desta obra e ao que acabava de manifestar-se estas palavras: "Dignai-vos de permitir vos agradeçamos a boa vontade que tendes de nos esclarecer e de nos dar a luz e a verdade; que Deus nos conceda a graça de progredirmos sempre na senda do amor infinito que conduz a ele e na da caridade que se universaliza na imensidade das suas obras."

Espontaneamente ainda e com a mesma caligrafia magistral, o médium escreveu:

"Jesus vos abençoa".

Depois, escreveu mediunicamente, com a caligrafia de que antes usava: OS QUATRO EVANGELHOS (II) 103

.Foi um Espírito intermediário de Jesus junto de vós quem se manifestou e vos transmitiu a palavra do Mestre, encarregado, como seu mandatário, de assinar por ele. Para bem apreciardes a vossa posição em tal caso, dir-vos-emos: "É a palavra do monarca transcrita pelo secretário, mas selada com as armas reais".

Conheceis as relações que existem entre os homens e seus guias espirituais. Sendo por demais material, a natureza do homem terreno não lhe consente entrar em relação fluídica com os Espíritos de ordem muito superior. A transmissão das palavras do chefe se faz então por intermédio de Espíritos mais ou menos elevados, de conformidade com os extremos que devam ser postos em contacto. O Mestre, com vigilante ternura, olha para todos vós e seu amor leva em conta os vossos menores esforços. Mas, se, por estar Jesus muito acima dos Espíritos que vos servem de guias e protetores, estes não são por ele pessoalmente dirigidos, com mais forte razão, entre ele e vós indispensáveis são os intermediários. O Espírito que vos transmitiu as palavras do Mestre é um dos que recebem suas ordens e espalham, sob a sua direção, a luz e a ciência. Grande seja o vosso reconhecimento!

A bondade do Senhor desce sobre os que se esforçam por submeter-se às suas leis. Paciência, coragem, perseverança, fé e amor.

Mateus, Marcos, Lucas e João, Assistidos pelos Apóstolos . OS QUATRO EVANGELHOS (II) 104

MATEUS, Cap. VIII, v. 23-27. —MARCOS, Cap. IV, v. 35-41. —LUCAS, Cap. VIII, v. 22-25

Tempestade aplacada

MATEUS: V. 23. Tomou em seguida a barca, acompanhado pelos discípulos. — 24. E eis que se levantou no mar uma tempestade tão grande que as ondas cobriam a barca. Ele, entretanto, dormia. — 25. Os discípulos então se aproximaram dele e o despertaram, dizendo: Senhor, salva-nos, que perecemos. — 26. Jesus lhes respondeu: Porque tendes medo, homens de pouca fé? E, levantando-se, mandou que os ventos e o mar se aquietassem e grande bonança logo se fez. — 27. Os homens, cheios de admiração, diziam: Quem é este a cujas ordens os ventos e o mar obedecem?

MARCOS: V. 35. Nesse dia, ao cair da tarde, disse-lhes ele: Passemos para a outra margem. — 36. E, despedida a multidão, levaram consigo Jesus na barca onde ele se achava; outras barcas o seguiam. — 37. Levantou-se grande ventania que, atirando as vagas sobre a barca, a enchiam d'água. — 38. Jesus, que se achava à popa, dormia reclinado num travesseiro. Eles o acordaram, dizendo-lhe: Mestre, não se te dá que pereçamos? — 39. Jesus. levantando-se, falou ao vento e ao mar dizendo: Cala-te, emudece; o vento cessou e logo reinou grande calma. — 40. E ele lhes disse: Porque sois tão tímidos? ainda não tendes fé? -41. E todos, cheios de temor, diziam uns aos outros: Quem julgas seja este a quem o vento e o Mar obedecem?

LUCAS: V. 22. Certo dia, tendo entrado numa barca com os discípulos, disse-lhes: Passemos para a outra margem do lago; e partiram. — 23. Enquanto faziam a travessia, ele adormeceu e grande ventania se desencadeou sobre o lago, enchendo d'água a barca e pondo-os em perigo. — 24. Os discípulos se acercaram dele e, despertando-o, disseram: Mestre, soçobramos. Jesus, levantando-se, falou ameaçadoramente ao vento e às ondas agitadas. Tudo logo cessou e reinou grande calma. — 25. Disse-lhes ele então: Onde está a vossa fé? Eles, porém, cheios de temor e de admiração, perguntavam uns aos outros: Quem julgas seja este que dá ordens aos ventos e às ondas e é obedecido? OS QUATRO EVANGELHOS (II) 105

N. 118. Jesus, vós o sabeis, não estava sujeito ao sono, nem a nenhuma outra necessidade da existência humana. Para os homens, ele adormecera e tiveram que o despertar. Na realidade, porém, apenas quis, pela demonstração do seu poder sobre os elementos, ferir a imaginação dos discípulos e desenvolver-lhes a fé. Os Espíritos encarregados das águas e dos ventos, obedecendo-lhe, como todos os outros, tudo prepararam para produzir o terror nos discípulos daquele que também lhes era o Mestre e cumpriram docilmente suas ordens, quando ele mandou que toda a agitação cessasse.

A explicação dos meios pelos quais os Espíritos prepostos produziram o tufão, a tempestade e a fizeram cessar se acha ainda muito acima do alcance das vossas inteligências.

Cada reino da natureza está submetido à direção de Espíritos especiais e cada um obra empregando os meios que o Senhor lhe facultou. A produção de tais efeitos, de tais sucessos tem sempre por base a ação do Espírito sobre os fluidos. O choque destes contribui para que sintais a influência do vento. A ação magnética exercida sobre as massas de água as levanta e, diminuída essa atração, a calma se restabelece. Não é que cada vaga do Oceano esteja submetida à ação de um Espírito encarregado de a mover como se fora um brinquedo de criança. Os Espíritos prepostos a tais efeitos concentram os fluidos atrativos nos pontos em que deverá desencadear-se a tempestade.

Tudo para nós tem uma causa explicativa, mas muitas coisas preciso é que se conservem para vós obscuras. Contentai-vos com o pouco que vos podemos dar, de acordo com o estado das vossas inteligências. Tratai de obter mais pelo estudo, pelo trabalho, pela observação, executados com desinteresse, humildade de coração e espírito, fé, amor e desejo de progredir. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 106

Os encarregados das águas e dos ventos, como os outros Espíritos especiais a cuja direção se acha subordinado cada um dos reinos da natureza, são Espíritos purificados, incumbidos de uma missão e, para desempenhá-la, empregam, como lhes apraz, os que lhes estão inferiores, quando o concurso destes se faz necessário.

Ficai sabendo; tudo em a natureza é magnetismo, é atração e ação magnética subpostas à ação espírita e Deus não concede seus poderes senão aos que o mereceram. O Senhor não confia a aplicação e a execução das leis que estabeleceu desde toda a eternidade para a regência da vida e da harmonia universais, para a realização de seus desígnios e da sua providência, senão aos Espíritos que ele sabe serem capazes e dignos desse encargo.

N. 119. Como conciliar-se a ação dos Espíritos na produção do fenômeno das tempestades e, conseguintemente, dos naufrágios que ocasionam, num instante fatal, a morte de certas pessoas como termo de suas provações terrenas, com as descobertas pelas quais a Ciência, de antemão, determina o lugar e a época dos fenômenos e sucessos meteorológicos, atmosféricos, o que leva alguns homens a não verem nas tempestades e nos naufrágios mais do que a ação de uma força cega e necessária e, na morte dos náufragos, mais do que a obra daquilo a que chamam — acaso, negando assim a intervenção de Deus e a ação dos Espíritos por ele prepostos ao uso, ao emprego, à execução e à aplicação das leis naturais e imutáveis a que estão sujeitos os diversos fenômenos da Natureza?

Porventura a ciência humana também já predeterminou quais os que, ao menos na aparência, seriam vítimas desses efeitos? OS QUATRO EVANGELHOS (II) 107

Dizemos — ao menos na aparência — porque os que em tais casos perecem, conforme daqui a pouco explicaremos, são apenas vítimas voluntárias, no sentido de que são levados a semelhante fim em virtude da escolha, que fizeram, de suas provas; de que são levados a isso pelos seus próprios Espíritos, no sentido de que o que lhes sucede é conseqüência forçada das provações e expiações que escolheram.

Tudo é sábio, tudo é grande nas leis divinas; só vós, homens, sois pequenos nas vossas orgulhosas apreciações.

A ciência um dia vos anunciará com exatidão o momento dos fenômenos da natureza. Então, dada a vossa elevação moral, física e intelectual, não mais tereis de sofrer expiações e provações quais as do naufrágio. É preciso que seja assim, porque é preciso que tudo progrida e tudo marche regularmente na obra divina.

Dia virá em que, tendo vós alcançado a elevação necessária, todos os casos que hoje vos causam espanto se vos tornarão familiares. Mas, nem por isso menos real será a ação dos Espíritos. A ciência humana, se lhe fora possível, anularia a existência de Deus, dizendo: "Previmos as tempestades, logo, elas se desencadearam porque assim devia acontecer". De tal sorte, os fenômenos da natureza seriam apenas o resultado da ação de uma força cega e necessária e não obra de uma inteligência suprema e providencial, que age por intermédio de Espíritos ativos e devotados, aos quais incumbem o uso, o emprego, o funcionamento, a aplicação e a execução das leis naturais e imutáveis que ela estabeleceu desde toda a eternidade. Deste modo é que aquela inteligência obra, por sua vontade livre e imutável, no sentido de que age segundo essas mesmas leis que ela dirige, aplica, faz funcionar, executar, objetivando o progresso físico, moral e intelectual, dentro da vida e da harmonia universais. Prevendo-lhes e observando-lhes o OS QUATRO EVANGELHOS (II) 108

uso, a aplicação, os efeitos e a execução, essas leis são reconhecidas por aqueles mesmos que negam, porque não os vêem, o legislador que as promulgou e os agentes a quem incumbiu de as aplicar, de as fazer produzir seus efeitos, de as executar, nas condições e segundo as regras e os meios que lhes pôs nas mãos e se acham estabelecidos nas próprias leis. O legislador é — Deus; os agentes são — os Espíritos puros, aqueles que se podem aproximar do foco da onipotência e que, por sua vez, têm, como agentes submissos e devotados, conformemente à hierarquia espírita, os Espíritos superiores e os bons Espíritos.

O mesmo fora reconhecer a existência de qualquer máquina, prever-lhe e observar-lhe o uso, a aplicação, os efeitos, a execução da obra desde que o operário preposto do mecânico a fez funcionar e, ao mesmo tempo, negar, por não serem visíveis, o mecânico que a inventou e os operários, que a põem em movimento. O mecânico é Deus; os operários prepostos são os Espíritos.

Não, a natureza obedece a determinada marcha regular e, assim como o homem recebe sempre, pelas circunstâncias ou pelos acontecimentos que preparam, precedem, produzem e executam essa marcha, o aviso de que tem que morrer e, por conseguinte, de que lhe cumpre estar pronto para esse momento supremo, do mesmo modo, nas leis da natureza, todos os acontecimentos deixam prever a marcha que seguirão, por meio de sinais que a tempo compreendereis.

As tempestades como as inundações, os fatos atmosféricos e todos os fenômenos da natureza são produzidos por Espíritos prepostos à produção desses efeitos, Espíritos que, todavia, seguem a marcha que lhes traça o Senhor para os preparar, guiar e realizar pelos meios de que os armou, mas sempre segundo as leis naturais e imutáveis por ele estabelecidas desde toda a eternidade. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 109

Já o declaramos e repetimos: Dia virá em que a ciência poderá predizer o momento exato em que se produzirão os fenômenos da natureza. Quanto, porém, à previsão dos fenômenos atmosféricos, não acrediteis que os possais anunciar com a precisão com que os ponteiros marcam num mostrador as horas. Vossos cálculos serão muitas vezes perturbados, mas chegareis a prever sempre com muita aproximação. Isso vos permitirá, desde que o orgulho humano se resolva a consenti-lo, tomar as precauções necessárias para salvar as vossas colheitas, as vossas habitações e fazer redundar em proveito da Humanidade o que, até então, ela considerara calamidade.

Nada existe na natureza sem um fim. Somente a vossa ignorância impede que o compreendais e o homem tem, até certo ponto, o direito de dizer-se o rei da criação, no sentido de que nada há secreto que não deva ser dele conhecido e nada oculto que não deva ser descoberto, à medida que for aumentando a sua elevação moral e intelectual e, concorrentemente, física, segundo a lei morosa, mas regular do progresso. A bondade divina tudo submeteu ao império do homem; preciso é, porém, que ele aprenda a reinar como Senhor, como pai de família e não como tirano. É preciso que despedace as cadeias que prendam seus irmãos, para que aprenda a acorrentar o Oceano. É preciso que esteja sempre pronto a partilhar com seus irmãos o que possuir, para aprender a preservar suas colheitas das geadas, dos ventos e dos raios de um sol demasiado ardente. É preciso, enfim, que se aperfeiçoe moralmente, para obter o aperfeiçoamento físico do seu planeta.

Cada um dos séculos que se escoam com tanta lentidão vos traz uma parcela de progresso moral e intelectual. Moral, sim, porque, mau grado a todas as vossas imperfeições, tendeis para o bem, tendes disposição para aceitar, mesmo dentro da vossa cegueira, as modificações capazes de vos melhorarem a espécie. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 110

Conservais ainda uma parte da catarata que vos tira a vista. É exatamente do que procuramos agora curar-vos, pela nova revelação, pela influência e pela ação espíritas e com o concurso dos Espíritos encarnados aí em missão. Quando enxergardes nitidamente, caminhareis com passo firme e decidido pela via do progresso e a vossa carreira tomará então proporções vertiginosas. Coragem, coragem, bons obreiros! O amo vem visitar sua vinha e volta satisfeito por encontrar na faina os seus trabalhadores. Coragem, perseverança!

Tudo no seio da natureza tem que seguir a sua marcha regular. Longe está ainda a vossa ciência do que virá a ser. Grande poder o Senhor deu ao homem, mas é necessário que este se faça digno de exercitá-lo. Tudo é sábio, repetimos, na obra divina; tudo tem um destino e concorre, pela ação dos Espíritos do Senhor, segundo as suas vontades e sob o império de suas leis imutáveis — para a execução da obra geral, pelos fenômenos da natureza para o progresso do vosso planeta, de tudo o que nele existe e da vossa humanidade, concorrendo também para o cumprimento das vossas provações, das vossas expiações que, no conjunto da obra, representam elementos e meios de progresso. Os homens que sucumbem num naufrágio são levados a morrer assim por efeito das provações que escolheram. Portanto, seja ou não conhecida do homem a causa, o resultado existirá.

Aquele que, ao encarnar, escolheu por provação a morte violenta, precedida das angústias e alternativas que cercam os últimos momentos do náufrago, sujeito a se debater entre a submissão ao Criador, a resignação, o remorso das faltas passadas, a confiança na bondade divina e o pavor, a blasfêmia, a raiva insensata que se apodera de alguns nessa hora terrífica, será levado, pelo seu próprio Espírito, a preferir um navio a outro, a se ver urgido por um negócio a em- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 111

barcar em determinada ocasião, a contar mesmo com um acaso feliz, com a sorte, com a sua boa estrela. E partirá porque, durante o desprendimento a que o sono dá lugar, o seu Espírito se torna consciente das sérias obrigações que contraiu e toma de novo a resolução de conduzir o corpo à situação em que, unidos, devem ambos terminar suas provas, voltando este à massa comum e libertando-se ele, o Espírito, da escravidão corporal e readquirindo a liberdade. A resolução assim retomada e da qual não resta lembrança no estado de vigília deixa no homem uma impressão vaga que vem a constituir o que se chama a sua inspiração, a determinante de seus atos.

Assim como não pode prever o seu naufrágio, também o homem não prevê a hora em que as chamas de um incêndio lhe devorarão a casa, em que será sepultado pelo desabamento da escavação, da mina, pedreira onde trabalhe e os que têm de perecer desse modo perecem. Porquê? Porque, semelhantemente ao náufrago, escolheram, para terminação da vida terrena, a morte violenta, cercada das angústias e alternativas das daquele e precedida da mesma luta entre a submissão ao Criador, a resignação, o remorso, a confiança na bondade divina e o pavor, a blasfêmia, o desespero. Como o náufrago, foram levados, pelos seus próprios Espíritos, a preferir uma habitação a outra, em certa ocasião, a preferir, para trabalhar, esta escavação àquela.

Os que tenham de perecer de qualquer desses modos, por haver soado a hora final das suas provas terrenas e por serem de qualquer desses gêneros a provação e a expiação que escolheram, perecem inevitavelmente.

Os que devam escapar à morte, por não haver soado ainda aquela hora, escapam. Os meios de salvamento lhes são facultados pela influência e pela ação dos Espíritos prepostos. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 112

Não tendes visto duas pessoas caírem da mesma forma e nas mesmas condições e dar-se que uma pereça da queda e que a outra não morra? Não costumais dizer: foi milagrosamente salva?

Quando, num naufrágio, num incêndio, ou num desabamento todos perecem, é que todos tinham chegado ao termo de suas provações e haviam escolhido por provação e expiação aquele gênero de morte.

No mesmo dia, à mesma hora, não morre na terra uma porção de homens? Dêem-se ou não no mesmo lugar as mortes, a razão é sempre a mesma: terminação das provas terrenas.

Todos estes fatos ocorrem às vistas dos homens sem que eles procurem conhecer, quer as causas da morte, quer as causas, as influências que preparam e põem em prática os meios, quaisquer que sejam, de salvamento, fazendo-o por forma tal que tudo quanto deva suceder sucede.

Deus nada espera do que chamais — o acaso. Tudo o que tenha de acontecer, do ponto de vista da terminação das vossas provas, das vossas expiações, acontece pela ação dos vossos próprios Espíritos e sob a influência espírita.

Tudo tem, pois, a sua razão de ser: a pena de talião é muitas vezes escolhida pelo Espírito culpado. Um que, em precedente existência, cometeu o crime de assassínio friamente premeditado, pode obter, da bondade e da justiça do Senhor, expiar essa falta por uma lenta agonia, cujos transes o depurem e o reconduzam Aquele a quem ofendera.

O que acabamos de dizer não convém seja separado, quanto ao que se deva entender pelo que chamais — o instante fatal da morte, atento o livre arbítrio do homem, da explicação que vos daremos acerca do Quinto Mandamento do Decálogo.

No estado de inferioridade em que ainda se acha OS QUATRO EVANGELHOS (II) 113

o vosso planeta, os flagelos, a peste, a fome e a guerra contribuem para o progresso dos povos, porque são meios de provações e expiações e servem para o desenvolvimento da civilização, da ciência, do adiantamento moral e intelectual, abrindo caminhos à atividade, à prática do devotamento e da caridade.

As vítimas dessas calamidades o são voluntariamente, pois que, a título de provação, de expiação ou de missão, procuraram por si mesmas nascer num país, no seio de uma família, viver ou achar-se em um lugar onde viessem a experimentar qualquer daqueles chamados flagelos.

São efetivamente flagelos, no sentido de que atingem indistintamente grandes e pequenos, lembrando assim ao homem que, diante do poder divino, todas as cabeças se encontram à mesma altura e que, uma vez caídas, todas ficam rentes com o solo.

Não vos lamenteis, portanto, quando virdes uma calamidade pública abater-se sobre um país. Dizei, ao contrário: "Bendito seja o Senhor, que estende seu flagelo por sobre as massas e pesa na sua balança o valor de seus povos, que manda às nações o progresso e a paz aos homens de boa vontade".

Tudo segue marcha regular objetivando o progresso de ordem física, de ordem moral e de ordem intelectual.

Tudo, na natureza, é preparado e dirigido pela ação dos Espíritos prepostos, segundo a vontade do Senhor e sob o império das leis naturais por ele estabelecidas desde toda a eternidade.

Foi assim que, pela vontade do Mestre, a quem Deus tudo outorga, que de Deus recebe diretamente a inspiração e ilimitados poderes, e pela ação dos Espíritos prepostos, se desencadeou e aplacou a tempestade, sucedendo-lhe grande calma. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 114

MATEUS, Cap. VIII, v. 28-34. -- MARCOS, Cap. V, v. 1-20. —LUCAS, Cap. VIII, v. 26-40

Legião de maus Espíritos expulsos. —Libertação dos subjugados. — Porcos precipitados no mar

MATEUS: V. 28. Ao chegar Jesus, na outra margem do lago, à terra dos Gerasenos, vieram-lhe ao encontro, saindo dos túmulos, dois possessos tão furiosos que ninguém ousava passar por aquele caminho; — 29, e se puseram a gritar: Jesus, filho de Deus, que há entre ti e nós? vieste aqui para nos atormentar antes de tempo? — Não longe dali havia uma grande vara de porcos pastando; — E os demônios suplicaram a Jesus: Se nos expulsares daqui, manda-nos para aqueles porcos. — 32. Jesus lhes disse: Ide; e eles, saindo dos possessos, passaram para os porcos; logo toda a manada partiu a correr impetuosamente e se foi precipar no lago, onde os porcos morreram afogados. — 33. Então, os que os guardavam fugiram e indo à cidade narraram tudo o que sucedera aos possessos. — 34. Todos os habitantes da cidade saíram ao encontro de Jesus e, ao vê-lo, lhe pediram que se retirasse do país.

MARCOS V. 1. Tendo atravessado o mar, desembarcaram no país dos Gerasenos; — 2, e, mal Jesus descera da barca, um homem possuído do Espírito imundo veio ter com ele, saindo dos sepulcros.— 3, onde tinha a sua morada habitual, homem esse que ninguém mais conseguia prender, nem mesmo com correntes; — 4, pois que muitas vezes já tinha estado com ferros aos pés e preso por cadeias e os quebrara, não havendo quem pudesse dominá-lo. — 5. Vivia dia ,e noite nas montanhas e nos sepulcros, a gritar e a flagelar-se com pedras. — 6. Ao ver Jesus, de longe, correu para ele e o adorou; — 7, exclamando em altas vozes: Que há entre ti e mim, Jesus, filho do Deus Altíssimo? Eu te conjuro, por Deus, a não me atormentares. 8. Isso porque Jesus lhe ordenava: Espírito imundo, sai desse homem. — 9. Perguntando-lhe Jesus: Como te chamas? respondeu: OS QUATRO EVANGELHOS (II) 115

Chamo-me Legião. porquanto somos muitos. — 10. E lhe pedia com instância que não o expulsasse daquele país. — 11. Ora, havia ali uma grande vara de porcos pastando na encosta do monte; — 12, e os demônios faziam a Jesus esta súplica: Manda-nos para aqueles porcos, a fim de que entremos neles. — 13. E como Jesus lhes desse prontamente permissão para isso, os Espíritos impuros, saindo do possesso, entraram nos porcos e toda a manada, que era de perto de duas mil cabeças, correu com grande impetuosidade e foi precipitar-se no mar, onde se afogou. — 14. Os que a apascentavam fugiram e foram espalhar na cidade e nos campos a notícia do que se passara e uma multidão saiu a ver o que acontecera. — 15. Veio ter com Jesus e, vendo o homem que estivera atormentado pelo demônio assentado, vestido e em seu juízo, os que a compunham se encheram de temor; — 16, e, ouvindo dos que presenciaram os fatos a narrativa do que sucedera ao possesso e aos porcos, — 17, se puseram a pedir a Jesus que deixasse aquelas terras. — 18. Ao volver ele para a barca, o homem que estivera atormentado pelo demônio suplicou que lhe fosse permitido acompanhá-lo. — 19. Jesus, porém, lho recusou, dizendo: Volta para tua casa, para o meio dos teus e conta-lhes tudo o que por ti fez o Senhor; e que ele de ti se compadeça. — 20. O homem partiu e começou a espalhar em Decápolis tudo o que Jesus lhe fizera, causando admiração a todos.

LUCAS: V. 26. Vieram navegando até ao país dos Gerasenos, que fica defronte da Galiléia. — 27. Ao saltar Jesus em terra, veio ter com ele um homem que desde muito tempo estava possuído do demônio, que não trazia roupa alguma e não morava em casa, mas nos supulcros. — 28. Logo que viu a Jesus, se prostrou diante dele e, em altos brados, dizia: Jesus, filho do Deus Altíssimo. que há entre ti e mim? Eu te suplico, não me atormentes. — 29. Isso porque Jesus ordenava ao Espírito imundo que saísse daquele homem que, havia muito tempo, era por ele violentamente assaltado. De nada servia prenderem-no com correntes e porem-lhe ferros aos pés; quebrava as correntes e os ferros e era impelido pelo demônio para os lugares ermos. — 30. Jesus lhe perguntou: Qual é o teu nome? OS QUATRO EVANGELHOS (II) 116

Ele respondeu: Chamo-me Legião, pois que muitos demônios tinham entrado nele. — 31. E esses demônios pediam a Jesus que os não mandasse para o abismo. — 32. Como num monte próximo estivesse pastando uma grande vara de porcos, os demônios pediram a Jesus que lhes permitisse entrar nos porcos, o que lhes foi concedido. — 33. Saíram então do homem, entraram nos porcos e logo toda a manada correu com impetuosidade a se precipitar no lago e aí se afogou. — 34. Vendo isso, os que a guardavam fugiram e foram contar na cidade e nas aldeias o que se passara. — 35. De uma e de outras acorreram muitas pessoas a ver o que sucedera e, vindo onde estava Jesus, encontraram o homem que ficara livre dos demônios, sentado a seus pés, vestido e de perfeito juízo, o que as encheu de temor. — 36. E os que tinham visto o que se passara lhes referiram como o possesso fora libertado da legião dos demônios. — 37. Então, toda a multidão de habitantes do país dos Gerasenos pediu a Jesus que se retirasse dali, por se acharem aterrorizados. Jesus tomou de novo a barca e partiu. — 38. O homem de quem os demônios tinham saído suplicava que lhe fosse permitido acompanhá-lo. Jesus, porém, o mandou embora, dizendo: — 39. Volta para tua casa; narra o que Deus fez por ti. E o homem foi por toda a cidade espalhando a notícia do que lhe fizera Jesus. — 40. Regressando este, o povo o recebeu com alegria, pois que todos o esperavam.

N. 120. A homens materiais são necessários ensinamentos de feição material.

Sabeis que horror tinham os Judeus ao porco, animal imundo no dizer das ordenações de Moisés.

Querendo dar a compreender aos homens até que ponto eram perigosos e repelentes os Espíritos obsessores, Jesus permitiu que os que atuavam desde tanto tempo, de modo tão cruel e violento, quanto extraordinário aos olhos humanos, sobre aquele "demoníaco", isto é, sobre aquele homem que traziam subjugado, assombrassem os porcos que ali perto pastavam. Os homens, crentes de que os Espíritos, abandonando o possesso, entraram nos porcos, compreen- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 117

deram melhor o desprezo que lhes deviam inspirar tão perigosas instigações, a que podiam estar sujeitos todos os que não se esforçassem por trilhar o caminho que leva à salvação.

Notai que os Espíritos impuros se satisfizeram com o espantar os porcos; não foram habitar neles. Assim como o obsessor não habita no subjugado, limitando-se a influenciá-lo por meio de uma ação fluídica, conforme já explicamos (n. 74, 1º vol.), conservando-se-lhe ao lado e atuando moralmente sobre ele, também os Espíritos impuros que, obedecendo à vontade de Jesus se colocaram na sua passagem para servirem de instrumento à lição que ele desejava dar, se acercaram dos porcos e os espantaram, impelindo-os a se precipitarem no lago.

Não admitais nunca a união, embora momentênea, entre o Espírito e o animal, isto é, a subjugação corporal deste por aquele nem, ainda menos, a substituição ou a possessão.

Já explicamos (n. 74) os meios por que se opera, as condições a que obedece e os efeitos que produz a subjugação, quer corporal, quer corporal e moral, bem como a possessão ou a substituição. Não temos que voltar a esse assunto.

Sobre o homem subjugado a influência do Espírito obsessor é, como sabeis, fluídica.

Sobre os animais não pode ser e não é senão moral, no sentido de que a ação consiste em produzir neles o espanto, o terror.

O perispírito do Espírito não pode atuar fluidicamente sobre os animais por ser impossível a combinação dos respectivos fluidos, uma vez que os princípios não são idênticos. Para vos explicarmos as causas daquele fenômeno teríamos que entrar em particularidades que ainda não é chegado o momento de conhecerdes. Para podê-las compreender, o homem tem que se entregar a estudos preparatórios sobre a natureza dos fluidos, seus efeitos, suas OS QUATRO EVANGELHOS (II) 118

propriedades de ação, segundo as leis naturais que lhes regem o emprego, a aplicação e a disposição em cada reino da natureza. E, bem o sabeis, se Deus quer que vos ajudemos, quer também que trabalheis.

Não vos admireis de que, dirigindo-se ao obsessor chamado — legião, por serem muitos, Jesus tenha ordenado: "Sai desse homem", nem de que se vos diga que permitiu aos Espíritos impuros entrarem nos porcos e que assim aconteceu. Ë que não chegara o momento, ainda distante, de serem explicadas as causas e os efeitos da subjugação, quer corporal e moral, assim como da ação dominadora que os Espíritos podem exercer sobre os animais, e se fazia mister na ocasião usar, para com os homens, de uma linguagem adequada a seus entendimentos e às idéias em voga. À nova revelação estava reservado dar aquelas explicações na era do advento do Espiritismo.

Não vos detenhais em apreciar a acusação, tão pueril quanto fútil, que dirigem a Jesus, por ter, segundo dizem, causado um prejuízo ao dono da vara de porcos com o fazê-los precipitar-se no lago e afogar-se.

Tal acusação só pode provir de homens materiais, que não compreendem o sentido, o alcance e o fim do ensinamento, da lição que, por aquela forma, quis Jesus dar e deu.

Que vale um interesse material quando se trata de salvar os homens? Mas, ficai tranqüilos vós que, apesar das vossas boas intenções, não vos podeis libertar do jugo da matéria. Os porcos pertenciam a ricos proprietários para os quais o prejuízo foi ligeiro, insignificante, tanto que os guardadores nem sequer repreendidos foram, tão grande repercussão teve aquele fato como resultante da vontade de Jesus. Nunca o Senhor comete injustiça; tudo passa pelo crivo da sua sabedoria; tudo tem um fim que há de ser alcançado para a felicidade dos homens. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 119

Tampouco deis atenção à diferença, destituída de importância, sem nenhum valor, sem influência alguma nos fatos e no ensinamento, na lição que deles devia decorrer, entre a narração de Mateus e as de Marcos e Lucas, consistindo em dizer o primeiro que dois eram os "possessos" e os últimos que o 'Possesso" era um só. Havia apenas um subjugado.

Foi para que se realizasse a obra, que Jesus tinha em mente, que o homem tratado de "possesso do demônio, possesso de um Espírito impuro", veio ao seu encontro, sob a influência e pela ação dos obsessores, que a seu turno obedeciam à vontade do Mestre.

Tudo o que, segundo se vos diz, esse homem fazia, subjugado corporal e moralmente por uma legião de maus Espíritos, era efeito da subjugação. Ele se achava à mercê dos caprichos de seus obsessores e a subjugação lhe servia ao mesmo tempo de provação e expiação, porquanto aquele que na terra necessita de provações tem sempre o que expiar. As provações e as expiações se completam.

O obsidiado era, inconscientemente, médium de efeitos físicos e os obsessores procediam de acordo, pela subjugação corporal e moral e pelos meios que já explicamos (n. 74), servindo-se dos fluidos animalizados da vítima, mas independentemente da vontade desta.

Quando se apresentou a Jesus, não trazia roupa alguma, despira-se completamente. Não é que os obsessores lhe houvessem tirado com violência as roupas; apenas lhe tinham inspirado horror a todo e qualquer constrangimento. Assim, ele não podia nem queria suportar vestuário algum, sujeito como estava aos caprichos dos Espíritos impuros.

"Não habitava nas casas, passava os dias e as noites nas montanhas e nos sepulcros, gritando e supliciando-se a pedradas: estivera muitas vezes com OS QUATRO EVANGELHOS (II) 120

ferros aos pés e preso por correntes; quebrara as correntes e os ferros" .

Tudo isso era efeito dos caprichos dos maus Espíritos que formavam, pelo seu grande número, uma legião; era resultado da subjugação corporal e moral e do constrangimento produzido por essa subjugação. Como médium de efeitos físicos, mas insconsciente, o subjugado praticava por si mesmo, na opinião dos homens, aqueles atos. A verdade, porém, é que os maus Espíritos, com força bastante para isso, atuavam de comum acordo sobre ele, para obrigá-lo a praticar tais atos, graças à sua mediunidade, exercendo com seus perispíritos uma ação fluídica sobre a vítima, dominando-lhe a vontade, que governavam arbitrariamente.

"Quebrava as cadeias e os ferros por muito que o vigiassem; ninguém mais podia prendê-lo; nenhum homem conseguia dominá-lo".

Como bem podeis compreender, os maus Espíritos que o cercavam se divertiam em impedir que os guardas lhe pusessem peias, ou, se deixavam que o fizessem, era com o intuito de quebrarem os ferros e correntes. Para a obtenção deste resultado o homem fazia os movimentos, mas os maus Espíritos é que lhe emprestavam a força necessária, exercendo sobre ele violenta ação fluídica, resultado da combinação dos fluidos de seus perispíritos com os do subjugado.

"Era impelido pelo demônio para o deserto".

Em algumas traduções, oriundas de uma falsa interpretação da letra e do Espírito do texto original, se diz que o homem "era arrebatado pelo demônio".

Colocando-vos no ponto de vista dessas traduções, tomai a palavra "arrebatado" em sentido figurado e tê-la-eis significando: "impelido violentamente, contra a vontade". Não usais muitas vezes, referindo-vos à carreira desabalada de uma pessoa, dizer que ela é arrebatada pelo vento? OS QUATRO EVANGELHOS (II) 121

Sem dúvida alguma o fato fora possível. Tendes disso exemplos nos vossos dias, notadamente o do Espírito chamado — o duende de Baiona — a transportar a irmã pelos ares. No nosso caso, porém, nada se deu de semelhante. Havia apenas uma corrida desordenada, que enchia de terror os que a presenciavam. Uma transportação pelos ares houvera originado a crença de que se tratava mais de um ato "do céu" do que de um ato "do inferno".

Tendo em vista esses fatos conhecidos e notórios, foi que, subjugado corporal e moralmente pelos obsessores, os quais, a seu turno, eram, no momento, dominados e dirigidos pelos Espíritos superiores, aquele homem, tão furioso que "ninguém ousava passar por perto dele", saindo dos sepulcros, correu ao encontro do Mestre, o adorou e, como médium falante, proclamou em altas vozes, diante do povo, ser Jesus — "filho de Deus, filho do Deus Altíssimo". Exprimindo-se desse modo pelo órgão do subjugado, os maus Espíritos provavam a identidade do Cristo. Obedecendo às ordens do Alto, os Espíritos do Senhor lhes fizeram ver o futuro e os esplendores de Jesus, em quem reconheceram, não um homem, mas um Espírito mais puro do que os mais puros que o cercavam.

Perguntando a Jesus se viera para os atormentar antes de tempo, aludiam à época em que o conhecimento, que o homem havia de adquirir, das causas e dos efeitos da subjugação, o poria em condições de se escudar contra ela. Por instantes, a presciência lhes foi concedida e eles entreviram de relance o estabelecimento do reino do Senhor no vosso planeta e a sua mão potente a espalhar a luz por sobre os homens, como o sol espalha seus raios por sobre a terra, nos belos dias estivais.

A consciência que assim tiveram do porvir aqueles Espíritos impuros não durou mais que um OS QUATRO EVANGELHOS (II) 122

momento, logo se apagou. Foi como um raio de luz que brilha em meio das trevas e no mesmo instante se some, deixando que as trevas se tornem de novo espessas.

O pedido que dirigiram ao Mestre, para que os não expulsasse daquele país, era motivado pela preferência que certos Espíritos conservam por tais ou tais lugares onde viveram, quer na última encarnação, quer em outra anterior, que lhes deixou vago sentimento de apego a tais sítios.

Usando da faculdade de médium falante do subjugado e servindo-se do seu órgão vocal, os mesmos Espíritos pediam a Jesus que os não mandasse para o abismo. Esta locução — abismo — era alegórica e de natureza a impressionar a multidão. O abismo é a imensidade. Para os Espíritos impuros, semelhante locução tinha uma significação precisa: a imensidade onde o Espírito criminoso erra isolado, condenado às trevas e às angústias causticantes do remorso, equivale bem, ficai certos, ao abismo que a vossa imaginação vos representa como sendo uma fornalha ardente a devorar carnes fictícias, sem jamais as consumir.

Os maus Espíritos chamados "demônios" suplicavam mui sinceramente que os não condenassem a esse estado de insulamento, que, por assim dizer, mata moralmente o Espírito culpado, mas com o fim de o melhorar, levando-o ao arrependimento.

O Espírito condenado às trevas e às angústias do remorso não sai do espaço. É no próprio espaço que se faz o insulamento, pela vontade do Senhor. O culpado pode ser e é muitas vezes condenado a uma prisão celular de que o homem não logra formar idéia. Pode ser condenado a habitar, por bem dizer, no teatro de seus crimes, como igualmente pode ser constrangido a permanecer num insulamento completo, sem a possibilidade de praticar um ato da sua vontade, nem movimento algum, sem contato com qualquer outro Espírito e cercado de espessas trevas que, sobre a sua OS QUATRO EVANGELHOS (II) 123

organização, isto é, sobre o seu Espírito e o seu perispírito, produzem o efeito que uma atmosfera pesada e empestada produziria num homem todo amarrado.

Em suma, a expiação é, como sabeis, sempre apropriada e proporcionada aos crimes e faltas cometidos e obedece sempre às condições necessárias a incutir no culpado o remorso, a lhe despertar a consciência, a desenvolver nele, cada vez mais, as angústias, que o prepararão e levarão ao arrependimento.

Mas, notai-o bem: nenhum Espírito é condenado a servir de carrasco para seu irmão, por mais culpado que este seja.

Todas as visões do criminoso se produzem pela ação de uma vontade poderosa, que o condena a ver o que devia ter diante dos olhos até o instante do arrependimento.

É um efeito de combinação de fluidos, resultante do magnetismo espiritual, da qual ficareis inteirados quando houverdes avançado bastante para dar começo ao trabalho que queremos seja feito pelo médium sobre os fluidos e suas propriedades.

Ainda que pouco desenvolvido e precisando muito desenvolver-se, o progresso já realizado pelo magnetismo humano vos permite fazer idéia do que é capaz de conseguir a vontade poderosa do Espírito superior, no tocante aos efeitos fluídicos.

Como sabeis, o magnetizador pode, por ato de sua vontade e pela ação dos fluidos magnéticos, atuar sobre o seu paciente, achando-se este no estado sonambúlico, por maneira a dar-lhe, do que não passa de pura ficção, a impressão de um fato real, a fazê-lo acreditar e ver o que queira que ele veja e acredite, mesmo depois do despertar, conforme já vo-lo explicamos no n. 31. Tendes disso exemplos obtidos pelo estudo e pela observação, no campo da ciência atual do magnetismo humano. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 124

Assim, deveis compreender qual seja o poder do Espírito superior relativamente às visões do criminoso e como aquele, com o auxílio do magnetismo espiritual, por ato da sua poderosa vontade, tirando das combinações fluídicas os desejados efeitos, consiga produzir tais visões, a fim de que o culpado veja o que está condenado a ver e tenha, do que não passa de ficção, a impressão da realidade.

Quando, pelo órgão do subjugado, diziam a Jesus: "Manda-nos para aqueles porcos, a fim de que neles entremos", os Espíritos impuros se achavam dominados e governados pelos Espíritos superiores. Estes é que os impeliam a sé exprimirem desse modo.

Logo que Jesus lhes concedeu a permissão pedida, eles se acercaram dos porcos, os espantaram por meio de uma aparição só visível para os mesmos porcos e os impeliram na direção do lago, a fim de que aí se precipitassem, perseguindo-os com aquela aparição, que revestia uma forma e fazia gestos e ameaças de natureza a os aterrorizar.

Para lhes infundir esse terror, os Espíritos impuros não se serviram da forma humana. O Espírito, como sabeis, pode tomar a forma, a aparência que julgue necessária à obtenção do resultado que deseje. Para causar terror, muitas vezes o Espírito inferior reveste a forma, a aparência de um animal perigoso e inimigo do que ele quer amedrontar. Foi o que se deu com os que assombraram os porcos e os fizeram precipitar-se no lago.

Acabamos de dizer que a aparição só era visível para os porcos. Se assim não fora, o povo não teria acreditado que os Espíritos entraram nesses animais.

Um médium vidente que se achasse entre a multidão não houvera, embora fosse essa a vontade dos Espíritos impuros, podido vê-los sob a forma, a OS QUATRO EVANGELHOS (II) 125

aparência que tomaram, porquanto a vontade desses Espíritos nenhum poder tinha para consegui-lo. Eles se mostraram aos porcos, porque a isso haviam sido autorizados, mas não lhes era lícito ir além. Tudo se realizava segundo a vontade de Jesus, objetivando o resultado que ele queria alcançar.

O fato de serem os Espíritos impuros visíveis para os porcos, quando não o eram para o povo, não vos deve causar mais admiração do que o de, lado a lado dois médiuns videntes, só um ver o Espírito que se manifesta. Nesse caso, a vontade do Espírito intervém.

Quanto aos animais, a visão para eles se produz exclusivamente pela vontade do Espírito, porquanto a combinação dos fluidos entre o Espírito e o animal é, como o dissemos, impossível, ao passo que, para se tornar visível ao médium vidente, o Espírito obra por ato da sua vontade e exerce sobre o médium uma ação fluídica.

Não admitais nunca, repetimos, a possibilidade de uma união, embora momentânea, entre o Espírito e o animal. Não subjugação corporal deste por aquele e ainda menos possessão, substituição. Há apenas subjugação moral, no sentido de que o Espírito consegue espantar o animal, enchê-lo de terror, obrigá-lo a atos extravagantes, que podeis considerar materiais, mas que nem por isso deixam de tocar a inteligência relativa daquele que a sofre.

A vontade do obsessor basta por si só para tornar vidente o animal, pela razão de que o Espírito deste é mais apto do que o vosso a ter a faculdade da vidência e ainda porque a vontade do Espírito, por mais inferior que ele seja, domina sempre o Espírito do animal, a menos que a isso se oponha um Espírito superior.

Não infirais daí que o animal vidente seja médium. Não o é na acepção exata da palavra, pois que não pode, em caso algum, servir de intermediário ao OS QUATRO EVANGELHOS (II) 126

Espírito para se manifestar ao homem. O animal goza de uma faculdade que lhe é peculiar. É vidente, mas não médium. Todavia, em certos casos ao alcance da vossa percepção, a faculdade que o animal possui, de ver, pode servir, especialmente pelo terror que dele se apodera, para, da presença do Espírito, prevenir o homem, quando coisa alguma material existe, visível ou tangível para este, capaz de justificar aquele terror.

Não pergunteis por que meios e processos o Espírito obsessor atua sobre a faculdade de visão do animal, para se lhe tornar visível. Entraríeis em particularidades inoportunas. A cada dia o seu labor. Afastando-vos do quadro que se vos traçou, poríeis sobre os ombros pesadíssimo fardo, que ainda nenhum homem pode carregar.

Permitindo aos Espíritos impuros que entrassem nos porcos, Jesus lhes permitia permanecer nas regiões habitadas pelos homens, circunvolvendo a humanidade, isto é, lhes consentia aproximar-se desta e ficar em contacto com ela.

Tal permissão lhes foi concedida para que, junto, assim dos que a título de provação ou de expiação viriam a ser vítimas de suas obsessões e subjugações, como dos que se interessassem por essas vítimas, pudessem eles receber o beneficio das preces e encontrar os meios de reflexão e de encaminhamento moral. Ela lhes foi sobretudo concedida para ensinamentos dos homens, porquanto aqueles Espíritos impuros não se quedaram inativos e foram repelidos pelos discípulos de Jesus.

O subjugado por aquela legião de maus Espíritos, quando, sob o peso da subjugação corporal e moral, tinha acessos violentos de fúria, ficava num estado aparente, mas que para os homens era real, de alienação mental, de loucura furiosa; tornava-se in- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 127

capaz de ter conhecimento de seus atos, perdia a consciência de seu ser. Nos momentos, porém, de menor violência, quando a calma se restabelecia, no sentido de ser menor a sua sobreexcitação, tornava-se consciente do seu estado, do constrangimento a que estava submetido e sofria com isso horrivelmente. Aí estava a punição dos crimes que cometera em anterior existência.

Logo que os "demônios saíram dele", isto é, logo que se viu livre da subjugação, recobrou, como observais ainda na atualidade, o uso pleno da razão, a liberdade do corpo e do Espírito.

A multidão que acorreu da cidade e dos campos, assim que teve conhecimento do que se passara pelos fugitivos guardadores dos porcos, encontrou o homem sentado aos pés de Jesus, vestido e de perfeito juízo. Estava vestido porque os discípulos o cobriram, tirando de suas vestes algumas peças. Uma vez liberto, ele se submetera alegremente aos costumes humanos.

"E de perfeito juízo, o que os encheu de terror". Aquele, que não podia até então ser contido, ali estava aos pés do Cristo, calmo e submisso. Tal submissão bastava para impressionar a multidão. A cessação dos sinais e manifestações de uma demência, furiosa no entender dos homens, traduzindo-se em atos violentos, desconexos, bizarros, em desordens e aberrações da palavra, os quais todos desapareceram com a subjugação, cedendo lugar à razão integral, à liberdade do corpo e do Espírito, foi qualificada de "milagrosa" por não ser compreensível, nem explicável.

Não negue a incredulidade atual, filha orgulhosa da ignorância, estes fatos autênticos que os evangelistas vos transmitiram. Que não zombe deles! que estude a ciência espírita; aprenda; observe, sem idéias preconcebidas, com humildade e a necessária perseverança; que se inicie na nova revelação, e acreditará, porque compreenderá.

Não tem o homem sob as vistas a revelação e a manifestação dos poderes do Espírito, ainda efeitos OS QUATRO EVANGELHOS (II) 128

físicos que se hão produzido em todos os tempos e se produzem hoje, debaixo de todas as formas, no ser humano e no que o cerca?

Não tem sob as vistas a revelação e a manifestação das faculdades dos Espíritos superiores, ministros da vontade de Deus, da sua providência e da sua justiça; do poder que eles exercem sobre os fluidos, visando a aplicação e a execução das leis naturais e imutáveis que regem a vida e a harmonia universais?

Não tem sob as vistas a revelação e a manifestação do poder dos Espíritos superiores sobre os fluidos, pelos efeitos formidáveis e terríveis a que dais o nome de flagelos; pelo estalar do raio que derriba os edifícios, fende o carvalho secular e muitas vezes causa a morte? pelo furacão que arranca e arrebata as árvores e destroça as habitações? pelas inundações que assolam, destroem e arrastam consigo tudo quanto encontram no seu percurso, na sua passagem? pela tempestade que arroja os navios de encontro aos arrecifes, onde se despedaçam e são tragados pelo mar?

O homem, vendo-se livre da legião dos maus Espíritos que o perseguiam, rogou a Jesus lhe permitisse acompanhá-lo. Jesus, porém, recusou, dizendo: "Volta para tua casa e conta as grandes coisas que Deus fez por ti, de quem se apiedou". E ele se foi embora, dando público testemunho do que Jesus fizera em seu beneficio. Era seu destino preparar os caminhos para o advento do Senhor. Jesus realizara um "milagre", que numerosas pessoas podiam testemunhar; por isso mesmo não ordenou ao homem que se calasse; ao contrário, o concitou a espalhar a notícia do que se dera, ao passo que em outras circunstâncias impunha silêncio aos que tinham logrado a felicidade de se ver livres de males quaisquer. É que, nestes casos, não tendo tido o fato grande publicidade, pudera ser con- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 129

testado, se houvessem querido espalhá-lo. Deixava então que se espalhasse por si mesmo, pronta e seguramente, sob a aparência de um mistério. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 130

MATEUS, Cap. IX, v. 1-8. — MARCOS, Cap. II, t'.1-12. — LUCAS, Cap. V, v. 17-26

Paralítico

MATEUS: V. 1. Tendo tomado de novo a barca, Jesus tornou a atravessar o lago e veio à sua cidade. — 2. E eis que lhe apresentaram um paralítico deitado no seu leito. Jesus, vendo-lhe a fé, disse ao paralítico: Filho, tem confiança; teus pecados te são perdoados. — 3. Logo alguns escribas disseram entre si: Este homem blasfema. 4. Jesus, lendo-lhes o pensamento. disse: Porque abrigais maus pensamentos nos vossos corações? — 5. Que é o que será mais fácil, dizer: "Perdoados te são os teus pecados", ou dizer: "Levanta-te e anda"? — 6. Ora, para que saibais que o filho do homem tem na terra o poder de remir os pecados, — "levanta-te", diz ele ao paralítico, "toma o teu leito e volta para tua casa". 7. Imediatamente o paralítico se levantou e voltou para casa. — 8. Vendo isso, a multidão, tomada de espanto, rendeu graças a Deus, que deu aos homens tal poder.

MARCOS: V. 1. Alguns dias depois voltou Jesus a Cafarnaum — 2. Assim ouviram dizer que ele estava em casa, reuniu-se lá tanta gente, que a casa ficou apinhada, até fora da porta; e ele pregava a palavra de Deus. — 3. Trouxeram-lhe então um paralítico carregado por quatro homens. — 4. Como, por causa da multidão, não o pudessem levar até junto do Mestre, fizeram no teto uma abertura e por aí desceram o leito em que jazia o paralítico. — 5. Observando-lhes a fé, disse Jesus a este último: Filho, teus pecados te são perdoados. — 6. Ora, estavam por ali sentados alguns escribas em cujos corações se aninhavam estes pensamentos: — 7. Que diz este homem? Ele blasfema; quem pode perdoar os pecados senão Deus Unicamente? — 8. Jesus pelo seu Espírito conheceu logo o que eles pensavam de si para si e lhes disse: Porque animais em vossos corações esses pensamentos? — 9. Que é o que será mais fácil de OS QUATRO EVANGELHOS (II) 131

dizer a este paralítico: Teus pecados te são perdoados? ou: Levanta-te, toma o teu leito e caminha? — 10. Para que saibais que o filho do homem tem, na terra, o poder de perdoar os pecados, — 11, digo-te (dirigindo-se ao paralítico): Levanta-te, toma o teu leito e volta para tua casa. — 12. No mesmo instante o paralítico se levantou, tomou o leito e partiu diante de toda a gente. Todos se encheram de espanto e, glorificando a Deus, diziam: Nunca vimos coisa semelhante.

LUCAS: V. 17. Um dia, em que estava a ensinar entre os fariseus e os doutores da lei que tinham vindo de todas as aldeias da Galiléia, da Judéia e de Jerusalém e se sentaram ao redor dele, e em que a virtude do Senhor estava com ele para os curar, — 18, eis que alguns homens, trazendo num leito um paralítico, procuravam meio de fazê-lo entrar na casa e chegar até junto do Mestre. — 19. Como não achassem por onde fazê-lo entrar, por causa da multidão, subiram ao telhado da casa e, levantando as telhas, por aí desceram o leito em que se achava o paralítico e o colocaram no meio da sala diante de Jesus. — 20. Este, observando-lhes a fé, disse ao doente: Homem, teus pecados te são perdoados. — 21. Então os escribas e os fariseus se puseram a pensar, dizendo de si para si: Quem é este que assim blasfema? Quem pode perdoar os pecados senão Deus unicamente? — 22. Jesus lhes conheceu os pensamentos e, respondendo, disse-lhes: Que é o que pensais no vosso íntimo? — 23. Que será mais fácil de dizer: Teus pecados te são perdoados, ou: Levanta-te e anda? — 24. Ora, para que saibais que o filho do homem tem, na terra, o poder de perdoar os pecados, digo-te (dirigindo-se ao paralítico): Levanta-te, toma o teu leito e volta para tua casa. — 25. No mesmo instante o paralítico se levantou diante de todos e, tomando o leito em que estivera deitado, voltou para sua casa, rendendo graças a Deus. — 26. Todos, tomados de assombro, glorificavam a Deus e, cheios de temor, diziam: Que coisas maravilhosas vimos hoje!

N. 121. Fora inútil insistirmos em explicações já dadas. Jesus curou o paralítico pelos mesmos meios OS QUATRO EVANGELHOS (II) 132

que indicamos (n. 110), quando tratamos do servo do centurião.

Operando aquela cura material, que os escribas ou doutores da lei, os fariseus e a multidão consideraram uma maravilha, um "milagre", assim como proferindo as palavras que dirigiu aos mesmos escribas e fariseus, cujos pensamentos lera, por ser sempre Espírito, embora figuradamente encarnado num corpo perispirítico com aparência de corporeidade humana, Jesus teve por fim, no momento, dar a ver aos homens que aquele que dispunha de tal poder estava acima de qualquer inteligência e forçá-los a curvar a fronte diante da autoridade divina.

"Vendo isto, a multidão se encheu de espanto e glorificou a Deus por haver dado tal poder ao homem". A multidão, os escribas e os fariseus consideravam então Jesus, como sabeis, um homem igual aos outros. Essas palavras, inspiradas à multidão e reproduzidas por Mateus sob a influência mediúnica, tinham um fim oculto, que só mais tarde, por ocasião do advento da nova revelação, se tornaria patente: o de preparar de antemão os homens a compreenderem que, quando houverem atingido os limites extremos da perfeição que podem conseguir na terra, também lhes será facultado fazer, ao tempo determinado por Deus e segundo os seus desígnios, coisas como aquelas, tidas na conta de maravilhosas, mas na realidade naturais. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 133

3 Escritório de cobrador de impostos.

MATEUS, Cap. IX, v. 9-13. — MARCOS, Cap. II, v. 13-17. —LUCAS, Cap. V, v. 27-32

Vocação de Mateus

MATEUS: V. 9. Ao sair dali viu Jesus um homem de nome Mateus, sentado no telônio3, e lhe disse: Segue-me. Logo o homem, levantando-se, o seguiu. — 10. E sucedeu que, achando-se depois Jesus à mesa na casa desse homem, vieram muitos publicanos e pecadores e se sentaram à volta da mesma mesa com Jesus e seus discípulos. — 11. Notando isso, os fariseus diziam aos discípulos: Como é que o vosso Mestre come na companhia de publicanos e de pecadores? — 12. Jesus, ouvindo-os, disse: Não são os que gozam saúde que precisam de médico e sim os doentes. — 13. Eia, pois, aprendei o que significam estas palavras: Quero a misericórdia e não o sacrifício; porquanto não vim chamar os justos, mas os pecadores.

MARCOS: V. 13. Jesus saiu de novo em direção ao mar; todo o povo o assediava e ele a todos ensinava. — 14. Ao passar, viu Levi, filho de Alfeu, sentado no telônio e lhe disse: Segue-me; e Levi, erguendo-se, o seguiu. — 15. Aconteceu que, achando-se Jesus à mesa em casa desse homem, muitos publicanos e pecadores, que em grande número o acompanhavam, se sentaram também à mesa com ele e os discípulos. — 16. Os escribas e os fariseus, vendo-o comer na companhia de publicanos e pecadores, disseram aos discípulos: Como é que o vosso Mestre come e bebe com os publicanos e os pecadores? — 17. Ouvindo o que diziam, Jesus lhes observou: Não precisam de médico os que estão bons e sim os doentes; eu não vim chamar os justos, mas os pecadores.

LUCAS: V. 27. Depois disso, Jesus partiu e vendo um publicano de nome Levi, sentado no telônio, disse-lhe: Segue-me. — 28. E o publicano, levantando-se e abandonando tudo, o seguiu. — 29. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 134

Levi lhe ofereceu, mais tarde, um grande festim em sua casa, onde havia muitos publicanos e outras pessoas que também tomaram lugar à mesa. — 30. Os fariseus e os escribas murmuravam e diziam aos discípulos de Jesus: Como é que bebeis e comeis com publicanos e pecadores? — 31. Jesus, respondendo, lhes disse: Não precisam de médico os que gozam saúde e sim os doentes. — 32. Não foi aos justos, mas aos pecadores que vim chamar à penitência.

N. 122. Provava assim Jesus aos homens que não se deve repelir os que pareçam indignos, porquanto onde não vedes senão fraude ou impureza pode o Senhor ter colocado um gérmen de virtude que a cultura fará frutificar. Sede, pois, indulgentes com os vossos irmãos. Estendei mão protetora aos fracos. Esforçai-vos por exalçar os aviltados. Imitai, finalmente, o divino modelo, procurando os doentes e tudo fazendo para os curar.

Mateus, que Jesus foi buscar entre os publicanos, era um Espírito elevado, que encarnara com a missão de auxiliar o Mestre na obra que ele descera a executar na terra. Inspirado pelo seu anjo de guarda e pelos Espíritos superiores que o cercavam, obedeceu no mesmo instante ao chamamento do Cristo e o seguiu. E, oferecendo ao Mestre o grande festim de que falam os evangelistas, lhe proporcionou, como devia suceder, ocasião e meio de dar aquela lição.

Tudo tinha sido previamente preparado. Tudo se cumpria, por ordem do Senhor, sob a inspiração, a influência e a ação ocultas dos Espíritos superiores, obedientes à vontade do Mestre.

Como discípulo do Cristo, Levi, filho de Alfeu, adotou o nome de Mateus. Por Levi é que era geralmente conhecido.

"Não são os que gozam saúde que precisam de médico", disse Jesus. "e sim os doentes". "Não vim em busca dos justos, mas dos pecadores". Assim como OS QUATRO EVANGELHOS (II) 135

aquele que goza saúde não precisa de médico, aquele que conscientemente obedece à lei do seu Deus não precisa de ser salvo, ele se salva por si mesmo. O Cristo chamava a si os que tinham reparações a fazer. Se convidava ao arrependimento, o seu convite só podia ser feito aos que tinham falido.

"Eia, pois", dizia aos escribas, aos fariseus, aos discípulos, aos publicanos, às pessoas de má vida — "aprendei o que significam estas palavras: Quero a misericórdia e não o sacrifício, porquanto não vim em busca dos justos, mas dos pecadores".

As palavras do profeta Oséas (cap. VI, v. 6): "Prefiro a misericórdia ao sacrifício e prefiro a ciência de Deus a todos os holocaustos", confrontadas com as do profeta Samuel (Os Reis, liv. 1, cap. II, v. 6-10), v. 6: "O Senhor dá e tira a vida, lança nos infernos e de lá retira", encerram, veladamente, o sentido oculto destas outras, proferidas por Jesus: "Quero a misericórdia e não o sacrifício".

A nova revelação vos vem ensinar o significado de tais palavras. Vimos, em nome do Cristo, nosso Mestre, dizer: Sejam quais forem as faltas e os crimes cometidos, havendo arrependimento, não haverá, para o Espírito culpado, sacrifício, isto é, penas eternas; haverá, ao contrário, misericórdia, o que quer dizer — perdão, subordinado este apenas, conforme à bondade e à justiça infinitas de Deus e com o duplo fim de aperfeiçoamento moral e progresso, às duas únicas condições seguintes: expiar o culpado, na erraticidade, após a morte, os crimes e faltas praticados, mediante sofrimentos ou torturas morais apropriados e porporcionados aos mesmos crimes e faltas; expiar, reparar e progredir, por meio da reencarnação e de novas provações.

Sim, onde quer que haja arrependimento, há perdão. Jesus, pois, queria a misericórdia, despertando no homem o remorso da falta ou do crime e o desejo OS QUATRO EVANGELHOS (II) 136

da reparação. A reparação é a conseqüência do arrependimento. Convidando ao arrependimento, Jesus facilitava a expiação e salvava assim os que de outro modo estacionariam longo tempo na impenitência. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 137

MATEUS, Cap. IX, v. 14-17. — MARCOS, Cap. II, v. 18-22. —LUCAS. Cap. V, v. 33-39

Jejum. —Pano novo. — Odres velhos. — Vinho novo. — Vinho velho

MATEUS: V. 14. Então, vieram ter com ele os discípulos de João e lhe perguntaram: Porque os fariseus e nós jejuamos freqüentemente e os teus discípulos não jejuam? — 15. Jesus lhes respondeu: Podem acaso chorar os filhos do esposo quando o esposo está com eles? Dia, porém, virá em que o esposo lhes será tirado; eles então jejuarão. — 16. Ninguém põe remendo de pano novo em roupa velha, por isso que aquele esgarçaria uma parte da roupa e lhe aumentaria o rasgão; — 17, e não se deita vinho novo em odres velhos, porque os odres se quebram, o vinho se derrama e os odres ficam perdidos; ao passo que, deitando-se vinho novo em odres novos, um e outros se conservam.

MARCOS: V. 18. Alguns discípulos de João e alguns fariseus que costumavam jejuar vieram e perguntaram a Jesus: Porque os discípulos de João e os fariseus jejuam e os teus discípulos não jejuam? — 19. Jesus lhes respondeu: Os filhos das núpcias podem acaso jejuar enquanto o esposo está com eles? Não podem jejuar, enquanto têm consigo o esposo. — 20. Mas, dia virá em que o esposo lhes será tirado; eles então jejuarão. — 21. Ninguém cose um remendo de pano novo em roupa velha, porquanto aquele arrancaria uma parte desta e tornaria maior o rasgão. — 22. Ninguém põe vinho novo em odres velhos, porquanto o vinho quebraria os odres, se derramaria e os odres ficariam perdidos; vinho novo em odres novos deve ser posto.

LUCAS: V. 33. Então, disseram-lhe: Porque é que os discípulos de João, assim como os fariseus jejuam freqüentemente e fazem orações, enquanto que os teus comem e bebem? — 34. Jesus lhes disse: Podeis obrigar os filhos do esposo a jejuar, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 138

enquanto o esposo está com eles? — 35. Dias virão em que o esposo lhes será tirado; eles então jejuarão. — 36. Fez-lhes também esta comparação: Ninguém prega remendo de pano novo em roupa velha, porque o novo rompe o velho e assim o pedaço de pano novo não convém à roupa velha. -37. Do mesmo modo, ninguém deita vinho novo em odres velhos, porque, se fizer isso, o vinho novo rebentará os odres, se derramará e os odres ficarão perdidos. — 38. O vinho novo deve ser posto em odres novos, porque assim tudo se conservará. — 39. E não há quem, bebendo vinho velho, prefira o novo, pois que diz: o velho é melhor.

N. 123. Todas as explicações que aqui cabem, para a compreensão do fim que Jesus objetivava com o ensinamento que deu de modo velado, entendem com o futuro espírita.

Os homens eram a roupa velha que, remendada impensadamente, teria sido destruída. Eram os odres velhos, impróprios para recipientes de um licor ativo que, fermentando, os despedaçaria.

Vós, espíritas, sois os odres novos nos quais o vinho novo é despejado abundantemente. Guardai-o como preciosidade e ele dará em vós bom produto; envelhecerá nos odres, melhorará e restituirá a força, a saúde e a vida aos que vierem bebê-lo.

O termo — "esposo" — pelo qual o Mestre se designava a si próprio, era tomado às idéias, às tradições e aos costumes hebraicos, pela consideração dispensada aos Hebreus que se casavam. Ora, sendo o chefe desta doutrina, que vos tem amparado apesar de todos os vossos desvios, Jesus era considerado como o mancebo puro que depõe a coroa nupcial, a fim de assumir o governo da família que constituiu para si.

Os filhos, os amigos do esposo são expressões sinônimas pela significação, indicando os que mais ligados e mais caros eram ao esposo.

Procurai compreender bem, segundo o espírito que vivifica e não segundo a letra que, agora, mata, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 139

procurai compreender, em espírito e em verdade, estas palavras que Jesus dirigiu aos discípulos de João e aos fariseus:

"Podem os filhos, os amigos do esposo jejuar, enquanto com eles está o esposo? Não podem jejuar, enquanto o esposo está com eles. Mas, dias virão em que o esposo lhes será tirado. Eles então jejuarão."

A presença de Jesus entre os discípulos os mantinha na senda que deviam trilhar. Não precisavam, pois, submeter-se a privações expiatórias. Mas, o futuro se distendia aos olhos do Mestre e ele antevia os abusos, os transviamentos que não tardariam a perverter a sua igreja, os seus filhos, isto é, à humanidade e os que tomariam a si a continuação da obra dos apóstolos e dos primeiros cristãos.

Antevia, portanto, necessária a expiação como meio de reparação. E o jejum material era, entre os Hebreus, o emblema da expiação.

O jejum de que Jesus falava e que os homens teriam de praticar nos tempos que se seguiriam ao desempenho da sua missão terrena não era o jejum material que os discípulos de João e os fariseus praticavam. Não; Jesus aludia às expiações a que os homens teriam de submeter-se, para reparar suas faltas; aludia ao jejum moral. O jejum material constituía entre os Hebreus um ato expiatório, destinado a reparar os erros leves da vida. Teve sua razão de ser (como daqui a pouco explicaremos), numa época em que só as leis materiais podiam dominar a matéria.

Consiste o jejum moral no remorso das faltas graves que cometeis todos os dias para com Deus, transgredindo suas leis, deixando de praticar o amor e a caridade, entregando-vos ao orgulho, ao egoísmo, à inveja, vícios que muitas vezes não chegais mesmo a lobrigar no fundo de vossos corações, tão grande é a vossa cegueira, tanta a confiança que cada um de vós OS QUATRO EVANGELHOS (II) 140

deposita em si próprio. Ah! jejuai, mortificando vossas almas para que se purifiquem. Bom é o jejum, mas o jejum moral. Ele é útil à alma culpada, pois que a expurga das impurezas.

Esse jejum, único que o Senhor exige, consiste em a criatura não se submeter nunca aos seus maus instintos, por mais agradável que isso lhe seja, em infligir voluntariamente a si mesma humilhações; quando tenham por fim o adiantamento de seus irmãos, ou constituam para eles um exemplo; em não se entregar a ato algum de culposa leviandade; em não se dar a excessos de qualquer natureza.

Não julgueis seja muito penoso para o homem viver tranqüilamente diante de Deus. Basta-lhe estar com a sua consciência em paz e satisfeita, para ter a força e a saúde do corpo.

De onde provém, senão dos excessos de toda ordem a que sujeitais vossos corpos, a degeneração das raças humanas? Que é o que produz o apoucamento das vossas inteligências, senão o arrojo desavergonhado das vossas idéias, senão o desejo imoderado de saber prematuramente mais do que lhe deva ser dado?

Formais uma sociedade — vivei em sociedade. Sede bons, amorosos e, assim, dignos de ser amados. Não procureis o luxo material que enerva, nem adquirir inconsideradamente a ciência que desvaira.

Jesus não pretendeu impor e não impôs a obrigação do jejum material, disse-o ele próprio.

"O que mancha o homem não é o que lhe entra no corpo, porquanto isto não lhe vai ao coração, mas aos intestinos e daí ao lugar secreto. O que mancha o homem é o que lhe sai do coração; são os maus pensamentos, as más palavras, as ações más, os vícios que degradam a Humanidade, as infrações da lei de Deus consignada no Decálogo e nestas palavras que encerram toda a lei e os OS QUATRO EVANGELHOS (II) 141

profetas: — amar a Deus acima de todas as coisas e amar o próximo como a si mesmo."

Os mandamentos humanos relativos ao jejum material, prescrevendo a privação de alimentos ou só permitindo, em determinadas épocas e em determinados dias, certas espécies de alimentos, foram e são inúteis para o homem de inteligência e de coração. Jamais o Senhor lhe impõe a obediência a tais mandamentos. Entretanto, tiveram sua razão de ser. A observância desses preceitos, por mais ridículos que sejam em si mesmos, foi um freio posto aos excessos da gula e da luxúria, numa época em que somente as leis materiais podiam dominar a matéria. Sujeitando o corpo a um regímen rigoroso, diminuíam-se-lhe as forças animais e continham-se assim muitos abusos.

Mantendo as prescrições materiais do jejum e da abstinência, a Igreja romana se conservou contemporânea dos escribas e dos fariseus. Sim, ela impõe um fardo pesado, que já não é necessário. Não quis caminhar com a Humanidade e hoje se acha distanciada desta. Mas, tudo voltará aos seus eixos, porque Deus o quer e suas vontades são imutáveis.

Os v. 16 e 17 de Mateus, 21 e 23 de Marcos, 36 a 39 de Lucas encerram, como dissemos ao começar estas explicações, alegorias espíritas. Aos homens daquele tempo e às gerações que se seguiram até aos vossos dias, precursores da era nova, se referia Jesus, quando falava da roupa já velha à qual não convinha pôr um remendo de pano novo; quando falava dos odres velhos dos quais o vinho novo, rebentando-os, se escaparia, ficando um e outros perdidos. Quer isso dizer que aqueles homens eram incapazes de receber, aceitar e conservar a nova revelação que, assim, ficava reservada para os tempos vindouros, para quando chegasse o momento de cumprir-se esta sentença: "a letra mata e o espírito vivifica"; para quando os OS QUATRO EVANGELHOS (II) 142

séculos e a reencarnação, que é meio de expiação, de reparação e de progresso, houvessem preparado as inteligências e os corações de maneira a fazer deles odres novos capazes de conservarem o vinho novo.

Materiais, ignorantes, obstinados nos seus preconceitos e tradições, os homens daquela época teriam sido esmagados pelo peso de um fardo para eles onerosíssimo, tê-lo-iam alijado dos ombros, ou teriam cegado pelo brilho de tão viva luz. Convinha-lhes primeiramente a linguagem da parábola, o regímen da letra, sujeita a interpretações humanas e materiais, a fim de que os necessários esforços e as constantes lutas do pensamento preparassem o advento do espírito.

"O vinho novo deve ser posto em odres novos, porque assim tudo se conserva."

Constituem o vinho novo os ensinos dos Espíritos do Senhor, que vêm dispor as coisas de modo a que tenham fim o mundo moral do erro e da mentira, a vossa fraqueza e a vossa ignorância; que vos vêm explicar, tornar compreensível e desdobrar, em espírito e em verdade, a lei simples e sublime de Jesus, tirando da letra o espírito, escoimando-a das falsas interpretações que lhe deram e que a alteraram ou desnaturaram, impedindo-a de produzir seus frutos.

Os odres novos são os verdadeiros espíritas que recebem e praticam esses ensinamentos; são os Espíritos que, purificados e esclarecidos pelo Espiritismo, farão rebentar o velho odre, incapaz de resistir à fermentação das idéias novas.

O odre velho existe em vossos dias. São aqueles que, cegos e interesseiros, bebendo em fontes impuras ou falsificadas, procuraram, procuram e ainda procurarão entravar a obra da regeneração humana, a formação da Igreja do Cristo, cujo templo é o vosso planeta e à qual todos os homens se tornarão fiéis OS QUATRO EVANGELHOS (II) 143

(Judeus e Gentios) pela prática da lei do amor e da caridade.

A igreja que os homens fizeram tem que ser transformada, vós o sabeis. Preparai, pois, espíritas, os materiais que hão de servir para a reedificação, a fim de que os obreiros do Senhor encontrem talhadas as pedras, quando for tempo de levantar o edifício.

O vinho novo e o odre novo se conservarão pela nova fé, nova no sentido de que avançará por estrada muito diversa da que segue a igreja que tendes.

"Não há quem, bebendo vinho velho, prefira o novo, pois que logo dirá: o velho é melhor."

Compreendei bem o sentido alegórico destas palavras de Jesus, que, veladamente, se referia à era nova que começa.

O vinho velho que deve ser preferido é o que já se despojou de todos os corpos estranhos, é aquele cuja fermentação o livrou de todas as impurezas, é aquele que, posto em odres novos, nestes envelheceu.

Quando, pois, vós outros da nova geração houverdes deixado fermentar nos vossos corações os desdobramentos, que trazemos, da doutrina de Jesus, podereis dar a vossos irmãos, para que o saboreiem, o vinho velho, que será preferido ao novo.

Se sois odres novos, recebei o vinho novo tal como em vós o despejam os Espíritos do Senhor. Não deixeis que se altere, vicie, corrompa, obstando à fermentação que vos purificará as almas de suas leveduras. Toda doutrina não conforme à lei de amor e de caridade que o Cristo pregou e ainda manda pregar; os erros em que se esforçam por vos mergulhar os cegos ou interesseiros, erros que são vinho novo adulterado, falsificado, a fermentar nalguns cérebros, enlouquecendo-os — eis o que impediria o vinho novo de OS QUATRO EVANGELHOS (II) 144

envelhecer, ou o alteraria, viciaria e corromperia em vós, arrastando-vos a atos de demência.

Dai o exemplo a vossos irmãos pela prática dos ensinos dos Espíritos do Senhor e da lei de Jesus que eles vos explicam em toda a verdade. Solidários e ligados pelos laços da caridade e do amor recíproco, preparai o advento da fraternidade universal. Então, emocionados e atraídos por esse exemplo, vossos irmãos dirão: o velho é melhor.

Sim, porquanto o velho será realmente velho, embora muitos o considerem novo. O que vos pregamos hoje não é a mesma lei que Jesus vos deu a conhecer? Que é o que intentamos senão fazer-vos voltar atrás em busca desse vinho que, há mil e oitocentos anos, espera que os homens o saboreiem?

Ele é novo no sentido de que está hoje apropriado, pela nova revelação, aos vasos que o devem conter. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 145

MATEUS, Cap. IX, v. 18-26. — MARCOS, Cap. V, v. 21-43. — LUCAS, Cap. VIII, v. 41-56

A filha de Jairo. —A hemorroíssa

MATEUS: V. 18. Tendo dito essas coisas, aproximou-se dele um chefe de sinagoga que, adorando-o, lhe disse: Senhor, minha filha acaba de morrer; mas vem, impõe-lhe as mãos e ela viverá. — 19. Jesus se levantou e, acompanhado pelos discípulos, partiu com o homem. — 20. Ao mesmo tempo, uma mulher que, havia doze anos, sofria de um fluxo de sangue, acercando-se dele por detrás, lhe tocou a fimbria da túnica; — 21, pois que dizia consigo mesma: Bastar-me-á tocar nas suas vestes para ficar curada. — 22. Jesus, voltando-se, a viu e lhe disse: Filha, tem confiança, tua fé te curou. E desde aquele momento a mulher se achou curada. — 23. Chegando à casa do chefe de sinagoga, disse Jesus aos tocadores de flauta e à multidão tumultuosa que lá encontrou: — 24. Retirai-vos, porquanto a menina não está morta, apenas dorme. Todos, porém, zombavam dele. — 25. Afastada a multidão, ele entrou e tomou a mão da menina, que logo se levantou. — 26. A notícia do fato se espalhou por toda a redondeza.

MARCOS: V. 21. Tendo passado na barca para a outra margem, grande multidão o cercou à beira mar. — 22. Um príncipe da sinagoga chamado Jairo, que viera à sua procura, ao vê-lo, se lhe lançou aos pés, — 23, e lhe dirigiu instantemente esta súplica: Minha filha está moribunda; vem e lhe impõe as mãos para que ela se cure e viva. — 24. Jesus partiu com ele, acompanhado pela multidão que o premia. — 25. Então, uma mulher que sofria de um fluxo de sangue, havia doze anos, — 26, e que padecera muito nas mãos de vários médicos, com os quais gastara todos os seus haveres, sem melhorar do seu mal, que antes se agravara, — 27, tendo ouvido falar de Jesus, se meteu na multidão e, aproximando-se dele por detrás, lhe tocou a túnica. — 28. Dizia: Se eu conseguir tocar-lhe apenas na roupa, estarei curada. — 29. No mesmo OS QUATRO EVANGELHOS (II) 146

instante o sangue deixou de correr e ela sentiu em seu corpo que estava curada do mal que a afligia. — 30. Jesus percebeu imediatamente que de si saíra uma virtude e, voltando-se para a multidão, perguntou: Quem tocou as minhas vestes? — 31. Os discípulos lhe ponderaram: Vês que a multidão te comprime por todos os lados e perguntas quem te tocou! — 32. Jesus, porém, passeando o olhar em torno de si, procurava descobrir quem o tocara. — 33. A mulher, que sabia o que se passara nela, atemorizada e a tremer, aproximou-se e, lançando-se-lhe aos pés, confessou toda a verdade. — 34. Jesus lhe disse: Filha, tua fé te salvou; vai em paz e fica curada de tua enfermidade. — 35. Estando ele ainda a falar, chegaram alguns familiares do príncipe da sinagoga e, dirigindo-se a este, disseram: Tua filha morreu; porque hás de dar ao Mestre o incômodo de ir mais longe? — 36. Jesus, porém, ouvindo isso, disse ao príncipe da sinagoga: Não temas; tem fé. — 37. E não permitiu que, afora Pedro, Tiago e João irmão de Tiago, mais alguém o acompanhasse. — 38. Chegando à casa do príncipe da sinagoga, deparou com um bando confuso de pessoas que choravam e soltavam grandes lamentos. — 39. Logo que entrou na casa, disse a essas pessoas: Porque vos achais aflitos e porque chorais? A menina não está morta, apenas dorme. — 40. Todos, porém, zombavam de suas palavras. Ele mandou que saíssem e, acompanhado pelo pai, pela mãe da menina e pelos que tinham vindo na sua companhia, entrou no aposento onde se achava a menina deitada. — 41. Tomando-lhe as mãos, disse: Talitha cumi, isto é, menina, levanta-te, eu o ordeno. — 42. No mesmo instante a menina se levantou e se pôs a caminhar, pois já contava doze anos, ficando todos admirados e maravilhados. — 43. Jesus lhes recomendou muito expressamente que ninguém viesse a saber do fato e mandou que dessem de comer à menina.

LUCAS: V. 41. Veio ter com ele então um homem chamado Jairo, que era príncipe da sinagoga e, lançando-se-lhe aos pés, lhe pediu que entrasse na sua casa, — 42, dizendo ter uma única filha de cerca de doze anos que estava a morrer. Partiu com ele Jesus, apertado pela multidão. — 43. Uma mulher que, havia doze anos, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 147

sofria de uma perda de sangue e que gastara com médicos tudo o que possuía, sem que nenhum houvesse conseguido curá-la, — 44, se aproximou dele por detrás e lhe tocou a fímbria da túnica, com o que logo o fluxo de sangue cessou. — 45. Perguntou então Jesus: Quem me tocou? Como todos negassem ter sido quem o tocara, Pedro e os que o cercavam lhe disseram: Mestre, pois que a multidão te aperta e comprime, como podes perguntar: Quem me tocou? — 46. Jesus replicou: Alguém me tocou, porquanto percebi que uma virtude saiu de mim. — 47. A mulher, verificando assim não poder ocultar-se, aproximou-se toda trêmula e, prostrando-se aos pés de Jesus, declarou diante de todo o povo o motivo por que o tocara e que ficara imediatamente curada. — 48. Jesus lhe disse: Filha, tua fé te salvou, vai em paz. — 49. Ainda não acabara de falar, chegou alguém e disse ao príncipe da sinagoga: Tua filha morreu; não dês ao Mestre mais incômodo. — 50. Mas, ouvindo isso, Jesus disse ao pai da menina: Não temas, tem fé somente e ela será salva. — 51. Chegando à casa de Jairo, não deixou que aí entrassem senão Pedro, Tiago e João, com o pai e a mãe da menina. — 52. Todos a choravam e lamentavam. Ele, porém, disse: Não choreis, ela não está morta, apenas dorme. — 53. Zombavam, porém, dele, por saberem que estava morta. — 54. Jesus, pegando--lhe na mão, exclamou: Menina, levanta-te: — 55. Seu Espírito voltou ao corpo, ela se levantou imediatamente e Jesus mandou que lhe dessem de comer. — 56. Os pais da menina se mostraram cheios de espanto e ele lhes ordenou que não dissessem a ninguém o que sucedera.

N. 124. Aí tendes a consolação de um pai; um exemplo de fé oferecido à multidão; a continuação, em suma, por parte do Cristo, daquela vida de ensinamentos, que constituía o desempenho da sua missão terrena.

Quanto à cura da mulher doente, Jesus a operou pelos meios que conheceis, pelo seu poder magnético.

Envolto em fluidos vivificantes, distribuía-os pelos que deles necessitavam. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 148

Quanto aos de que se serviu para fazer cessasse o fluxo sangüíneo, nada podemos dizer, por vos ser ainda impossível entrar no conhecimento das combinações fluídicas. O homem, como já o temos dito, não se acha ainda capaz de compreender a natureza dos fluidos, seus efeitos e suas propriedades de ação. Jesus dispunha dos fluidos vivificantes e reparadores; que isso por enquanto vos baste.

A pergunta: Quem me tocou? — pergunta que, feita pelo Mestre, pode causar estranheza, ele a formulou intencionalmente para provocar, diante da multidão, a confissão da mulher e assim tornar patente a todos o "milagre".

Pelo que respeita à filha de Jairo, o Espírito não abandonara o corpo, apenas se ausentara e Jesus o chamou. Ele tivera permissão de prolongar a sua ausência a fim de que o corpo, tornando-se completamente inerte, apresentasse todas as aparências da morte.

Para os homens, a filha de Jairo estava morta; essa era a aparência. Aos olhos de todos, a morte ali era indubitável, positiva. Na realidade, porém, não havia mais do que um estado de catalepsia completa, um estado, portanto, de morte aparente, de natureza a iludir os mais hábeis peritos.

Havia, dissemos, inércia completa, isto é, suspensão de todas as sensações, de todos os movimentos, da vida em suma, com ausência de pulso, de respiração, de calor, aspecto cadavérico, insensibilidade física, material, tão profunda que as pancadas, os ferimentos nenhuma impressão provocariam, nenhuma contração, nenhum sinal de vida.

Vindo ao encontro do chefe de sinagoga, seus servos lhe disseram: tua filha morreu. Mas, aos que choravam e faziam grande alarido Jesus disse: "Por que vos achais aflitos e porque chorais? A menina não está morta, apenas dorme". OS QUATRO EVANGELHOS (II) 149

Aos tocadores de flauta e ao grupo de pessoas que faziam grande algazarra, disse: "Retirai-vos, pois que a menina não está morta, apenas dorme". E todos, por saberem que ela estava morta, zombavam dele.

Afastada a multidão, disse ele à menina: "Levanta-te". E sua alma, tendo voltado ao corpo (uma vez que não estava morta, que apenas dormia), ela se levantou.

A menina não está morta, disse Jesus, apenas dorme — essa a realidade.

Não havia ali, com efeito, mais do que sono e sono natural ordinário, o que não deveis ter dificuldade em compreender, pois sabeis que a ausência do Espírito mergulha o corpo num sono profundo. Pelo desprendimento completo do Espírito se produz o estado de catalepsia.

Ao Espírito da filha de Jairo fora permitido ausentar-se, já o dissemos. Ele tivera uma permissão, não recebera uma ordem, porquanto o Espírito não precisa de ordem para se desprender do corpo. Precisa, sim, para entrar nele. O pássaro que se evade da gaiola apertada onde definhava não deseja voltar para a prisão. Procurai compreender aqui a posição do Espírito, reportando-vos aos atos da vida humana: o soldado que obtém uma licença sabe a que horas ela termina. Com mais forte razão o mesmo se dá com o Espírito em condições semelhantes.

Se o da filha de Jairo se houvera esquecido de voltar ou resistido ao regresso, os Espíritos superiores que o cercavam, vigilantes para que a ausência se prolongasse pelo tempo que necessário fosse à realização exata e integral da obra que Jesus intentava e ia realizar, o teriam impedido de frustrar por essa forma a execução do intento do Mestre. Aliás, semelhante resistência fora uma rebelião que de modo algum se verificaria contra a vontade de Jesus, acrescendo que OS QUATRO EVANGELHOS (II) 150

aquele Espírito não podia pensar em tal, uma vez que aceitara a missão que desempenhou.

O estado de catalepsia em que a menina caiu e que deu lugar à crença numa morte real e, por conseguinte, numa "ressurreição", no sentido que entre os homens essa palavra tem, se produziu porque entrava nos desígnios do Senhor que assim acontecesse para cumprimento da missão de Jesus e para que esta desse os frutos que devia dar naquele momento e no futuro.

Tudo o que assinalou a passagem de Jesus pela Terra fora previsto e preparado mediante as encarnações dos Espíritos que haviam de concorrer para a execução da sua obra de missionário.

Supondes, porventura, que o soberano Senhor do Universo possa esperar alguma coisa do que chamais — efeito do acaso?

Repetimos: o Espírito da filha de Jairo não abandonara o corpo. Completamente desprendido deste, que se achava imerso em profundo sono, estava a ele preso pelo cordão fluídico do perispírito, invisível para olhos humanos. Graças a essa ligação do Espírito com o corpo, a vida neste continuava a ser mantida, mas se achava suspensa pelo estado de catalepsia completa, que dava aos homens a impressão da morte real.

A filha de Jairo (disse-o Jesus aos que o cercavam) não estava morta, dormia.

Por ato de sua vontade poderosa, ele fez voltar o Espírito à sua prisão e, pela ação magnética, restituiu a saúde ao corpo da menina. Assim é que houve o despertar e a mocinha foi curada.

Para mais prender a atenção dos homens, mandou o Mestre que lhe dessem de comer.

Quanto à presença dos tocadores de flauta de que se vos fala, isso indica a observância de um uso hebraico em situações como aquela. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 151

"O rumor da ressurreição e do restabelecimento da filha de Jairo se espalhou por todo o país; mas Jesus ordenou aos que tinham estado presentes, ao pai e à mãe da menina, que nada a ninguém dissessem do que fora feito, do que se passara."

A multidão, como sabeis, não entrara. Não se vos disse que Jesus a deixou fora?

O Mestre conhecia o que o futuro reservava e assim não queria que, naquele momento, sua reputação se estendesse até aos sacerdotes e levitas.

O desprezo que uns e outros votavam à credulidade e à ignorância do povo os mantinha em guarda (no sentido de que nenhum crédito lhes davam) contra os fatos "milagrosos", isto é, impossíveis, para eles, de se produzirem e que a voz pública espalhava.

Aspecto diverso, porém, tomaria o caso se a "ressurreição" da filha de Jairo fosse atestada pelo próprio Jairo, chefe de sinagoga, homem justo e estimado.

Se, a propósito da notícia emanada do povo, interpelassem a Jairo, um pretexto qualquer lhe teria bastado para tapar a boca aos inquiridores. Mas, nada disso sucedeu. Os sacerdotes e os levitas pouco se preocupavam com o que não lhes dizia respeito pessoalmente e, sobretudo, com os falatórios do povo, aos quais, repetimos, nenhum crédito prestavam. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 152

MATEUS, Cap. IX, v. 27-31

Cegos curados

V. 27. Ao sair Jesus dali, dois cegos o seguiram, clamando: Filho de David, tem piedade de nós! — 28. Quando chegou a casa, os cegos se aproximaram e ele lhes perguntou: Credes que eu possa fazer o que me pedis? Os dois responderam: Sim, Senhor! — 29. Ele então lhes tocou os olhos, dizendo: Faça-se conforme a vossa fé. -30. Os olhos de ambos se abriram e Jesus lhes proibiu terminantemente que falassem do fato, dizendo: Vejam que ninguém o saiba. — 31. Mas os dois se foram e espalharam por todo o país a fama do Mestre.

N. 125. A cura dos cegos se operou como as outras curas materiais já anteriormente obtidas: por ato da vontade do Mestre e por sua ação magnética. Ele fez convergir, sobre os olhos dos cegos e sobre os organismos de ambos, os fluidos apropriados à natureza e à causa da cegueira que os havia atacado.

Se o espírito condenado às trevas humanas, quer nascendo cego, quer cegando mais tarde, só tem que sofrer essa condenação por um certo tempo, ele encontrará, ao longo do seu caminho, a luz de que se acha privado. Tais casos são raros; porém, quanto mais a humanidade se purificar, menos longa e penosa será a expiação humana e mais apto se encontrará o homem para o emprego daqueles meios de cura que o Senhor vos pôs nas mãos e que ainda desconheceis.

O emprego dos fluidos magnéticos pode fazer cessar a cegueira, quaisquer que sejam a sua natureza e a sua causa, assim como a surdez e a mudez, mas somente no caso em que o Espírito tenha que suportar apenas uma prova passageira e a suporte de modo a obter do Senhor a sua cessação. Se murmura, se não OS QUATRO EVANGELHOS (II) 153

a sofre com paciência e resignação, o castigo pode ser prolongado e, neste caso, os meios de destruir o mal são postos fora do alcance do homem.

Não é impossível a este conseguir, acidentalmente, aquele resultado, por ato da sua vontade e pela ação magnética; mas, para isso, se faz mister que uma grande pureza lhe dê tão grande poder, com o auxílio, que então não lhe faltará, dos Espíritos superiores, os quais procedem à escolha e lhe colocam à mão os fluidos apropriados ao resultado que deva obter. É esse um tesouro que vos está reservado e que vos cumpre adquirir, porquanto mãos profanas, isto é, indignas de semelhante favor, só imperfeitamente podem usar dele. Para alcançar a pureza necessária à posse de tão alto poder, para contar com o auxílio e o concurso dos Espíritos superiores, tem o homem que se purificar, que se elevar.

Tais casos são raros, dissemos acima, mas, ficai sabendo, o Espírito que haja sido condenado a sofrer apenas por um certo tempo as trevas humanas achará no seu caminho Espíritos encarnados com a missão de pôr termo a essas provações ou expiações passageiras.

O Senhor tudo prepara e prevê, a fim de que todas as coisas se passem como devem passar-se.

Para chegar, de modo seguro e previsto, a curar a cegueira, a surdez, a mudez e todos os outros males e enfermidades humanas, como as curava Jesus, preciso é que o homem, ao mesmo tempo, se eleve e se ponha em condições de apreciar o valor dos fluidos de que se possa servir, de conhecer e distinguir a natureza, os efeitos e as propriedades de ação dos fluidos vivificantes, fortificantes e reparadores, dos fluidos purificadores e regeneradores, próprios a destruir as causas de doenças e enfermidades, tanto quando essas causas sejam internas, residam num viciamento do organismo, como quando sejam externas. Neste último caso, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 154

os fluidos purificadores e regeneradores destroem e devoram de pronto, com muito mais eficácia e muito melhor do que por meio de uma operação cirúrgica, as substâncias estranhas causadoras do mal. Os fluidos fortificantes e reparadores se destinam a destruir as causas de enfermidades de origem nervosa, ou paralisante.

Toda enfermidade que contribua, de maneira sensível, para modificar a existência ordinária do homem é provação ou expiação.

A cegueira, quer permanente, quer temporária, é imposta, como provação ou expiação, segundo o grau de culpabilidade, àquele que recusou auxílio a seus irmãos, que abusou de suas faculdades, fossem elas quais fossem, e que assim ficou sujeito a sofrer a pena de talião. Terá que viver na dependência dos outros e suportar as privações resultantes da ausência daquelas faculdades, que foram sua força ou seu orgulho em precedente existência.

Quanto à proibição de Jesus aos dois cegos, de falarem da cura que neles acabara de operar, tinha por fim não dar a crer aos homens que se servira de meios humanos próprios a criar uma reputação humana. Aquele que tais coisas fazia, proibindo que as divulgassem, não podia passar, aos olhos de seus irmãos, por ser um charlatão ou um homem comum, ávido de uma reputação com que atraísse os doentes, tendo em vista vantagens mercantis.

Jesus, em certas ocasiões, como que se cercava de mistério, a fim de que a fama das grandes coisas que fazia crescesse, realçada por esse tom misterioso. Procedia sempre de acordo com as circunstâncias e com o meio em que se achava. Os efeitos tirados das leis naturais então conhecidas deviam ter um alcance moral, mas nem todos estavam aptos a recebê-lo nas mesmas condições. Para uns a publicidade era necessária, outros acolhiam mais favoravelmente o que se OS QUATRO EVANGELHOS (II) 155

lhes contava rodeado de uma sombra de mistério. O grande talento do médico está em saber aplicar o medicamento na dose proporcionada à força do doente. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 156

MATEUS, Cap. IX, v. 32-34. — LUCAS, Cap. XI, v. 14-20

Possesso mudo. — Blasfêmia dos fariseus

MATEUS: V. 32. Logo que eles saíram, apresentaram-lhe um homem mudo, possesso do demônio. — 33. Tendo sido este expulso, o mudo falou; e a multidão admirada dizia: Nunca se viu coisa semelhante em Israel. — 34. Mas os Fariseus diziam: Ele expulsa os demônios pelo príncipe dos demônios.

LUCAS: V. 14. Jesus expulsou o demônio de um homem que estava mudo e, logo que expulsou o demônio, o mudo falou e todo o povo se encheu de admiração. — 15. Mas, entre os populares, alguns diziam: É por Belzebu, príncipe dos demônios, que ele expulsa os demônios. — 16. Outros, para o tentarem, lhe pediam um sinal do céu. — 17. Jesus, porém, conhecendo-lhes os pensamentos, disse: Todo reino dividido contra si mesmo será desolado, e casa sobre casa cairá. — 18. Se, pois, Satanás está dividido contra si mesmo, como subsistirá o seu reino? Sim, porquanto dizeis que é por Belzebu que expulso os demônios. — 19. Ora, se é por Belzebu que expulso os demônios, por quem os expulsarão vossos filhos? — Eis porque serão eles mesmos os vossos juízes. — 20. Se, porém, eu expulso os demônios pelo dedo de Deus, é que o reino de Deus veio até vós.

N. 126. Era exercendo uma ação fluídica sobre os órgãos da voz, da palavra, que o mau Espírito, obsessor daquele homem, a quem chamavam possesso do demônio, o tornava mudo, subjugando-o.

Do mesmo modo por que o obsessor do cego lhe paralisa a vista, que o do surdo lhe paralisa o ouvido, cobrindo cada um desses órgãos com uma parte do fluido que o envolve e retirando-lhe assim, momentaneamente, as faculdades, também o do mudo lhe paralisa a voz, privando-o da faculdade de falar. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 157

4 Estas palavras foram mediunicamente ditadas no mês de Fevereiro de 1863.

Jesus ordenou ao Espírito obsessor que abandonasse a vítima e, tendo-se aquele Espírito no mesmo instante afastado, cessou a ação fluídica que produzia a mudez e o mudo falou.

A subjugação a que se achava sujeito o homem e a sua conseqüente mudez eram para ele uma provação e uma expiação.

Quando observardes uma punição, procurai do outro lado o abuso a cuja reparação e expiação ela se destina. O mudo, constrangido a guardar silêncio, quando as palavras e a necessidade de se exprimir lhe fervilhavam no íntimo, expiava um abuso de eloqüência; orador de talento, contribuíra para arrastar os povos a profundos erros. Expiava.

A provação e a expiação da mudez lhe foram impostas por limitado tempo. Sofrera o castigo sem murmurar, paciente e resignado. Jesus o libertou.

A acusação dos fariseus e dos sacerdotes era análoga à de que sois objeto hoje vós outros espíritas.

Não se vos acusa de estardes em relação com os Espíritos infernais?

Não é ao "demônio" que ainda hoje acusam de vos pregar o amor a Deus, a renunciação às coisas da terra quando sejam instrumento e meio de satisfação do orgulho, do egoísmo, da avareza, da intemperança, da sensualidade, da luxúria, dos vícios e paixões más? Não é ao "demônio" que ainda acusam de vos pregar a caridade sem limites para com vossos irmãos, o horror a tudo o que vos possa conduzir ao mal, o perdão, sem restrições, das injúrias e ofensas, qualquer que seja a gravidade delas4?

Assim sendo, fácil se vos torna perceber as con- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 158

seqüências que podeis tirar da acusação feita ao Justo.

Caminhai nas suas pegadas, firmando-vos na sua resposta, que é completa.

"Se expulso os demônios por Belzebu, por quem os expulsarão vossos filhos? — Eis porque serão eles mesmos os vossos juízes."

Por estas palavras, Jesus aludia aos que, seguindo-lhe os passos, procuravam purificar-se e elevar-se, expulsavam os "demônios" pelo jejum e pela prece.

Os verdadeiros espíritas são esses filhos dos homens, que se purificam e se elevam acima de seus pais, que se tornam seus juízes naturais e expulsam ainda os "demônios" pelo jejum (moral) e pela prece. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 159

MATEUS, Cap. IX, v. 35-38

Ovelhas sem pastor. — Seara. — Trabalhadores

V. 35. Jesus percorria as cidades e as aldeias, ensinando nas sinagogas, pregando o evangelho do reino, curando todos os males e todas as enfermidades. — 36. E, vendo todas aquelas gentes, teve piedade delas, pois estavam maltratadas e jaziam por ali como ovelhas que não têm pastor. — 37. Disse então aos discípulos: A seara é verdadeiramente grande, mas poucos os trabalhadores. — 38. Rogai, pois, ao dono da seara que mande trabalhadores para ela.

N. 127. Os homens, entregues a si mesmos, precisavam ser grupados sob uma lei a que pudessem obedecer, porquanto a lei de Moisés, excetuados o Decálogo e os preceitos do amor a Deus e ao próximo, se lhes tornara, no tocante às prescrições materiais, ao seu ponto de vista humano e sobretudo às tradições que os levaram a colocar a lei de Deus debaixo do alqueire, um jugo que repeliam, como fazeis hoje com o que, na lei da Igreja, excetuada a lei de Jesus, é obra humana — os mandamentos humanos, as interpretações humanas, que, fazendo aditamentos àquela lei simples e sublime, a alteraram, lhe falsearam o sentido e a aplicação.

A multidão era grande. Dispondo de limitado tempo para estar entre os homens, Jesus concitava seus discípulos a reunirem a volta de si todos os de boa vontade que pudessem pregar a moral pura que ele ensinava. Pastor vigilante, tinha necessidade de outros pastores que fossem por toda parte arrebanhar suas ovelhas.

Não nos cansaremos de repetir: tudo tem sua razão de ser. Tanto da parte dos incumbidos de continuar a obra de Moisés, como da parte da igreja encarregada de continuar a obra de Jesus, tudo o que OS QUATRO EVANGELHOS (II) 160

ocorreu tinha que ocorrer, de acordo com os tempos e as inteligências, sob a ação e por entre as lutas da razão humana e do livre arbítrio do homem a se debaterem nas mãos possantes do progresso. Tudo tem sua razão de ser, conformemente às épocas e a cada fase da vida da humanidade, que vai recebendo progressiva e sucessivamente, em cada era, nos tempos predeterminados pelo Senhor e mediante uma nova revelação, o desenvolvimento e o progresso adequados ao estado das inteligências. Hoje, passou o tempo do reinado da letra, que agora mata. Soou a hora do advento do espírito, que vivifica.

Nos vossos dias em que se abre uma nova era, vendo Jesus, como ao tempo da sua missão terrena, todos os povos carregados de males e dispersos como ovelhas sem pastor, deles se apiedou e nós vimos, em seu nome e de ordem do Senhor, repetir-vos estas palavras que ele dirigiu a seus discípulos: "A seara é verdadeiramente grande, mas há poucos trabalhadores; rogai ao dono da seara que mande trabalhadores para ela".

Reuni em torno de vós todos os homens de boa vontade que possam pregar a moral que Jesus ensinava.

Pastor vigilante, ele ainda necessita de outros pastores que vão por todos os pontos da terra arrebanhar suas ovelhas.

Trabalhadores novos e fiéis, verdadeiros espíritas, novos discípulos do Mestre, ide, guiados pelos Espíritos do Senhor, que se comunicam com os homens trazendo-lhes a nova revelação, que não vêm destruir a lei mas completá-la por meio dessa revelação, ide e ensinai às nações. Explicai-lhes, em espírito e em verdade, a lei do Mestre, explicai-lhes essa mesma revelação, os ensinos daqueles Espíritos, virtudes dos céus que de lá se abalaram; exortai vossos irmãos, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 161

pelo espírito e pela palavra, na ordem material, moral e intelectual, à prática da virtude e do dever, do trabalho, do amor e da caridade e, desse modo, à prática da fraternidade humana. Reconduzi ao aprisco ás ovelhas desgarradas, que erram pelas charnecas áridas do erro e da mentira, presas da intolerância, do fanatismo, da superstição, do despotismo religioso, ou da incredulidade, do materialismo e, graças a essas influências deletérias, presas também do orgulho, do egoísmo, da avareza, da cupidez, da inveja, do ciúme, da sensualidade, da intemperança, da luxúria; numa palavra — dos vícios e más paixões que degradam a humanidade. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 162

5 Nota da Editora — Na Vulgata assim está escrito, no Evangelho de Marcos:

Vers. 14 — "...enviados a pregar, e deu-lhes o poder de curarem enfermidades e expulsarem demônios."

MATEUS, Cap. X, v. 2-4. —MARCOS, Cap. III, v. 13-14, 16-19. —LUCAS, Cap. VI, v. 12-16

Nomes dos apóstolos. — Suas vocações

MATEUS: V. 2. Estes são os nomes dos doze apóstolos: o primeiro, Simão, que é chamado Pedro, e André, seu irmão; — 3. Tiago, filho de Zebedeu, e João, seu irmão; Filipe e Bartolomeu; Tomé e Mateus, o Publicano; Tiago, filho de Alfeu, e Tadeu; — 4, Simão Cananeu e Judas lscariotes, o que o traiu.

MARCOS: V. 13. Subindo a um monte, chamou Jesus a si os que quis e esses acudiram ao chamado. — 14. Designou doze .para estarem com ele e para serem enviados a pregar5. — 16. A saber: Simão a quem deu o nome de Pedro. — 17. Tiago, filho de Zebedeu, e João, irmão de Tiago, aos quais chamou Boanerges, que significa — filhos do trovão. — 18. André, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, Tiago filho de Alfeu, Tadeu, Simão Cananeu, — 19, e Judas lscariotes, que o traiu.

LUCAS: V. 12. A esse tempo, tendo Jesus subido a um monte para orar, lá passou toda a noite orando a Deus. — 13. Quando amanheceu, chamou os discípulos, escolheu, dentre eles, doze, chamando-lhes apóstolos: — 14. Simão, a quem cognominou de Pedro, e André seu irmão, Tiago e João, Filipe e Bartolomeu; — 15, Mateus e Tomé, Tiago, filho de Alfeu, e Simão chamado o Zeloso. — 16. Judas, irmão de Tiago, e Judas lscariotes, que foi o traidor.

N. 128. Jesus, para os homens, subira a um monte a fim de orar e aí passara a noite orando a Deus. Na realidade, porém, voltou, como já vos temos explicado, às regiões superiores de onde preside às coisas do vosso globo e distribui as ordens do soberano Mestre e lá permaneceu enquanto esteve fora das vistas humanas.

Quando amanheceu, tornando-se novamente OS QUATRO EVANGELHOS (II) 163

visível e tangível, chamou os discípulos e procedeu, entre eles, à escolha dos doze apóstolos.

Quanto aos apelidos que lhes deu, tinham por fundamento o caráter e a missão de cada um dos apelidados.

Entre os doze estava Judas Iscariotes que traiu a Jesus. Conforme vereis pelas explicações que mais tarde vos daremos, Judas Iscariotes era um Espírito elevado em inteligência; mas, pedindo permissão para auxiliar a Jesus, se encarregara de uma missão acima de suas forças, tomara um peso superior ao que lhe era possível suportar e faliu. Quando chegar o momento, dir-vos-emos como foi essa missão pedida por ele, como lhe foi concedida e como foi levado a falir. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 164

LUCAS, Cap. VI, v. 17-19

Descida do monte. — Curas

V. 17. Jesus em seguida desceu com eles do monte e se deteve numa planície, cercado dos discípulos e de grande multidão de gente de toda a Judéia, de Jerusalém e das regiões marítimas de Tiro e de Sídon. — 18, gente que viera para ouvi-lo e para ser curada de suas enfermidades. Eram também curados os que se achavam possessos de Espíritos imundos. — 19. Todos procuravam tocá-lo, porque dele saía uma virtude que a todos curava.

N. 129. Relativamente à cura das enfermidades e ao afastamento dos Espíritos obsessores, já recebestes todas as explicações (n. 74). Não temos que voltar a esse assunto.

Compreendeis o que era a virtude que saía de Jesus. Eram os fluidos que, por ato de sua vontade e do seu poder magnético, ele dirigia sobre os doentes e notadamente sobre os que dele se aproximavam. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 165

MATEUS, X, v. 1 e 5-15. — MARCOS, III, v. 15 e VI, v. 7-13. — LUCAS, IX, v. I-6

A missão, o poder, a pobreza, a pregação dos apóstolos. — Instruções que lhes foram dadas

MATEUS: V. 1. Tendo reunido os doze apóstolos, Jesus lhes deu poder sobre os Espíritos impuros, a fim de que os expulsassem, e o de curar todas as doenças e enfermidades. — 5. E enviou esses doze, depois de lhes haver dado as instruções seguintes: Não procureis os Gentios e não entreis nas cidades dos Samaritanos: — 6, ide antes em busca das ovelhas perdidas da casa de Israel; — 7, ide e pregai, dizendo: O reino dos céus está próximo; — 8, curai os doentes, ressuscitai os mortos, limpai os leprosos, expulsai os demônios; dai de graça o que de graça recebestes. — 9. Não tenhais ouro, nem prata, nem qualquer moeda nos vossos cintos, — 10, nem saco para a viagem, nem duas túnicas, nem sandálias, nem bordão; porquanto, o obreiro merece que o sustentem. — 11. Ao entrardes em qualquer cidade ou aldeia, perguntai onde há um justo e em sua casa permanecei até que partais de novo. — 12. Ao penetrardes na casa, saudai-a, dizendo: Que a paz esteja nesta casa. — 13. Se a casa for digna disso, vossa paz descerá sobre ela; e, se o não for, a vossa paz voltará para vós. — 14. Quando alguém não vos quiser receber e não vos escutar as palavras, ao sairdes da casa ou da cidade onde tal se deu, sacudi a poeira dos vossos pés. — 15. Em verdade vos digo: No dia do juízo, menos rigor haverá para com a terra de Sodoma e de Gomorra do que para com essa cidade.

MARCOS: V. 15. E lhes deu o poder de curar as enfermidades e de expulsar os demônios.

VI: V. 7. Jesus chamou os doze e começou a enviá-los dois a dois, dando-lhes poder sobre os Espíritos impuros. — 8. Recomendou-lhes que levassem consigo apenas o bordão; que não levassem nem saco, nem pão, nem dinheiro nos cintos. — 9, que calçassem unicamente suas sandálias, mas não cuidassem de ter duas túnicas. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 166

— 10. E lhes dizia: Na casa em que entrardes, permanecei até que partais de novo. — 11. Quando encontrardes pessoas que não vos queiram receber nem escutar, sacudi, ao vos retirardes, a poeira dos vossos pés, dando assim testemunho contra elas. — 12. Tendo partido, os apóstolos pregavam aos povos que fizessem penitência; — 13, expulsavam muitos demônios e ungiam com óleo muitos doentes, curando-os.

LUCAS: V. 1. Jesus, tendo reunido os doze apóstolos, lhes deu poder e autoridade sobre todos os demônios e o poder de curar as enfermidades. — 2. E mandou que fossem pregar o reino de Deus e curar os enfermos. — 3. Disse-lhes: não leveis em viagem nem bordão, nem saco, nem pão, nem dinheiro e não tenhais duas túnicas. — 4. Na casa em que entrardes ficai e dela não saiais; — 5, e, quando encontrardes pessoas que não vos queiram receber, sacudi, ao deixar-lhes a cidade, até a poeira dos vossos pés, a fim de que isso constitua um testemunho contra elas. — 6. Os apóstolos partiram e foram de aldeia em aldeia, evangelizando e curando por toda parte os enfermos.

N. 130. Jesus mandou que os apóstolos pregassem primeiramente aos da sua nação "humana", para que mais se apertassem os laços da família, da fraternidade, da pátria. Proibiu-lhes se munissem do que quer que fosse, a fim de bem compreenderem que, missionários do Senhor, deviam tudo confiar dele no tocante às coisas da vida e nenhuma importância ligar ao bem-estar material. Recomendou-lhes que abençoassem os lugares onde encontrassem boa acolhida e que sacudissem a poeira dos pés onde os repelissem, a fim de bem os persuadir de que por toda parte os acompanhava o Mestre, ligando o que eles ligassem e desligando o que desligassem.

Jesus atuava humanamente sobre a imaginação humana de seus discípulos, quando, pronunciando palavras positivas, se dirigia àqueles a quem falava. Ao mesmo tempo, aludia figuradamente à missão de OS QUATRO EVANGELHOS (II) 167

todos os que, como os apóstolos, seriam encarregados de levar de porta em porta a palavra do Senhor. Dizemos figuradamente, porque ele se dirigia também às gerações futuras, que viriam a pôr-se nas condições necessárias à execução dessa obra. Se o preferis, podemos usar do termo profeticamente, se bem que aquela promessa devera cumprir-se em todos os séculos; porquanto, se é certo que tem havido pastores infiéis, não menos certo é que sempre houve também guardas severos de seus rebanhos, praticantes da moral que pregavam de coração e não com os lábios unicamente. Esses se punham em condições de ligar e desligar na terra como no céu.

Os discípulos tinham que espalhar a verdade, como hoje vós outros espíritas tendes que a disseminar. Ponde-vos, pois, a caminho, e segui os discípulos do Cristo, que vos preparam as estradas. Entrai nelas resolutamente.

N. 131. Em face do que acabais de dizer: que "Jesus atuava humanamente sobre a imaginação humana de seus discípulos e figuradamente aludia à missão de todos os que seriam encarregados de levar de porta em porta a palavra do Senhor" — quais o sentido e o alcance destas palavras, referentes aos discípulos: "a fim de bem os persuadir de que por toda parte os acompanhava o Mestre, ligando o que eles ligassem e desligando o que desligassem; e destas outras referentes a todos os que, cumprida a missão terrena de Jesus, praticavam a moral que 'pregavam: "Esses se punham em condições de ligar e desligar na terra, como no céu."?

Os verdadeiros sucessores dos discípulos de Jesus podiam alcançar os mesmos privilégios, com a condição de adquirirem e terem a mesma pureza. Assim é que aqueles dentre vós que, verdadeiros espíritas, tentarem, com todas as suas forças, elevar-se ao Senhor, podem ligar e desligar na terra, certos de que ligaram OS QUATRO EVANGELHOS (II) 168

6 Arrogando-se o poder de absolver ou de condenar, concedendo ou recusando a absolvição, de perdoar ou não os pecados, não como simples declaração, mas como sentença proferida em julgamento.

7 Pela venda das indulgências.

e desligaram igualmente no céu. Mas, a acepção verdadeira, na qual a vossa humildade deve entender essa faculdade, é a seguinte: o homem não pode traçar a linha de conduta que o Senhor haja de seguir, nem, por conseguinte, lhe ditar suas maneiras de ver. O Espírito encarnado, porém, tendo atingido um certo grau de elevação, pode e deve compreender, de antemão, as vontades do supremo Juiz. Eis porque, pelos atos humanos, o mesmo Espírito se encontra em estado de sentir, dentro de si, a sentença que será proferida e, pela sinceridade do arrependimento, a indulgência com que o juiz sentenciará. Tal o sentido em que deveis compreender aquelas palavras, que o orgulho humano falseou, fazendo-as exprimir um ato arbitrário6, um tráfico vergonhoso7, e não uma faculdade altíssima de cujo uso os que de tais palavras abusaram sentiam bem e sentem hoje mais do que nunca ser incapazes.

Servindo-nos dos termos — ligar e desligar, empregamos as expressões que as escrituras adotam e que explicaremos de modo especial, quando chegar a ocasião.

Os discípulos fiéis de Jesus eram Espíritos elevados, que se não deixavam dominar pelo sentimento da animosidade pessoal, que, com segurança, julgavam do Espírito e não do homem, visto que se achavam em condições de apreciar, pela inspiração que recebiam sob a influência e ação espíritas, o valor daqueles a quem se dirigiam. Se, portanto, encontravam Espíritos humildes e retos, eles os abençoavam, exortando-os a seguirem a trilha que lhes mostravam. E Jesus lhes aprovava o proceder. Se, ao con- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 169

trário, topavam com Espíritos atrasados, cujas provas longe estavam de chegar a seu termo, rebeldes ao que lhes eles pregavam, sacudiam contra esses a poeira que traziam nos pés, isto é, se afastavam, porquanto os Espíritos de ordem superior não se juntam aos Espíritos culpados, endurecidos. E sobre estes deixava o Senhor cair o peso da expiação, por mais dolorosa que houvesse de ser.

Eis aqui os frutos do erro da igreja: apoiando-se nas palavras que Jesus dirigia a Espíritos encarnados, mas em missão, ela acreditou poder apossar-se da herança de infalibilidade que, naqueles Espíritos, o Espírito Santo viera selar, isto é, da infalibilidade que, por ordem do Senhor, lhes vinha da assistência, da inspiração, da proteção, do amparo e do concurso dos Espíritos superiores, esquecendo-se, entretanto, de chamar a si a herança de santidade, de virtudes e de elevação moral por eles deixada. Pretendeu ela, portanto, fazer uso de armas que era incapaz de manejar; ter em suas mãos, baldas da pureza das dos apóstolos e muitas vezes manchadas, a chave da morada de toda a pureza. Assim que, repeliu os eleitos e acolheu os repelidos. Voluntariamente cega, mergulhou cada vez mais nas trevas que o orgulho e a confiança em si mesmo geram. A igreja, porém, despertará; o sonho em que ainda se compraz, dissipar-se-á ao clarão da nova aurora.

A trombeta do juízo final vai retumbar para ela nos quatro cantos do mundo. Os anjos do Senhor aparecerão em sua glória, não do modo por que ela o diz nas suas errôneas interpretações, mas na glória da pureza; e os discípulos de Jesus, reencarnando outra vez para acabarem a obra que começaram, virão ainda ligar e desligar na terra e o Senhor ligará e desligará no céu, pois que tal será deles a missão. E o julgamento não se achará inquinado de nulidade. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 170

Coragem, filhos da nossa igreja, da Igreja do Senhor, aproximam-se os tempos em que os discípulos e o Mestre aparecerão de novo entre vós, em que vossos olhos desvendados verão o Justo nas nuvens do céu, em que os anjos, isto é, os Espíritos purificados, descerão à Terra para mais eficazmente vos estenderem seus braços fraternais.

Entoai cantos de alegria, rejubilai, rejubilai — os tempos se aproximam.

MATEUS, MARCOS, LUCAS e JOÃO, Assistidos pelos Apóstolos.

N. 132. Quais o sentido, o objeto e o fim destas palavras de Jesus aos apóstolos: "Não procureis os Gentios e não entreis nas cidades dos Samaritanos; ide antes em busca das ovelhas perdidas da casa de Israel"?

Queria antes de tudo ensinar o apoio aos parentes, apertar, já o dissemos, aos olhos dos homens, os laços da família, da fraternidade, da pátria. Queria igualmente evitar se alvorotassem desde logo os preconceitos dos Judeus, que se julgavam os únicos aptos a receber os benefícios do Senhor. Estes bradariam — sacrilégio, se vissem os discípulos de Jesus falar de arrependimento e pregar o amor de Deus aos que eles, os Judeus, consideravam excluídos, pelo pai de todos os homens, da parte da herança que lhes devia tocar.

A pregação aos Gentios se faria mais tarde, a tempo e à hora.

Os Samaritanos, como sabeis, formavam uma seita dissidente do hebraísmo. Gentios eram todos os que não professavam a fé dos Judeus.

E os destas outras palavras: "Ide e pregai, dizendo: "O reino de Deus está próximo"!

O reino de Deus está próximo todas as vezes que o OS QUATRO EVANGELHOS (II) 171

homem aceita os meios de chegar a esse reino. O Cristo ensinava aos homens as virtudes humanas que lhes abreviariam a série das provações terrenas. O reino dos céus estava próximo para os que lhe seguiam os ensinamentos.

Ainda hoje, hoje mais do que então, o Cristo, por nosso intermédio, diz aos verdadeiros espíritas: O reino dos céus está próximo, pois que não mais se vos indicam caminhos indiretos para lá chegar; pois que não mais podeis extraviar-vos tomando uma direção falsa. Servindo-se dos Espíritos do Senhor, que vos trazem a nova revelação, ele vos mostra a estrada reta e contínua por onde cumpre enveredeis. Ele vos assinala previamente, apontando-os com o dedo, mediante essa revelação, os obstáculos que vos detiveram os passos até agora, e diz: Evitai-os; eu vos estendo as mãos para vos ajudar a transpô-los. Mostra-vos os sítios de repouso onde podereis readquirir as forças prestes a vos abandonarem: a prece, o amor e a fé praticados sinceramente e não com os lábios apenas. Mostra-vos a fé a vos clarear o caminho com o seu facho divino, caído o véu que por tanto tempo vos impedira de ver essa claridade benfazeja, que restitui aos cegos a vista. Mostra-vos a esperança estendendo-vos a mão e vos conduzindo, filhos dóceis e submissos, ao lugar onde descansareis. Mostra-vos, enfim, o amor, o amor poderoso e vivificante do vosso Deus, abrindo-vos as portas do santuário, pensando-vos as chagas, curando-vos as feridas; o amor do vosso Deus que, no limiar da morada celeste, vos diz: Vinde todos vós que chamei dos quatro cantos do mundo; vinde aqui gozar do repouso e da frescura.

Não vos equivoqueis quanto ao sentido destas palavras figuradas que acabamos de vos dirigir e que a vossa inteligência humana pode facilmente compreender. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 172

O lugar onde descansareis é o espaço infinito, onde os Espíritos bem-aventurados gozam, numa eterna atividade, da alegria dos eleitos, que todos os homens são chamados a gozar e da qual todos gozarão.

O repouso e a frescura exprimem a calma de que desfruta o Espírito que chegou ao termo de suas provações, mediante a comparação com um viajante extenuado que alcançou o lugar onde repousará, fruindo a calma e a frescura após a fadiga e os ardores do Sol. Mas, vós o sabeis, tanto para o Espírito que chegou ao termo de suas provas, como para o que percorre o caminho delas, o trabalho, e não o repouso numa inação e numa contemplação eternas, constitui a eterna lei, dentro da imensidade, na condição de obreiro e servo do pai que trabalha sempre, que criou, cria e criará por toda a eternidade. Todavia, para o Espírito que chegou ao fim de suas provações, o trabalho não é o que é para vós. Ele encontra no trabalho uma alegria, uma felicidade imensa, complemento da que lhe está prometida. O trabalho, para nós, é mil vezes mais suave do que, para vós, o repouso indolente da vossa existência.

N. 133. Qual, despojado da letra o espírito, em espírito e em verdade, a significação do v. 1 de Mateus: "Ele deu aos doze discípulos poder sobre os Espíritos impuros, a fim de que os expulsassem e o de curar todos os males e enfermidades"; — do V. 15 de Marcos: "E lhes deu o poder de curar as doenças e de expulsar os demônios"; — do v. 1 de Lucas: "Jesus, tendo reunido seus doze apóstolos, lhes deu poder e autoridade sobre todos os demônios e o poder de curar as enfermidades"? — Qual a destas palavras de Jesus (v. 8 de Mateus): "Restituí a saúde aos doentes, ressuscitai os mortos, limpai os leprosos, expulsai os demônios"?

Os discípulos de Jesus, como já dissemos, eram Espíritos elevados, encarnados em missão, que aceitaram as condições rigorosas da primeira fase de OS QUATRO EVANGELHOS (II) 173

suas existências humanas, da fase que lhes precedeu à vocação, a fim de concorrerem para a obra de redenção. Em seus trabalhos tiveram o auxílio dos Espíritos superiores que os acompanharam sempre, neutralizando neles a influência da carne sobre o Espírito, adicionando-lhes às faculdades as de que dispunham. Desse concurso resultaram as grandes coisas que os apóstolos realizaram.

Eles aceitaram aquela existência humana, cuja primeira parte devia transcorrer em condições tão humildes quanto vulgares, a fim de melhor fazerem sentir a transformação do portageiro, do pescador ignorante em homem inspirado, manejador de todos os idiomas e capaz de operar milagres à vista das nações espantadas.

Assim, Jesus deu aos apóstolos poder e autoridade sobre todos os maus Espíritos, o poder de curar todos os males e enfermidades, de restituir a saúde aos doentes, de ressuscitar os mortos, de purificar os leprosos, de expulsar os Espíritos maus, chamados ao mesmo tempo "demônios" e "Espíritos impuros" — dando-lhes a assistência, o apoio e o concurso dos Espíritos superiores, sustentados estes pelos Espíritos puros, que tinham poder imediato sobre todos os maus Espíritos, bem como o de curar todas as enfermidades, ressuscitar os mortos segundo o entender dos homens.

Os apóstolos eram médiuns, quer dizer: intermediários entre os Espíritos superiores que os assistiam e os homens. Com o auxílio das faculdades mediúnicas, sob a ação e a influência medianímicas, é que eles obraram e falaram, a fim de concorrerem para a obra de redenção.

Para expulsarem os maus Espíritos, isto é, para libertarem os homens da subjugação, tanto corporal, como corporal e moral, ordenavam aos obsessores que se afastassem da vítima, empregando as mesmas OS QUATRO EVANGELHOS (II) 174

palavras de que usava Jesus: "Sai desse homem". E os obsessores se afastavam no mesmo instante por ato da vontade dos Espíritos superiores, sustentada, se necessário, pela dos Espíritos puros.

Para restituir a saúde aos doentes, limpar os leprosos, curar todos os males e enfermidades, impunham as mãos ou ungiam com óleo os enfermos, obrando por ato da própria vontade e pela ação magnética humana. Ao mesmo tempo, os Espíritos superiores, associando sua vontade à deles por meio do magnetismo espiritual, escolhiam e lhes punham ao alcance os fluidos apropriados aos efeitos, aos resultados que tinham de ser obtidos, à cura que se havia de operar.

Ungiam com óleo muitos doentes apenas para tornar a ação que exerciam mais compreensível aos homens. Nenhuma necessidade tinham, para obterem a cura, de recorrer a esses meios materiais, externos, porquanto a mão do magnetizador humano, ou a vontade do Justo teriam enviado, sem isso, ao organismo os fluidos de que se achavam carregados os óleos empregados. Aplicando o das oliveiras, usavam dos meios postos a seu alcance, a fim de mostrarem que tudo pode servir para a execução dos desígnios de Deus, quando se tem a fé.

Quanto a estas palavras de Jesus aos apóstolos: "Ressuscitai os mortos", tratai de as compreender em espírito e em verdade.

As leis naturais, que Deus estabeleceu desde toda a eternidade, são imutáveis, já o temos dito, e a vontade também imutável de Deus não as derroga nunca, nem jamais força o Espírito a se unir à podridão, a um cadáver.

Jesus precisava, a bem do êxito de sua missão terrena, para que ela produzisse os devidos frutos naquele momento e no futuro, impressionar fortemente a imaginação dos homens materiais e atrasados da época, apropriando, ao mesmo tempo, a lin- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 175

guagem de que se servia a seus preconceitos e crenças. Precisava preparar as gerações que teriam de receber, nos tempos determinados pelo Senhor e quando o indispensável progresso estivesse realizado, a nova revelação que fora predita e que hoje vos é trazida pelos Espíritos, órgãos do Espírito da verdade.

Quando Jesus dizia aos apóstolos: "Ide... e ressuscitai os mortos", empregava palavras humanas, conhecidas e compreendidas. Nenhum termo havia com que se exprimisse o estado cataléptico e a volta do Espírito ao corpo a que se achava ligado e preso pelo laço fluídico do perispírito.

O estado cataléptico, reconhecido mais tarde, era quase ignorado dos antigos que, solícitos em afastar de si os focos de infecção, queimavam seus "mortos", ou os encerravam em túmulos, logo que se apresentavam sinais indicadores, para eles, da cessação da vida. Quantas expiações pelo fogo ou pela fome se verificaram assim naquelas épocas em que a ignorância dos homens servia para que muitos pagassem crimes cometidos em anteriores existências!

Vimos de dizer que os antigos quase ignoravam o estado cataléptico, porque apenas alguns homens mais adiantados tinham dele noção. Esta era, porém, vaga, porquanto não a compreendiam, nem científica, nem espiriticamente.

Os apóstolos, os discípulos, a multidão que se premia em torno de Jesus, a turba dos escribas, dos fariseus e dos sacerdotes o desconheciam completamente.

Os evangelistas, médiuns historiadores inspirados, reproduziram, debaixo da influência e da inspiração mediúnicas, tal qual Jesus as pronunciara, estas palavras: "Ide... e ressuscitai os mortos". Empregaram as expressões de que dispunham para relatar os fatos, mas sem possuírem o segredo do pen- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 176

samento que Jesus ocultara sob aquelas palavras, as quais, para eles como para os outros homens, ficavam sujeitas às interpretações humanas.

Já o dissemos e explicamos: todas as ressurreições de pessoas consideradas mortas pelos homens, de que falam tanto o Antigo Testamento como a Boa-Nova, não foram mais do que a cessação do estado cataléptico. Todos os indivíduos tidos por mortos se achavam nesse estado, não se havendo produzido neles o rompimento do laço que prende o Espírito ao corpo.

Considerados por todos como mortos, mortos teriam eles ficado realmente, se não fora o socorro dos Espíritos puros, dos Espíritos superiores que, com a sua vontade poderosa e com o seu poder magnético, assistiam — tanto aos profetas que, inconscientes dessa assistência e desse concurso, atribuíram, do mesmo modo que os outros homens, a ressurreição do morto a uma ação direta do próprio Deus — como aos apóstolos que, inconscientes também dessa assistência e desse concurso, atribuíam, do mesmo modo que os outros homens, a ressurreição a uma ação direta do próprio Mestre.

Quer com relação aos profetas, quer com relação aos apóstolos, os Espíritos puros, os Espíritos superiores obravam sob a direção de Jesus, pois, como sabeis e nunca deveis perder de vista, Jesus é o protetor e o governador do vosso planeta, é quem presidiu à sua formação e quem desde então o dirige, como também o é da humanidade terrena, que será por ele conduzida à perfeição.

N. 134. Qual o sentido destas palavras de Jesus: "Dai de graça o que de graça recebestes"?

No pensamento de Jesus, essas palavras eram ditas para aquele momento, mas também para o futuro.

A mediunidade, as faculdades mediúnicas que os apóstolos possuíam, a assistência e o concurso dos Es- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 177

píritos puros e dos Espíritos superiores eram, ao mesmo tempo e concomitantemente, os meios pelos quais, no desempenho de suas missões, eles espalhavam a Boa-Nova, pregavam o reino de Deus, curavam as moléstias e enfermidades, ressuscitavam os que os homens consideravam mortos, expulsavam os maus Espíritos. E essa mediunidade, essas faculdades mediúnicas, essa assistência e esse concurso eram um dom gratuito de Deus.

Dizendo aos apóstolos: "Dai de graça o que de graça recebestes", Jesus lhes ensinava que as coisas de Deus jamais devem constituir objeto de tráfico, de especulação, de meio de existência material humana; que, no desempenho das missões de que se achavam investidos, suas palavras e seus atos não deviam ter por móvel senão o amor a Deus, o amor ao próximo, a humildade e o mais absoluto desinteresse.

Aquelas palavras também eram dirigidas aos que, médiuns, investidos de faculdades mediúnicas, seriam chamados a servir de intérpretes aos bons Espíritos, de seus intermediários junto dos homens; a todos os que, apóstolos da nova revelação, inspirados pelos Espíritos do Senhor, seriam chamados a pregar a lei de Jesus, explicada em espírito e verdade e desenvolvida por essa mesma revelação.

O Cristo, por nosso intermédio, diz a vós outros espíritas, médiuns, como disse aos apóstolos: "Dai de graça, seguindo-lhes as pegadas, o que de graça haveis recebido", porquanto, para vós como para eles, tudo vem de Deus e vos é dado de graça, a fim de desempenhardes a vossa tarefa.

N. 135. Em face dos termos dos v. 9 e 10 de Mateus, 8 e 9 de Marcos, 3 de Lucas, quais foram, na realidade, as palavras ditas por Jesus?

"Não tenhais e não leveis convosco nem saco, nem pão, nem ouro, nem prata, nem moeda nos vossos cin- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 178

tos; não tenhais duas túnicas; tomai um bordão para vos apoiardes durante a viagem e colocai aos pés sandálias para suportardes a caminhada".

N. 136. Quais o sentido e o alcance dessas palavras de Jesus?

Por esse mandamento dado aos apóstolos, o Cristo ensinava a homens materiais o desprezo dos bens terrenos e a confiança na bondade do Senhor.

Para os homens dos vossos dias, para vós, espíritas, consideradas aquelas palavras como ditas por Jesus tendo em vista o futuro, o ensino é este: "Não ligueis vossa vida às coisas sem duração, mas às que não perecem; não cuideis antecipadamente de vos proverdes de erudição e de ciência perecíveis e sim de vos instruirdes no que conduz à vida eterna". Não quer isto dizer que vos concitamos a desprezar os estudos e os cuidados que a vossa existência humana reclama. Esta tem exigências a que deveis submeter-vos, é uma obrigação a cumprir; mas, não deveis torná-las o objetivo único da vossa vida. Armazenai, portanto, o pão que sustenta o corpo, tanto para vós como para os vossos irmãos que não tiverem podido fazer o mesmo; porém, armazenai sobretudo o pão da vida. Adquiri a instrução necessária ao desenvolvimento da vossa inteligência; mas, adquiri principal-mente a instrução preciosa que vos elevará o Espírito.

N. 137. Como devem ser entendidas estas palavras de Jesus: "Ao entrardes em qualquer cidade ou aldeia, perguntai onde há um justo e em sua casa permanecei até que partais de novo e, ao penetrardes na casa, saudai-a, dizendo: Que a paz esteja nesta casa; se a casa for digna disso, vossa paz descerá sobre ela; se o não for, vossa paz voltará para vós"? OS QUATRO EVANGELHOS (II) 179

Entrando na casa do justo, os discípulos de Jesus pediam as bênçãos do Senhor e, por conseguinte, a proteção dos bons Espíritos para aquele que os acolhera. Se, no entanto, falsa era a apreciação humana, se o homem considerado justo por seus irmãos era velhaco e mentiroso, se era hipócrita, como o homem pode iludir os outros homens, porém não engana a Deus, as bençãos, em vez de descerem sobre ele, caíam sobre o que delas se mostrava digno, afastavam-se do coração viciado e, com solicitude, acompanhavam o coração puro.

O justo é aquele que se esforça por trilhar os caminhos do Senhor e por não sair deles; é o que pratica, em toda a extensão, as virtudes impostas aos homens como condição para chegarem a Deus; é o que pratica a verdadeira caridade; o que se oculta, vela seus atos e palavras, se faz humilde ante os homens e procura mesmo fazer-se humilde no segredo do coração; porquanto, se sois caridosos, mas confiais em que praticastes um ato meritório de que outros não seriam capazes, bem insignificante é o vosso mérito. O justo é aquele que faz o bem sem egoísmo, sem idéia preconcebida, sem esperar o reconhecimento dos beneficiados ou o louvor dos indiferentes e, ainda mais, sem contar com a recompensa que possa obter do Mestre. O justo é aquele que tem fé, forte e tenaz, que não pode ser abalada, que a tudo resiste, fé bondosa para com todos, que não se impõe pela força, que se insinua pouco a pouco pelo exemplo e pela prática das boas obras, fé que pode levar os outros homens a dizerem dele: "Porque não tenho a sua fé?" — "Ali está um justo aos olhos de Deus".

N. 138. Quais são, despojado da letra o espírito, em espírito e em verdade, o sentido e o alcance destas palavras de Jesus: "Quando encontrardes pessoas que não vos queiram receber nem escutar, sacudi, ao vos retirardes, a poeira dos vossos pés, a fim de OS QUATRO EVANGELHOS (II) 180

que isso constitua um testemunho contra elas; em verdade vos digo: No dia do juízo, menos rigor haverá para com a terra de Sodoma e de Gomorra do que para com essa cidade"?

Essas palavras, segundo o pensamento de Jesus, eram ditas para aquela época e para os tempos vindouros. Dirigiam-se não só aos discípulos de então, como também aos que viriam a ser discípulos na era nova.

Aqueles, a quem o Senhor envia a luz e que recusam aceitá-la, mais culpados são do que os que, imersos nas trevas, nenhum socorro direto recebem para sair delas. Não vos conserveis perto dos primeiros, não percais vosso tempo a pregar aos que não querem ouvir. Consagrai-o antes aos que se acham dispostos a enveredar pelo novo caminho.

Vosso tempo é precioso; ide, pois, trabalhar sempre na vinha do Senhor. Ela se abre em aléias diante de vós e borda o caminho, mas nem todas as cepas são boas. Quando houverdes tentado melhorar as que vos pareçam estéreis, se virdes que, mau grado aos vossos esforços, não dão fruto algum, deixai-as, seu tempo ainda não chegou, e passai a outras em que, com afetuosos e inteligentes cuidados, podereis observar o desenvolvimento dos sucos, que dão força e vida.

Não percais o vosso tempo. Trabalhai sempre com ardor, mas trabalhai caminhando para a frente, pois tendes que percorrer estrada longa para chegardes ao fim.

Sim, no dia do juízo, houve e haverá menos rigor para com as terras de Sodoma e de Gomorra, quer dizer: para com os Espíritos culpados que, imersos nas trevas, não tiveram socorro algum direto a fim de sair delas, do que para com "essa cidade", isto é, do que para com os Espíritos rebeldes e culpados que recusaram receber a luz que o Mestre ainda hoje lhes OS QUATRO EVANGELHOS (II) 181

envia por intermédio de seus novos discípulos, os apóstolos da nova revelação.

Sim, quem rejeitou todos os socorros para se tornar melhor é um Espírito obstinado no mal. Longa será por isso a duração das suas provas e expiações: eternidades de sofrimentos correspondendo a eternidades de faltas. Quer isto dizer que os sofrimentos ou torturas morais, apropriados e proporcionados às faltas, ao grau de culpabilidade, suportados na erraticidade após a morte, ao fim de cada existência sucessiva, e a reencarnação, nos mundos inferiores de expiação, se reproduzirão, para o Espírito culpado, até que, por meio de provações bem sofridas, deixe ele de se manter rebelde à lei de reparação e de progresso, segundo a qual se purificará, para tomar lugar entre os bons Espíritos, o que ocorrerá quando, por se haver tornado incapaz de praticar o mal, só o seja de praticar o bem.

Empregamos a palavra — eternidade, tendo em vista a vossa locução — penas eternas. Dizemos — eternidades: não percebeis que é figurado o sentido desse termo? A única eternidade existente, que se possa citar, é Deus. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 182

MATEUS, X, v. 16-22. —LUCAS, XII, v. 11-12

Prudência. — Simplicidade. —Desassombro diante dos homens. —Assistência e concurso do Espírito Santo

MATEUS: V. 16. Eis que vos envio como ovelhas para o meio de lobos; sede prudentes, pois, como as serpentes e simples como as pombas; — 17, mas, guardai-vos dos homens, pois que eles vos farão comparecer perante seus juízos e vos flagelarão em suas sinagogas. — 18. Sereis levados, por minha causa, à presença dos governadores e dos reis para dardes testemunho de mim diante deles e das nações. — 19. E, quando vos fizerem comparecer, não vos cause inquietação o como haveis de falar, nem o que direis; o que houverdes de dizer vos será dado na ocasião. — 20. Porquanto, não sois vós quem fala, é o Espírito do vosso Pai quem fala em vós. — 21.0 irmão dará morte ao irmão e o pai ao filho; os filhos se revoltarão contra os pais e lhes darão a morte; — 22, e todos vos odiarão por causa do meu nome; mas aquele que perseverar até ao fim será salvo.

LUCAS: V. 11. Quando vos conduzirem às sinagogas e à presença dos magistrados e poderosos, não vos cause inquietação o modo por que respondereis, nem o que direis; — 12, pois o Espírito Santo vos ensinará, na ocasião, o que for preciso que digais.

N. 139. Estas palavras de Jesus, conquanto aplicáveis a todas as épocas e a todos os homens de boa vontade, eram dirigidas principalmente aos apóstolos e se referiam às perseguições físicas. O Mestre os prevenia da sorte a que iam estar sujeitos eles e seus imitadores, no período, nos séculos que se seguiriam ao cumprimento da sua missão terrena, até aos tempos em que a intolerância, o fanatismo, a ignorância, a superstição, a ambição orgulhosa e cúpida, o despotismo religioso deixariam de ter sob o seu domínio e OS QUATRO EVANGELHOS (II) 183

por auxiliares os governadores, os reis, os magistrados, o braço secular; em que deixariam de fazer vítimas por meio das torturas, dos autos de fé, das fogueiras, e cederiam lugar, respeitada a vida dos homens, à liberdade de consciência e à liberdade de exame, já proclamadas entre vós e desfrutadas pelos povos verdadeiramente civilizados.

"Eu vos envio, dizia Jesus aos apóstolos, como ovelhas para o meio de lobos; o irmão dará morte ao irmão e o pai ao filho; os filhos se revoltarão contra os pais e lhes darão morte". Por esta forma ele os avisava das perseguições físicas que teriam de sofrer e das dissensões que surgiriam no seio da pátria, da família e nos lugares mais íntimos do lar doméstico.

Também vós, apóstolos da nova revelação, deveis esperar as perseguições, senão físicas, pelo menos morais. Todos os que se acham mais elevados do que aqueles que os cercam provocam a inveja destes.

Em o século que atravessais, no qual predomina o amor ao dinheiro, às dignidades, às honrarias, aos gozos materiais, à superstição e à religião mal compreendida, geralmente os homens, apenas sob o ponto de vista material, despertam a inveja dos que os cercam, pela fortuna que possuem, ou pela inteligência que demonstram no tocante às coisas da terra. Contudo não vos iludais: o sarcasmo, a zombaria são muitas vezes a máscara que cobre o sentimento instintivo da inveja. Os que de vós zombam sentem no fundo de seus corações que caminhais com maior segurança do que eles e que mais depressa alcançareis a meta.

As perseguições de que já sois e ainda sereis alvo são estas: Os escribas e os fariseus dos vossos dias vos perseguirão com seus ódios e suas injúrias, formulando contra vós as mesmas acusações que os escribas e fariseus de outrora faziam a Jesus: as de serdes agen- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 184

tes do demônio, do diabo, de satanás, as de charlatanismo e de loucura. Da parte dos materialistas e dos incrédulos tereis o sarcasmo e a zombaria.

Os homens são de tal feitio que, a fazerem qualquer esforço para galgar o cume da montanha e respirar aí um ar puro e vivificante, preferem miná-la pela base, correndo o risco de ser esmagados pelo seu desmoronamento. Essa a razão por que toda inteligência superior, por um aspecto qualquer, às das massas, se torna objeto das perseguições da ignorância, da cupidez, ou do orgulho, sempre que se constitui, na ordem moral e na ordem intelectual, órgão de uma verdade nova, de um novo progresso e, como tal, se choca com os prejuízos, as idéias aceitas, os interesses e as paixões humanas.

Sede, pois, disse também Jesus aos apóstolos, prudentes como as serpentes e simples como as pombas.

Tendo que fazer triunfar a divina moral que pregavam, os apóstolos, para o conseguirem, deviam empregar os meios que achassem à sua disposição, conservando íntegra a pureza de pensamento e de ação.

Não creiais, espíritas, que, para obterdes o triunfo das vossas máximas, das verdades imutáveis que pregais, devais falar em todas as ocasiões no mesmo tom, não. A ciência do pregador, do propagandista está em apropriar sua linguagem às inteligências daqueles a quem fala.

Se traçardes e seguirdes sempre uma só linha de proceder, em tal matéria, alcançareis êxito com uns e sereis mal sucedidos com outros.

Tende, portanto, a prudência da serpente. Não é que possais fazer vítimas, nem sufocar o desgraçado que apanheis. É que, dirigindo-vos a Espíritos orgulhosos e suscetíveis, cumpre avanceis com prudência. Enleai-os destramente com os vossos raciocínios, atai-os com os vossos exemplos, de tal sorte que, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 185

quando perceberem que procurais apoderar-vos deles, não mais lhes seja possível evitar esse benéfico contágio da moral prática.

Mas, para chegardes a semelhante resultado, nunca empregueis senão os meios que a simplicidade e a doçura vos facultem. Sobre vós mesmos é que deveis exercer todo o vosso império, de modo que as vossas vítimas só o sejam do vosso amor sem limites. Sede prudentes, pois, como a serpente e brandos como a pomba.

"Sereis levados, por minha causa, dizia Jesus aos apóstolos, à presença dos governadores e dos reis, para dardes testemunho de mim diante deles e das nações. Quando vos fizerem comparecer. quando vos conduzirem às sinagogas, à presença dos magistrados e dos poderosos, não vos cause inquietação o como haveis de falar, nem o que respondereis, nem o que direis; o que houverdes de dizer vos será dado na ocasião, pois o Espírito Santo vos ensinará, no momento mesmo, o que for preciso que digais; não sereis vós quem falará, mas o Espírito de vosso pai que falará em vós."

Se os apóstolos, homens saídos do povo, sem educação, sem maneiras, não depositassem confiança na inspiração, não teriam caminhado para a frente. A desconfiança de si mesmos os houvera paralisado. Certos de que a inspiração do Espírito Santo os ampararia, avançaram com passo firme para todas as lutas. As ciências, latentes neles, se desenvolveram, a assistência dos Espíritos do Senhor os fortificou e a obra se executou de modo tanto mais frisante, tanto mais notável para as massas, quanto ninguém ignorava donde provinham aqueles homens que, com facilidade, falavam as línguas estrangeiras, pleiteavam com suma eloqüência sua própria causa e as de seus irmãos, mostravam, finalmente, em tudo, um saber, um cabedal de conhecimentos que ninguém pudera supor possuíssem. Notai de passagem que em OS QUATRO EVANGELHOS (II) 186

parte alguma se diz que cada um deles era senhor de todas as ciências. Cada um tinha as suas especialidades, de acordo com os antecedentes de sua existência.

Eram médiuns inspirados e, conforme às circunstâncias e às necessidades da situação, audientes ou falantes.

Quando inspirados, o mecanismo da palavra lhes pertencia, só o pensamento lhes era dado.

Toda vez que, excepcionalmente, se fazia necessário, eles se tornavam médiuns falantes e, como tais, instrumentos, por assim dizer, dos Espíritos superiores que os guiavam e que, pela ação de seus perispíritos sobre os deles, atuando fluidicamente sobre o órgão da palavra, se serviam deste, fazendo-os dizer o que devia ser dito.

Espíritos elevados em missão, tinham os apóstolos grande aptidão para a comunicação com os Espíritos superiores, o que tornava suas mediunidades diferentes das vossas.

Para vós, a mediunidade ainda não chegou ao seu completo desenvolvimento e nem mesmo a compreendeis.

Que é o que se dá em certos casos, com o orador cuja linguagem de repente muda, sob a inspiração do momento; com o orador que, tendo-se preparado para tratar do assunto desta ou daquela maneira, se vê arrastado por uma força irresistível a desenvolvê-lo sob outro ponto de vista?

Cede, dizeis, à inspiração do gênio. — Mas, de que gênio, senão do Espírito que veio em seu socorro e lhe prestou momentaneamente auxílio, fazendo dele um médium inspirado, inconsciente muitas vezes da influência espírita a que ficou sujeito?

Aquelas expressões de que se serviu Jesus dirigindo-se aos discípulos: "o Espírito Santo", — "o Espírito de vosso pai" significam: os Espíritos supe- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 187

riores, inteligências superiores enviadas pelo Senhor para os guiar. Também tinham por fim fazer-lhes compreender quanto era elevada a inspiração. Não convindo que revelasse aos homens a escala espírita, Jesus não podia indicar mais do que o seu ponto de partida: "O Pai, Deus".

O Senhor não inspira diretamente o homem; envia-lhe seus Espíritos para que o guiem. Ora, os Espíritos que serviam a Jesus no desempenho da sua missão eram, temo-lo dito, Espíritos já elevados, assistidos, conseguintemente, por Espíritos ainda mais elevados.

A inspiração divina lhes vinha, pois, mais diretamente.

Pelas locuções Espírito Santo, — Espírito de vosso pai (vós o sabeis) se designam os Espíritos puros, os Espíritos superiores e os bons Espíritos que o Senhor envia para guiar ou inspirar os que têm por missão fazer triunfar a verdade.

Daí se segue que as palavras de Jesus, dirigidas aos apóstolos, se aplicavam também, no seu pensamento, a todos os homens de boa vontade que, então e de futuro, se constituíssem, com humildade e fé, os campeões da verdade.

Podeis e já tendes podido verificar a realidade desse apoio prestado ao fraco, quando lhe é necessário, não para que brilhe e prenda a atenção, mas sempre que seja preciso estabelecer uma verdade séria.

Ainda hoje, espíritas, o Espírito Santo vos ensinará o que devais dizer, ainda hoje fala em vós o Espírito de vosso Pai, pois que o Senhor manda seus bons Espíritos para vos guiar e inspirar, quando falais aos homens com humildade e fé, tendo em mira a vitória da verdade, a propagação da lei de Jesus e da nova revelação, que vem explicar e desenvolver em espírito e verdade essa mesma lei. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 188

"Todos os homens vos odiarão por causa do meu nome, dizia Jesus aos apóstolos, mas aquele que perseverar até ao fim, será salvo."

Nós, em nome do Cristo, vos dizemos a vós, espíritas: Sereis objeto do ódio e das injúrias dos homens que se acham ligados pelo interesse, pelo orgulho, pelo espírito de dominação e de intolerância, a esse passado prestes a esboroar-se e que em vão tentam manter de pé; dos sarcasmos, das zombarias e não raro das injúrias dos que, pela incredulidade, pela ignorância filha do orgulho, pelo materialismo, pelo sensualismo e pelos apetites materiais, se conservam afastados das vias do Senhor e repelem desdenhosamente e de intento, sem exame prévio e suficiente, sem o indispensável estudo teórico e experimental, a ciência espírita, a nova revelação. Certo já haveis tido ocasião de julgar do acerto destas palavras.

Imitai os discípulos de Jesus. Aquele que, verdadeiro espírita, dócil à voz do Mestre, caminhando nas pegadas dos apóstolos, perseverar até ao fim, será salvo, isto é, tomará lugar entre os bons Espíritos, conformemente ao grau de pureza e de elevação que haja atingido.

Nota da Editora — A palavra — Juízos, do versículo 17, de Mateus, foi substituída, pelos tradutores modernos, por — tribunais, ou por sinédrios. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 189

MATEUS, X, v. 23-27. —LUCAS, XII, v. 1-3 e VI, v. 39-40

Fugir às perseguições. — Imitar a Jesus. — Predição da revelação nova. —Fermento dos fariseus. A hipocrisia; nada oculto a Deus. — Cego conduzindo outro cego

MATEUS: V. 23. Quando, pois, vos perseguirem numa cidade, fugi para outra. Em verdade vos digo: Não tereis percorrido todas as cidades de Israel antes que o filho do homem venha. — 24. O discípulo não está acima do mestre nem o servo acima de seu senhor. — 25. Basta ao discípulo ser como o mestre e ao servo como o senhor. Se ao pai de família chamaram Belzebu, quanto mais a seus domésticos. — 26. Porém, não os temais; porquanto nada há oculto que não venha a ser revelado e nada secreto que não venha a ser conhecido. — 27. O que vos digo nas trevas, dizei-o vós às claras; e o que escutais no ouvido, pregai-o de sobre os telhados.

LUCAS: V. 1. Tendo-se reunido grande multidão em torno de Jesus, de tal sorte que todos uns aos outros se apertavam, entrou ele a dizer aos discípulos: Preservai-vos do fermento dos fariseus, que é a hipocrisia; — 2, porquanto, nada há oculto que não venha a ser conhecido. — 3. Assim, o que dissestes nas trevas será ouvido às claras; e o que houverdes dito no ouvido, dentro dos aposentos, será pregado de sobre os telhados.

VI, V. 39. Propunha-lhes também esta comparação: Pode acaso um cego guiar outro cego? Não cairão ambos no fosso? — 40. O discípulo não está acima do seu mestre; mas todo discípulo será perfeito, se for como seu mestre.

N. 140. As palavras de Jesus se aplicavam principalmente, no tocante às perseguições físicas, aos apóstolos e aos seus imitadores até à época do advento da liberdade de consciência e de exame, em que já respeitada seria a vida dos homens. Aplicavam-se es- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 190

pecialmente, atenta a profecia da vinda do filho do homem, aos tempos, marcados pelo Senhor, que se seguiriam à revelação do Espírito da verdade, da qual vos é portadora a era nova do Cristianismo do Cristo, a era espírita, aplicando-se igualmente à nova missão dos apóstolos e dos seus imitadores, missão que há de preceder a esse advento do Cristo, por ele próprio predito quando desempenhava a sua missão terrena. Sob todos os outros aspectos elas se referiam à época em que eram ditas e ao futuro, em todos os séculos.

Deveis imitar aquele que vos conduz. O amo não é mais do que o servo, quando o servo se coloca à altura do amo; altura moral bem entendido. Procedei, pois, como o vosso Mestre; praticai a moral que ele praticava e galgareis o fastígio da felicidade eterna.

"Quando vos perseguirem numa cidade, dizia ele aos apóstolos, fugi para outra!"

Com relação aos espíritas, que são e serão chamados a propagar a fé e a espalhar a nova revelação no seio dos povos verdadeiramente civilizados, os quais, portanto, não têm e não terão que temer e que sofrer senão as perseguições morais, aquelas palavras significam: Não descoroçoeis com os obstáculos e, se vos tiverdes que haver com Espíritos rebeldes e endurecidos, deixai-os por algum tempo e ide a outros a fim de os encaminhardes.

"Em verdade vos digo: "Não tereis percorrido todas as cidades de Israel antes que o filho do homem venha."

As cidades de Israel são, sob o véu da alegoria, todas as nações da terra, do mesmo modo que a geração a quem Jesus se dirigia é a geração de Es- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 191

píritos que, purificados com o auxílio do tempo, das expiações e das reencarnações sucessivas, executarão, nas épocas preditas, as coisas anunciadas.

O Cristo se manifestará ainda aos homens, quando forem chegados os tempos.

Espírito protetor e governador do vosso planeta, a cuja formação presidiu, encarregado do vosso progresso e de vos levar à perfeição, ele recebeu do pai, seu e vosso pai, vosso Deus e seu Deus, três missões. As duas primeiras consistiram em preparar, entre os homens, a realização do progresso físico do vosso mundo, do progresso físico, moral e intelectual da humanidade terrena e a da regeneração humana. A terceira consiste em levar a efeito a realização daquela obra, conduzindo-vos à perfeição.

A primeira ele a cumpriu desempenhando a sua missão terrena e continuou a cumpri-Ia no estado de Espírito invisível aos homens, com o concurso do Espírito Santo, isto é, dos Espíritos puros, dos Espíritos superiores e dos bons Espíritos, que, sob a sua direção, trabalham na sua obra.

A segunda é a da nova era que se abre diante de vós pela revelação espírita: a era do Espírito da Verdade, que vem, por intermédio dos messias, isto é, dos enviados especiais e dos missionários, errantes e encarnados, conduzir progressiva-mente as gerações humanas à verdade, ensinar-lhes todas as coisas e anunciar-lhes as que hão de vir.

A terceira ele a virá cumprir nos tempos preditos, como Espírito da Verdade, trazendo o complemento e a sanção da verdade, para vo-la mostrar sem véu. Manifestar-se-á então aos homens em todo o seu poder, em toda a majestade da sua pureza perfeita e imaculada, cercado dos Espíritos puros, dos Espíritos superiores e dos bons Espíritos, que vos terão preparado e levado a esses tempos, em que sereis, do mesmo passo, capazes e dignos de receber o Mestre e de suportar a verdade sem véu. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 192

Sim, tudo se cumprirá. Jesus preparou a infância, hoje prepara e vai desenvolver a inteligência da idade madura. Dentro em pouco virá colher os frutos de seus trabalhos e receber aqueles de seus discípulos que houverem aproveitado de seus ensinamentos.

Não vos equivoqueis a respeito do sentido destas palavras — dentro em pouco, nem do das de Jesus quando na terra falava do futuro, da aproximação dos tempos. Nós não contamos, sabei-o bem, os anos e os séculos na eternidade, como contais os minutos, as horas, os dias e os anos da vossa existência humana.

“O discípulo não está acima do mestre, nem o servo acima do Senhor: basta ao discípulo ser como o mestre e ao servo como o Senhor."

Aos olhos do Senhor eterno são iguais todas as condições sociais; conseguintemente, o senhor não é mais do que o servo. Só tem maior valor aquele que pratica, com humildade, a lei de amor que vos é ensinada. Só será igual ao mestre em moral aquele que praticar a moral.

Compreendam bem os homens, no seu princípio, no seu objetivo e nas suas conseqüências, a lei natural e divina da reencarnação, que lhes vem ensinar serem a vida humana e as condições sociais, para cada um deles, uma provação, ou uma expiação.

Compreendam e não esqueçam nunca que, pela pluralidade das existências e conformemente ao grau de culpabilidade, as provações e as expiações, tendo por fim a purificação e o progresso, são apropriadas às faltas cometidas nas encarnações precedentes. Assim, por exemplo, o senhor de ontem, duro e arrogante, que faliu nas suas provas como senhor, fossem OS QUATRO EVANGELHOS (II) 193

quais fossem, dentro da ordem social, sua posição ou seu poder na terra, é o escravo, o servo, ou o criado de amanhã. O sábio que ontem, materialista e orgulhoso, abusou da sua inteligência, da sua ciência, para desencaminhar os homens, para perverter as massas populares, é o cego, o idiota ou o louco de amanhã. O orador de ontem, que abusou gravemente da palavra para arrastar os homens ou os povos a erros profundos, é o surdo-mudo do dia seguinte. O que ontem dispôs da saúde, da força, ou da beleza física e gravemente abusou de tudo isso, é o sofredor, o doente, o raquítico, o deserdado da natureza, o enfermo de amanhã. Se é certo que os corpos procedem dos corpos, não menos certo é que são apropriados às provações e às expiações por que o Espírito haja de passar e que a encarnação se dá no meio e nas condições adequados ao cumprimento de tais provações e expiações. É o que explica como e porque, na mesma família, dois filhos, dois homens, nascidos do mesmo pai e da mesma mãe, se encontram em condições físicas tão diversas, tão opostas. De igual modo a diferença nas provações, a disparidade do avanço realizado nas existências precedentes explicam porque e como, do ponto de vista moral ou intelectual, esses dois irmãos se acham em condições tão diversas, tão opostas.

Compreenda o homem e não esqueça nunca que o mais próximo e mais querido parente de ontem, que o mais caro amigo da véspera podem vir a ser e são muitas vezes o estranho, o desconhecido do dia seguinte, que ele a todo instante poderá encontrar, acolher ou repelir.

Que, pois, os homens, cientes e compenetrados de que a vida humana e as condições sociais são provações e ao mesmo tempo meio e modo de amparo e de concurso recíproco nas vias da reparação e do progresso, pratiquem a lei de amor, partilhando mutuamente o que possuam de natureza material ou OS QUATRO EVANGELHOS (II) 194

intelectual, dando aquele que tem ao que não tem, dando de coração o auxílio do coração, dos braços, da bolsa, da inteligência, da palavra e sobretudo do exemplo. Então, quando tal se verificar, estarão cumpridas em toda verdade, sob os auspícios e a prática da fraternidade recíproca e solidária, estas palavras de Jesus: Basta ao discípulo ser como o mestre e ao servo como o senhor".

"Pode um cego guiar outro cego? Não cairão ambos no fosso?"

O cego que guia outro cego é aquele que, em vez de praticar a lei de amor, de a ensinar e exemplificar ao que é por ele guiado, se adstringe exclusivamente às práticas materiais, exteriores, e a elas mantém adstrito o outro a quem se encarregou de guiar e cujos olhos tapa com espessa venda, obstando-lhe assim a percepção da luz e da verdade. Ambos cairão no mesmo fosso: serão ambos submetidos à expiação. Mas, o cego que se fez guia de outro cego será mais culpado do que este e mais terá que expiar.

Se quiserdes guiar vossos irmãos, começai por examinar o vosso proceder, que deve ser irrepreensível. Se quiserdes dar um conselho, começai por praticar o que aconselhais, por vos absterdes do que censurais. Ensinai, pois, o caminho, percorrendo-o sem desvio, e então sereis discípulos de Jesus.

"O discípulo não está acima de seu mestre, mas o discípulo será perfeito se for como o mestre. "

Jesus, modelo de perfeição, vos diz, dessa forma, que o mestre não está acima do discípulo, porque o discípulo pode tornar-se igual ao mestre. Ora, como será isso possível, senão trilhando o discípulo, sem desvios, as pegadas do mestre, percorrendo passo a OS QUATRO EVANGELHOS (II) 195

passo a estrada que lhe este abriu, seguindo sempre os movimentos e a direção do modelo que o guia?

Palavras de humildade! Não estão elas cheias de encorajamento para vós outros? A esperança de chegardes um dia, pela aquisição da pureza perfeita, a igualar àquele que o Pai vos enviou como o tipo mais perfeito da humanidade, não é de molde a vos sustentar a coragem, a vos levantar as forças e a vos fazer marchar para diante, sempre para diante?

"Se ao pai de família chamaram Belzebu, quanto mais a seus domésticos."

Também estas palavras de Jesus, dirigidas aos discípulos, se referiam àquela época e aos então futuros tempos, a vós espíritas. Assim como o Mestre não foi compreendido pelos que lhe presenciavam as obras, incompreendidos serão igualmente e escarnecidos os que hoje tentam reavivar-lhe a lembrança e seguir-lhe os passos. Mas, a paciência, a perseverança triunfarão da malignidade e da calúnia.

"Não os temais, porém; porquanto, nada há oculto que não venha a ser revelado e nada secreto que não venha a ser conhecido."

Por maiores que tenham sido os esforços dos inimigos do Justo por impedi-lo, sua admirável doutrina não deixou de atravessar os séculos, progredindo sempre, não na sinceridade da prática, mas no número dos adeptos. Pois bem! ainda hoje, sejam quais forem os esforços que façam por lhe deter o vôo, alcançareis o fim, pois que a nova revelação vem, pelo Espírito da Verdade, continuar a obra de Jesus, alargando cada vez mais o espaço e o futuro aos Espíritos progressistas. Nada, portanto, do que o homem deva OS QUATRO EVANGELHOS (II) 196

saber poderá ficar oculto. E o homem chegou ao ponto em que o seu saber tem que aumentar rapidamente.

"Preservai-vos do fermento dos fariseus, que é a hipocrisia, porquanto, nada há oculto que não venha a ser revelado e nada secreto que não venha a ser conhecido."

Em nome do Cristo, nós vos repetimos estas palavras que ele dirigiu aos apóstolos, mas que, no seu pensamento, se aplicavam a todos os tempos e eram também dirigidas a todos os que se tornariam seus discípulos, sobretudo na época da nova revelação.

. O vosso pensamento, como o vosso proceder, precisam ser sempre puros aos olhos do Senhor. De que vos servirá iludir os homens, afetando semblantes de virtudes, se aquele que sonda os corações e as entranhas somente vir no vosso íntimo a hipocrisia? Para Deus nada há oculto, nada permanecerá oculto para os homens. Todos estes lerão, no passado como no futuro, o livro que têm aberto ante seus olhos. Mas, é necessário que o homem se ache em estado de compreender. Quem dá, para ser lido, à criança que apenas soletra em francês, uma obra de Schiller na língua materna? Quem haverá que peça a previsão das tempestades a um que não distinga o dia da noite.

Sabereis tudo o que os Espíritos do Senhor têm para vos ensinar, mas somente quando fordes bastante inteligentes para compreenderdes, quando estiverdes bastante adiantados nos estudos preliminares, a fim de vos preparardes para as classes de filosofia. Repetir-vos-emos as palavras ditas por Jesus a seus discípulos: Dá-se-vos o que podeis suportar; dar-se-vos-á progressivamente o que puderdes ir suportando.

"O que vos digo nas trevas, dizei-o às claras; e o que escutais no ouvido pregai-o de sobre os telhados; porquanto, o que dissestes OS QUATRO EVANGELHOS (II) 197

nas trevas será dito às claras e o que houverdes dito ao ouvido, nos aposentos, será pregado de sobre os telhados."

Pequeno sendo o número das inteligências capazes de o compreenderem, a Jesus não era possível espalhar abertamente a sua moral, por não encher de espanto e paralisar, a bem dizer, a boa vontade dos que o ouviam. Seus discípulos, porém, como homens que viviam entre os homens, esses, tendo que espargir a luz em diversos pontos ao mesmo tempo, não alarmariam tanto os espíritos fracos aos quais se dirigissem.

Falava à multidão apenas por parábolas, a fim de preparar as inteligências, sem as sobrecarregar com um fardo de peso excessivo para a fraqueza delas. Se pregasse a sua moral sublime em termos claros e precisos, houvera assustado a maioria dos ouvintes, que, percebendo o abismo entre as crenças que professavam e as novas crenças que lhes eram trazidas, não ousariam sequer uma tentativa para o transporem. As parábolas apresentavam aos espíritos orientais a vantagem de permitir que cada um procurasse dar-lhes interpretação que lhe parecesse mais apropriada e mais simpática. Desse modo se familiarizavam com as novas doutrinas ainda cobertas por véus, cabendo aos discípulos arrancar uma a uma, porém sempre sob o império e o véu da letra, as vendas que ocultavam a luz àquelas inteligências obscurecidas.

Novos apóstolos, que sois, do Cristo, chamados a propagar a nova revelação, imitai os discípulos de Jesus. O Espírito da Verdade desce para, despojando da letra o espírito, levantando o véu que Jesus teve que lançar e lançou sobre as suas palavras, explicar e desenvolvera sua doutrina simples e sublime, os fatos qualificados de mistérios, de milagres, os ensinos por ele dados, as revelações que fez, as promessas, OS QUATRO EVANGELHOS (II) 198

as predições ou profecias que formulou. Publicai e pregai o que assim vos ensinam os Espíritos do Senhor, missionários errantes e encarnados, órgãos do "Espírito da Verdade" no tocante à nova revelação. Arrancai uma a uma as vendas que ocultam a luz às inteligências obscurecidas. Paciência e perseverança; nós vos assistiremos.

Nota da Editora — No versículo 27, de Mateus, onde está — nas trevas, outros tradutores colocaram —às ocultas, às escuras. — OS QUATRO EVANGELHOS (II) 199

8 Três centavos.

MATEUS, Cap. X, v. 28-31. — LUCAS, Cap. XII, v. 4-7

Só temera Deus, sem cuja vontade nada sucede

MATEUS: V. 28. Não temais os que matam o corpo, mas que não podem matar a alma; temei sim aquele que pode precipitar tanto o corpo como a alma na geena. — 29. Não é verdade que dois pásseres se vendem por um asse?8 Pois, nenhum deles cai na terra sem ser pela vontade do vosso pai. — 30. Até os cabelos das vossas cabeças estão todos contados. — 31. Nada, portanto, temais; bem mais valeis do que muitos pásseres.

LUCAS: V. 4. E eu vos digo, meus amigos: Não temais os que matam o corpo e que, depois disso, nada mais têm que fazer. — 5. Vou mostrar-vos a quem deveis temer: Temei aquele que, depois de haver tirado a vida, tem o poder de lançar na geena; a esse sim, eu vos digo, temei. — 6. Não se vendem cinco pásseres apenas por dois asses? Entretanto, não há um só deles que Deus tenha esquecido. — 7. Até os cabelos das vossas cabeças estão contados. Não temais, pois; bem mais valeis do que muitos pásseres.

N. 141. Apropriando sempre sua linguagem à época e ao estado das inteligências, de modo a impressionar fortemente aqueles a quem falava, Jesus dirigia essas palavras aos discípulos, para infundir confiança a homens que se atemorizavam com a perspectiva das missões cheias de provas e de perigos que lhes eram confiadas. Dizendo-lhes que não temessem os que matam o corpo, mas que não podem matar a alma, que só temessem aquele que pode precipitar alma e corpo na geena, ensinava-lhes a não se arre- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 200

cearem dos homens, a não recuarem diante de nenhum perigo, de nenhuma perseguição, de nenhum ato dos homens, a só temerem a Deus. Dizendo-lhes que dois passarinhos não valem mais do que um asse, que cinco não valem mais do que dois asses, que nenhum deles cai na terra sem ser pela vontade do pai, que Deus de nenhum se esquece e acrescentando que todos os cabelos das vossas cabeças estão contados, que nada deveis temer, que valeis bem mais do que muitos passarinhos, o Mestre lhes inspirava a confiança sem limites que o homem deve depositar em Deus, os exalçava aos seus próprios olhos e lhes fazia compreender que, aos olhos do Senhor, muito mais importância tinham eles do que essas criaturas ínfimas, a cuja existência nenhum valor davam então os homens, ignorantes de que tudo sai do mesmo princípio, por efeito da mesma vontade.

Jesus foi o primeiro a dizer aos Hebreus que a onipotente bondade do Senhor vai ao ponto de não descurar a existência de tão fracas criaturas. Preparava-os, por essa forma, para compreenderem que muito embora o Espírito humanizado seja, como dizeis, o rei da criação, tudo o que se move no Universo, tudo o que existe só se move e existe pela vontade suprema de Deus que, com o mesmo paternal carinho, olha tanto para o oução, como para o rei da terra.

As palavras que dirigia a todos os homens, daquela época e do futuro, vos devem ser explicadas em espírito e em verdade, porquanto a letra mata e o espírito vivifica. E não foi senão por tomar a letra pelo espírito que a Igreja incorreu em todos os seus erros.

As palavras acima, objetivam mostrar ao homem que seu proceder, seus sentimentos devem ser regrados pela vontade daquele que pune ou premeia, daquele cujo infatigável amor vela continuamente pela menor das suas criaturas. Elas têm por objetivo estabelecer a OS QUATRO EVANGELHOS (II) 201

confiança que o homem deve depositar no seu Criador, cuja inteligência infinita pousa sobre o Universo, distinguindo no seio da massa geral as mínimas particularidades, sem jamais separar estas daquela. Exprimindo-nos assim, é nosso intento levar-vos a compreender a imensidade do olhar criador que paira sobre tudo, tudo envolvendo num golpe de vista infinito, sem, como vós outros, fazer distinção entre a massa, ou seja o conjunto do Universo, e os milhares de partículas que o compõem. Tudo, ainda o que se oculta nos mais recônditos escaninhos, se acha patente aos seus olhos. E, todavia, só o conjunto o toca.

"Não remais os que matam o corpo, mas que não podem matar a alma; temei, sim, aquele que pode precipitar a alma e o corpo na geena; a esse, sim, eu vos digo, temei."

Estas palavras não têm por fim, segundo o espírito, senão libertar o homem do amor de si mesmo e chamar-lhe a atenção para o que, nele, não pode perecer, isto é, para a inteligência, filha de Deus, que de Deus provém e que, partindo do infinitamente pequeno para chegar ao infinitamente grande, tem que voltar a ele, na individualidade e na imortalidade.

Os que tomaram a letra pelo espírito consideraram a geena um lugar material e circunscrito, um inferno, à maneira do Tártaro do paganismo, à maneira da cloaca, da caverna que o rei Josias mandara construir perto de Jerusalém e onde os Judeus lançavam as imundícies da cidade e os cadáveres privados de sepultura e onde se alimentava um fogo contínuo para consumir essas matérias vis e desprezíveis.

A palavra geena, despojado da letra o espírito, é uma expressão alegórica de complexa significação. A geena é a imensidade onde, quando errante, o Es- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 202

pírito culpado passa pelos sofrimentos ou torturas morais apropriados e proporcionados aos crimes e faltas por ele cometidos. O termo geena abrange também as terras primitivas e todos os outros mundos inferiores, de provações e expiação, onde, pela encarnação ou reencarnação, se vêem lançados os Espíritos culpados, a alma e o corpo que ela reveste, corpo que, para ela, é igualmente uma geena, como são, na erraticidade, aqueles sofrimentos ou torturas morais.

Não temais os homens. Quando vos for preciso, para salvar a alma, sacrificar o corpo, não recueis diante dos que o podem matar e nada mais. Temei, porém, a Deus que pode, se falirdes nas vossas provas, lançar-vos, por ato da sua justiça, que se exerce para vossa melhoria e vosso progresso, em a geena dos sofrimentos, das torturas morais na erraticidade após a morte, em a geena da reencarnação na terra e nos outros mundos inferiores de provações e expiação.

Sim, o homem não deve ver no seu corpo mais do que um invólucro, o aparelho, o instrumento das provações, das expiações, da purificação e do progresso do Espírito. Se, portanto, essa emanação divina que o corpo encerra, o Espírito, correr o perigo de perder-se ou mesmo de alterar-se, deve o homem sacrificar, sem pena, o invólucro perecível. O Espírito, que provém do Senhor, lhe deve a existência e não pode dar valor real senão ao que do Senhor o aproxima. Guarda do envoltório material, cumpre-lhe isentá-lo de todas as máculas; mas, se tiver de escolher entre a pureza espiritual e a do corpo, deverá preferir sacrificar esta para conservar aquela. Se, numa emergência perigosa, a vida do corpo se achar em paralelo com a do Espírito, isto é, com a sua pureza, com o seu progresso, se o Espírito se achar na iminência de incorrer numa culpabilidade que o levará à morte moral, deve a criatura sacrificar o vaso ao precioso perfume que OS QUATRO EVANGELHOS (II) 203

ele contém, deixar que se quebre aquele para que este possa escapar-se e subir como incenso odorífero aos pés do Criador.

"Dois pásseres não custam mais que um asse e cinco mais que dois asses; entretanto, nenhum deles cai na terra sem que seja pela vontade do pai, que de nenhum modo se esquece.-

Não é Deus a bondade infinita, cujo olhar criador, como já o temos dito, envolve, num só golpe de vista, todas as suas criaturas? Não é ele a vontade onipotente que governa o Universo? E tudo o que sucede não sucede com a sua permissão?

Todavia, não acrediteis que a sua grandeza infinita desça a ocupar-se com as particularidades da vossa existência ínfima. Uma vez, porém, que o seu poder regula todas as coisas, que os Espíritos prepostos à organização dos mundos, desde o ato da formação deles até as mais mínimas particularidades, não obram senão de conformidade com a impulsão superior que receberam e que, passando de um a outro, chega até vós, dizer-se pode que nem mesmo um passarinho cai na terra sem que seja pela vontade de Deus.

Não concluais desta explicação que o vosso livre arbítrio se ache assim comprometido de qualquer forma. A ação dos Espíritos, exercendo-se sob a potente direção do soberano Senhor, em nada altera essa prerrogativa do Espírito, encarnado ou não: — o livre arbítrio, emanação divina, eterna, que o Senhor concede a suas criaturas, fogo sagrado que nos cumpre alimentar para dele prestarmos contas ao foco imenso donde foi tirado.

"Até os cabelos das vossas cabeças estão contados."

Tomadas ao pé da letra, estas palavras de Jesus levariam à negação do livre arbítrio no homem, ao OS QUATRO EVANGELHOS (II) 204

fatalismo. Elas são alegóricas, como todas as que o Mestre, a título de ensinamento, proferiu. O homem goza da liberdade de praticar ou não um ato qualquer; mas, esse ato tem seu principio e suas conseqüências regrados nas leis naturais, imutáveis e eternas, cujas execução e aplicação ele provoca. Nada lhe sucede que não tenha sido previsto pela sabedoria infinita do Senhor, a qual, entretanto, deixa que os acontecimentos da vida humana sigam seu curso e sua marcha, conformemente ao uso que o homem faz do seu livre arbítrio. Se bem que, sujeito a experimentar as boas e más influências ocultas que de contínuo sobre ele procuram exercer-se, lhe caiba lutar entre o bem e o mal, o homem dispõe sempre do livre arbítrio, de uma vontade própria, pessoal e, pois, em virtude desse livre arbítrio, dispõe da faculdade de praticar tanto o bem como o mal. Depois da morte, procede-se à apuração dos pensamentos, palavras e atos, bons e maus.

Sim, a bondade infinita de Deus vela incessantemente pelas suas criaturas. É assim que, em lhe sucedendo qualquer coisa na existência terrena, a solicitude do Senhor, por intermédio dos bons Espíritos, faz sentir a sua influência no homem. Nenhum ato deste, nenhum dos seus mais secretos pensamentos escapam a Deus e, chegada a hora da prestação de contas, pode ele estar certo de que encontrará, no livro da vida, a sua página exatamente escriturada. O Senhor não abandona um só de seus filhos, não esquece uma só ação boa e não deixa impune nenhuma ação má.

Nota da Editora — Nas traduções modernas, a palavra — pásseres foi substituída por —passarinhos. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 205

MATEUS. Cap. X, v. 32-36. —LUCAS, Cap. XII, v. 8-9 e 49-53

Jesus veio trazer fogo à terra. —Não veio trazer a paz e sim o gládio, a divisão, a fim de que chegue a ser conhecido e até que o seja

MATEUS: V. 32. Aquele que me confessar diante dos homens, também eu o confessarei diante de meu Pai, que está nos céus. — 33. Aquele que me negar diante dos homens, também eu o negarei diante de meu Pai, que está nos céus. — 34. Não penseis que vim trazer paz à terra; não vim trazer a paz e sim o gládio; — 35, porquanto, vim separar de seu pai o filho, de sua mãe a filha e de sua sogra a nora; — 36, e o homem terá por inimigo os de sua própria família.

LUCAS: V. 8. Ora, eu vos digo que aquele que der testemunho de mim diante dos homens, dele o filho do homem dará testemunho diante dos anjos de Deus. — 9. Mas aquele que me negar diante dos homens será também negado diante dos anjos de Deus. — 49. Vim trazer o fogo à terra; e que é o que quero senão que ele se acenda? — 50. Tenho que receber um batismo e quão ansioso estou para que ele se cumpra. — 51. Pensais que vim trazer a paz à terra? Não, eu vo-lo digo, vim trazer a separação; — 52, porquanto, doravante, se numa casa se encontrarem cinco pessoas, estarão todas divididas, três contra duas a duas contra três; — 53, estarão divididos o pai contra o filho e o filho contra o pai; a mãe contra a filha, a filha contra a mãe; a sogra contra a nora e a nora contra a sogra.

N. 142. Não deveis ter dificuldade em compreender estas palavras de Jesus, claras por si mesmas e confirmadas pelos fatos.

(V. 32 e 33 de Mateus e v. 8 e 9 de Lucas): Aquele que, simples de coração e humilde de espírito, caminha pela senda da verdade, das boas obras, do OS QUATRO EVANGELHOS (II) 206

amor e da fraternidade, lei divina outorgada aos homens por Jesus, dá testemunho dele e se acha, por conseguinte, na única senda que leva à salvação. Jesus, o divino modelo que devemos imitar, conduz a porto de salvamento aquele que assim escolheu a boa estrada.

Aquele que, ao contrário, se embrenha pelos caminhos tortuosos, isto é, pelos caminhos do orgulho, do egoísmo, da hipocrisia, dos vícios e das paixões que degradam a humanidade, esse se afasta do alvo, renega o bom pastor, repudiando-lhe a doutrina, a lei. Ora, o bom pastor não o pode receber na classe dos bons Espíritos, nem apresentá-lo ao rei dos reis. Esse estará, portanto, renegado, até que dê testemunho do Cristo, tomando a sua senda, pela prática da sublime moral que ele personifica.

(V. 49 e 50 de Lucas): Jesus vinha trazer fogo à terra dando, pelo desempenho da sua missão terrena, lições e exemplos de fé, de esperança, de desinteresse, de abnegação, de devotamento, de caridade e de amor, de todas as virtudes, em suma, aos homens atrasados daquela época, enleados na teia dos abusos, dos preconceitos e das tradições que a sua doutrina saparia e que eram sustentados pelos escribas, pelos fariseus; pelos sacerdotes orgulhosos e cúpidos. Queria ele que esse fogo se acendesse, isto é, que os homens se grupassem em seu derredor para porem em prática aquelas lições, aqueles exemplos e espalhá-los pela multidão. Manifestava ardente desejo de receber o batismo que lhe estava reservado, isto é, de sancionar a sua missão pelo sacrifício do Gólgota, que a faria dar todos os seus frutos e prepararia o futuro advento da nova revelação.

(V. 51, 52 e 53 de Lucas): Trazendo aos Espíritos atrasados o progresso, Jesus ia provocar a luta entre os que desejariam enveredar pelo novo caminho e os preguiçosos ou obstinados que queriam permanecer estacionários. Ele via a divisão que a marcha e a OS QUATRO EVANGELHOS (II) 207

realização do progresso determinariam entre os homens e mesmo no seio das famílias. Assim foi e assim será ainda. Preparai-vos, portanto, pois que se, ao tempo da colheita, estivésseis todos maduros, inútil seria proceder-se a uma escolha entre vós e trazer-vos os raios da luz vivificante que acabará de dourar a messe que os Espíritos do Senhor vêm fazer.

(V. 34 e 35 de Mateus): Jesus antevia os acontecimentos, os ódios e as inimizades que nasceriam até entre os mais próximos parentes, sob o mesmo teto. Antevia o sangue que seria derramado em seu nome! Antevia sua doutrina, sua lei mal compreendidas e irreconhecíveis; substituídos por uma fé cega e falsa o amor, a caridade e a fraternidade, que ele declarou serem, para e entre todos os homens, toda a lei e os profetas. Antevia os massacres levados a efeito em seu nome, as lutas sangrentas e fratricidas que em seu nome se travariam entre os homens, apesar de lhes ele haver dito: "Vós todos sois irmãos". Antevia as torturas praticadas, as fogueiras acesas, em seu nome! pela intolerância, pelo fanatismo, pela superstição e pela ambição dominadora.

Sim, Jesus via já então as ondas de sangue que jorrariam desde o sacrifício do primeiro mártir, até o dia vindouro da paz universal. Desgraças foram sem dúvida, pois provam a que ponto os Espíritos na terra estavam e estão ainda atrasados. Mas, foram desgraças necessárias, por isso que o sangue dá lugar à regeneração.

Dissemos — "dia vindouro da paz universal". O estado atual das coisas não vos dá a compreender que a paz universal, cujo reinado se há de implantar na terra, ainda está longe de espalhar seus benefícios civilizadores?

Com o abrir, para vós, a nova revelação esta era nova, os Espíritos do Senhor vêm, tal qual Jesus com o OS QUATRO EVANGELHOS (II) 208

desempenho da sua missão terrena, atear novamente fogo à terra; trazer, não a paz, mas a divisão.

O Espiritismo é ainda, com efeito, Jesus presente entre vós; é ainda essa influência que impele o homem para o progresso e lhe abre a estrada por onde chegará mais depressa. Quando mesmo, por último, vier o Mestre completar, pela separação do joio e do bom grão, a obra que adiantamos, haverá divisão entre vós, porquanto, qualquer que seja o vosso progresso, haverá ainda Espíritos atrasados. A divisão entre os homens será sempre a propulsora do progresso até ao dia em que, acabada aquela separação, completada assim a obra de Jesus, todos os Espíritos rebeldes, voluntariamente cegos, tenham sido relegados para mundos onde possam melhorar. Só então a missão do Cristo se tornará em missão de paz. Depois de ter sido até aí rei da justiça, ele será "rei de Paz" .

Apressai, pois, espíritas, por todos os vossos esforços, o advento dessa nova era, aplainando as dificuldades que se apresentam de todos os lados. Trabalhai com ardor por arrancar os parasitas que sufocam a vinha do Senhor. Esclarecei as inteligências obscuras, sustentai os fracos, ajudai vossos irmãos a chegar ao ponto em que vos achais, a fim de que, vendo todos a luz, ela a todos igualmente ilumine. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 209

MATEUS, Cap. X, v. 37-39. LUCAS, Cap. XIV, v. 25-27

Amor da família. — Cumprimento do dever acima de todas as coisas. — Paciência e resignação nas provações terrenas

MATEUS: V. 37. Aquele que ama a seu pai ou a sua mãe mais do que me ama, não é digno de mim; e aquele que ama a seu filho ou a sua filha mais do que me ama, de mim não é digno. — 38. Aquele que não toma sua cruz e me segue não é digno de mim. — 39. Aquele que acha sua vida a perderá e aquele que perder a vida por minha causa a encontrará.

LUCAS: V. 25. Jesus, voltando-se para a multidão que o acompanhava, disse: — 26. Aquele que vem a mim e não odeia a seu pai e a sua mãe, a sua mulher, a seus filhos, a seus irmãos, a suas irmãs e até a sua própria vida, não pode ser meu discípulo; — 27, e aquele que não toma sua cruz e me segue não pode ser meu discípulo.

N. 143. Muitíssimo comentados têm sido estes versículos. Foram, porém, mal compreendidos, ou não o foram judiciosamente por homens que não souberam levar em conta os tempos, os lugares e as inteligências a que Jesus falava. Sem procurarem penetrar-lhes o espírito, detiveram-se na letra, atendo-se principalmente a um termo que, com significação demasiado forte na vossa linguagem, a tradução emprestou ao Mestre. A expressão que na língua hebraica corresponde a esse termo não tem tanta energia e não encontrou equivalente da parte dos tradutores.

Compreendei, primeiramente, em espírito e verdade, conforme ao espírito que vivifica e não segundo a letra que mata, as palavras de Jesus, o pensamento a que servem de roupagem, o ensinamento que delas decorre. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 210

Para o homem, o único interesse deve ser o do futuro de seu Espírito. Se, portanto, um laço humano qualquer é de molde a desviá-lo do caminho que deve trilhar, cumpre se liberte dele.

Não suponhais que Jesus tenha pretendido pregar e que nós vos preguemos em seu nome o egoísmo místico e a secura de coração. Longe disso, pois o homem pode amar a seu Deus acima de todas as coisas e, contudo, ou antes: com mais forte razão, isto é, por isso mesmo, cumprir todas as obrigações que os deveres para com a família lhe imponham, quaisquer que sejam as dissensões existentes entre o pai e o filho, a mãe e a filha: dissensões no modo de pensar.

Ele pode e deve cumprir todas as obrigações humanas no que tenham de mais escrupuloso.

O que Jesus quis fazer sentir é que, por condescendência ou por um interesse humano qualquer, a ninguém será lícito jamais renegar a lei de amor que ele veio pregar.

Não pratiqueis, portanto, nenhuma ação repreensível, tendo em vista satisfazer a esta ou àquela pessoa, objeto do vosso amor na terra, pois, do contrário, renegareis o vosso Mestre, que a seu turno vos renegará.

"(V. 37 de MATEUS): Aquele, disse Jesus, que ama a seu pai ou a sua mãe mais do que me ama não é digno de mim; e aquele que ama a seu filho ou a sua filha mais do que me ama não é digno de mim."

Aquele que, por agradar a seu pai ou à sua mãe, a seu filho ou à sua filha, cometer um ato contrário aos ensinos de Jesus não é digno dele, não pode ser seu discípulo. Jesus personificava e personifica a sua doutrina moral e, por conseguinte, a fé. Como poderia ele, modelo de amor, condenar o amor da família? Certo não vos passa tal coisa pela mente. O Mestre o que fez foi atacar o abuso. Por mais vivo que seja, o OS QUATRO EVANGELHOS (II) 211

amor da família jamais deverá levar o homem a um ato culposo. Admitido que haja atos desculpáveis pelo motivo que os determinou, quantos homens não se julgariam absolvidos de qualquer ação má, desde que pudessem acoitar-se por trás do devotamento à família!

Como lição, Jesus praticava, aos olhos dos homens, o mandamento: honra a teu pai e a tua mãe; mas também lhes lembrava que, acima de tudo, está o dever a cumprir. Recordai-vos da resposta que deu a Maria quando esta e José voltaram a Jerusalém à sua procura e o encontraram no templo entre os doutores. (Tomo I, n. 47, pág. 211-213).

"(V. 38 de MATEUS): Aquele que não toma sua cruz e me segue não é digno de mim. não pode ser meu discípulo."

Aquele, que não aceita com resignação e mesmo com reconhecimento as provações de que está cheia a vida humana, não é digno de Jesus, não pode ser seu discípulo. Jesus as aceitou, para o progresso de todos, como lição e exemplo aos homens, pois nenhuma lhe cumpria sofrer. Assim, cada um deve submeter-se às suas provações em proveito do seu próprio adiantamento.

"(V. 39 de MATEUS): Aquele que acha a sua vida a perderá e aquele que perder a vida por minha causa a encontrará."

Estas palavras, dirigidas especialmente aos discípulos, eram, para eles, uma advertência. Objetivavam fazer-lhes compreender que aquele que falisse no desempenho da sua missão, por conservar a vida humana, renunciaria ao acabamento da obra, perderia a vida espiritual; que, ao contrário, aquele que não recuasse diante da morte e a sofresse para levar a cabo a obra, teria a vida eterna. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 212

De modo geral e referindo-as a todos os tempos e a todos os homens, aquelas palavras de Jesus exprimem este pensamento: a vida do Espírito é a única existência real; logo, se, durante a encarnação, o Espírito pratica um ato repreensível tendo em vista conservar o corpo, perderá a vida espiritual, pois fica obrigado a recomeçar suas provações numa nova encarnação. Aquele que, contrariamente, sacrificar o corpo, quando for inevitável, para não falir nas suas provações, receberá, num mundo melhor, a recompensa das provas bem suportadas, à custa até daquele sacrifício.

"(V. 26 de LUCAS): Aquele que vem a mim e não odeia a seu pai e a sua mãe, a seus filhos, seus irmãos, suas irmãs e até a sua própria vida não pode ser meu discípulo."

Esta expressão "não odeia ", oriunda das traduções, muito forte na vossa língua, não tem, já o dissemos, tanta energia na língua hebraica, onde o termo empregado não encontrou equivalente nos vossos idiomas.

Jesus lançava uma semente que tinha de frutificar em solo árido e ingrato. Precisava, conseguintemente, que fosse vigorosa, para nele enterrar as raízes. Supondes que se pudesse falar aos homens de então, sobretudo aos hebreus, a linguagem de que vos servis? Imaginais que, daqui a alguns séculos, vossos descendentes não acharão que dizer das palavras que aceitais com admiração? Não tenteis enfiar num povo as vestes de outro. Deixai a cada um o que lhe foi, o que lhe é necessário. Tendes a pretensão de admirar os autores antigos; admitis a linguagem de que usaram, tão diferente da vossa, sob o pretexto de que estava adequada ao século em que viveram e não quereis que seja assim tratando-se da era em que na terra apareceu Jesus, que não falava a sábios habi- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 213

tuados às elegâncias e aos apuros de linguagem, mas ao povo, atrasado, material, endurecido que, para se decidir a compreender, precisava ouvir palavras enérgicas e observar exemplos frisantes.

Não; por aquelas palavras não pretendeu Jesus condenar e não condenou o amor da família, mas o excesso que, em tudo, prejudica o homem e o transvia. O homem deve consagrar-se à família, cumprir devotadamente todos os deveres para com ela, mas não deve fazer disso um culto, não deve sacrificar ao amor que consagra a seus parentes os interesses, a felicidade de seus irmãos em Deus. Fora egoísmo.

Jesus, cheio de amor e devotamento para com todos, empregava as expressões que mais impressionassem seus ouvintes, visando libertá-los desse egoísmo e fazer-lhes compreender que, como já o dissemos, devendo ser o futuro do Espírito o único interesse do homem, desde que um laço qualquer humano o possa desviar do caminho que lhe cumpre trilhar, importa que ele se desprenda desse laço. Para ser discípulo de Jesus, jamais será lícito ao homem, sob o pretexto do amor aos seus ou para conservar a vida humana, praticar um ato contrário aos ensinos do Mestre, à moral que ele personifica.

Nota da Editora — Nas traduções modernas, o verbo odiar, do versículo 26, de Lucas, foi substituído por — aborrecer. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 214

LUCAS, Cap. XIV, v. 28-33

Examinar antes de obrar. —Não parar na estrada do progresso. —Não dar apreço aos bens materiais senão como meio de fazer caridade

LUCAS: V. 28. Qual aquele dentre vós que, desejando edificar uma torre, não orça de antemão, com vagar e calma, a despesa necessária, para saber se tem com que acabá-la, — 29, a fim de não suceder que, por não poder acabá-la depois de lhe haver lançado as fundações, todos os que a vejam entrem a escarnecê-lo, 30, dizendo: Este homem começou a construir, mas não pôde acabar? — 31. Ou, qual o rei que, tendo de entrar em guerra contra outro rei, não examina antes, com vagar e calma, se pode marchar com dez mil homens contra o inimigo que vem ao seu encontro com vinte mil? — 32. Se o não pode fazer, manda embaixadores, quando o inimigo ainda está longe, e lhe apresenta proposta de paz. — 33. Assim, pois, aquele dentre vós que não renunciar a tudo o que tem, não pode ser meu discípulo.

N. 144. (V. 28, 29 e 30): Antes de entrar em uma nova via, o homem precisa verificar se terá a enérgica vontade de percorrê-la, pois não é bom que pare depois de haver começado o percurso da estrada do progresso. Uma vez despojado ele do invólucro material, o tempo perdido se lhe patenteia e amargo será o seu pesar ao apreciar o caminho que houvera percorrido, se perseverara, e o que lhe resta por palmilhar. A indecisão aumenta as dificuldades.

(V. 31 e 32): Aquele que não se sentir com a força necessária para levar a cabo grandes coisas, não as empreenda. Espere e fortaleça-se; estude e trabalhe sobre si mesmo, mas não se aventure a tentativas infrutíferas. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 215

(V. 33): Para marchar na via do progresso, da caridade universal, cumpre que o homem se desprenda dos bens materiais, que não lhes crie afeição, que os tenha unicamente como meio de conseguir o bem e o alívio de seus irmãos. Renunciar ao que se possui não é deitá-lo fora, não é desfazer-se de tudo. É não se apegar aos haveres, é não os querer senão visando o bom emprego que se lhes possa dar. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 216

MATEUS, Cap. X, v. 40-42 e Cap. XI, v. 1

Aquele que cumpre a lei de amor e de caridade terá sua recompensa

MATEUS: V. 40. Aquele que vos recebe a mim me recebe; e aquele que me recebe recebe o que me enviou. — 41. Aquele que recebe o profeta como profeta receberá a recompensa do profeta; e aquele que recebe o justo na qualidade de justo receberá a recompensa do justo. — 42. E todo aquele que der de beber a um destes pequeninos, só por ser dos meus discípulos, um copo d'água fria, em verdade vos digo, não perderá sua recompensa.

XI, v. 1. Logo que acabou essas instruções a seus doze discípulos, Jesus partiu a ensinar e pregar nas cidades vizinhas.

N. 145. O sentido e o alcance destas palavras, dirigidas por Jesus, como ensino, aos homens de então e do futuro, se podem resumir da forma seguinte: Aquele que deposita fé em Deus e procede tendo em vista a vida eterna, tendo em vista cumprir a lei de amor e de caridade, obterá a recompensa reservada ao fiel.

As palavras do v. 40 eram endereçadas aos apóstolos: Aquele que recebe os vossos ensinamentos recebe os meus e quem recebe os meus ensinamentos recebe os daquele que me enviou.

As do v. 41 são simbólicas: Aquele que proceder com louvável intuito será recompensado pela sua intenção.

Quanto às do v. 42, podeis explicá-las como encerrando, para todos os homens, a seguinte lição: O bem que fizerdes vos será contado, por menor importância que tenha o vosso ato e seja qual for a dos irmãos que aliviardes ou socorrerdes. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 217

LUCAS, Cap. X, v. 1-12 e 16

Missão e instrução dadas aos setenta e dois discípulos

LUCAS: V. I. Algum tempo depois, o Senhor escolheu setenta e dois outros discípulos e os enviou dois a dois, precedendo-o, a todas as cidades e a todos os lugares aonde ele próprio tinha que ir; — 2, e lhes dizia: A seara na verdade é grande, mas poucos os trabalhadores; rogai, pois, ao dono da seara que mande trabalhadores para ela. — 3. Ide; eu vos envio como cordeiros para o meio de lobos.— 4. Não leveis bolsa, nem alforje, nem sandálias e a ninguém saudeis pelo caminho. — 5. Ao entrardes em qualquer casa, dizei primeiramente: paz a esta casa. — 6. Se aí estiver algum filho da paz, a vossa paz ficará com ele; senão, voltará para vós. — 7. Permanecei na casa comendo e bebendo do que nela houver, porquanto o obreiro é digno do seu salário; não andeis de casa em casa. — 8. Quando entrardes numa cidade qualquer onde vos acolham, comei do que se vos apresentar; — 9, curai os doentes que aí encontrardes e dizei-lhes: O reino de Deus está próximo de vós. — 10. Mas, se entrando nalguma cidade, não vos receberem, ide pelas ruas e dizei: -11. Sacudimos contra vós até a poeira da vossa cidade, que se agarrou aos nossos pés; sabei, todavia, que o reino de Deus está próximo. — 12. Digo-vos que nesse dia os de Sodoma serão tratados com mais indulgência do que os de tal cidade — 16. Aquele que vos escuta a mim me escuta; aquele que vos despreza a mim me despreza; e o que me despreza despreza aquele que me enviou.

N. 146. Jesus deu aos setenta e dois discípulos as mesmas instruções que dera aos apóstolos. Já explicamos, nos ns. 127 e 139, os v. 2 e 3 e do n. 132 ao n. 138, os v. 4 a 12. Não temos necessidade de voltar a esses pontos. Todavia, algumas passagens há a respeito das quais precisamos dar-vos explicações especiais. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 218

"Não saudeis a ninguém pelo caminho", disse Jesus aos setenta e dois discípulos. Preciso é tirar da letra o espírito. Por essas palavras, Jesus lhes recomendava: "Não vos deixeis desviar da senda em que ides; não pareis; avançai para a vossa meta até que a tenhais alcançado".

Vejamos as expressões do v. 6: filhos da paz — a vossa paz. Por filhos da paz designava Jesus os que estavam dispostos a enveredar pela nova estrada que os faria adiantarem-se nas vias do Senhor. A paz dos discípulos se deve entender no mesmo sentido. Por essa paz se compreendem a fé e os conhecimentos que possuíam e que para eles voltavam desde que se achassem num meio refratário a aceitá-los.

"Permanecei na mesma casa; não passeis de uma casa para outra". Por esta maneira Jesus aconselhava aos discípulos a perseverança. As mudanças comprometeriam os resultados que eles tinham de visar e que só perseverando alcançariam.

"Comei e bebei do que na casa houver e vos for apresentado; porquanto o obreiro é digno do seu salário".

Os discípulos davam o alimento do espírito e recebiam de outros o alimento do corpo. Nem só pelo Espírito vive o homem. Importa-lhe, pois, prover as necessidades do corpo. Mas os discípulos tinham que se limitar à satisfação da necessidade e davam gratuitamente o que gratuitamente haviam recebido.

Longe disso está o que fazem aqueles que, dizendo-se discípulos de Jesus e sucessores dos apóstolos, mas pretextando que o obreiro é merecedor do salário, traficam com as coisas de Deus e recebem paga pelas suas orações; que se esforçam por conseguir o bem-estar material, a voluptuosidade, o luxo, o fausto; que desse modo vivem à custa de seus irmãos, absorvendo inutilmente a alimentação, o pão cotidiano de inúmeras famílias. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 219

Todo aquele que quiser ser discípulo de Jesus, seja padre ou pai de família, Judeu ou Gentio, tem que se contentar com o necessário; procurar o luxo, nunca. Possuindo mais do que o necessário, deixa o homem de ser discípulo do Mestre, que deu na terra a lição e o exemplo da humildade, do desinteresse, da abnegação, do devotamento, da caridade e do amor, que cada um deve ter e praticar com seus irmãos.

"Aquele que vos escuta, disse Jesus aos setenta e dois discípulos, a mim me escuta; aquele que vos despreza a mim me despreza; e o que me despreza a mim, despreza aquele que me enviou."

Estes dizeres se aplicavam aos apóstolos e aos discípulos escolhidos que, uns e outros, tinham sempre a assistência e o concurso do 'Espírito Santo", isto é, dos Espíritos superiores que constantemente os acompanhavam no desempenho de sua missões e que, assim, como ecos fiéis dos ensinamentos do Mestre, os repetiam e punham em prática, juntando desse modo, entre aqueles a quem pregavam, o exemplo à palavra.

Apoiando-se nessas proposições de Jesus, os homens se arrogaram o direito de vida e de morte sobre a alma. Não compreenderam que não se confia a execução da obra senão ao operário que se sabe capaz de executar e que não basta tenha sido hábil o pai para que o filho o seja igualmente.

Enviando os discípulos que escolhera para transmissores da sua palavra, com autoridade para abençoar ou reprovar, Jesus não deu esse direito a quem quer que entendesse de exercê-lo. Conquanto um Gentio pudesse expulsar os demônios em seu nome, ainda assim preciso era que o invocasse seriamente, isto é, com fé viva, humildade, caridade e amor. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 220

Disse Jesus aos discípulos: parti; ide levar a minha palavra a todas as cidades e a todas as povoações; ide pregar a boa nova. A verdade vos pôs nas mãos o seu facho; iluminai com seus ardentes raios todas as inteligências. Que a luz se espalhe. Ai dos que se recusarem a vê-la; em torno desses, mais densas se farão as trevas. Não condeneis os que a repelem. Sacudi a poeira de vossos pés, isto é, afastai-vos sem deles nada aceitar, ou levar, nem mesmo a poeira que vossos passos levantem. Esses serão tratados com mais rigor do que os de Sodoma e Gomorra, por isso que se lhes mostrou a luz e eles fecharam os olhos; por isso que se lhes fez ouvir a palavra de paz e taparam os ouvidos.

Os que, aplicando a si mesmos as palavras do Mestre, se investiram do poder de ligar e desligar, esqueceram que Jesus recomendava aos discípulos que não se munissem de duas túnicas, nem de dois pares de sandálias. Nisto, como em tudo, cada um tomou o que lhe convinha, sem se importar com o resto.

Dando aquele poder aos discípulos, Jesus lhes proibiu, ao mesmo tempo, que cogitassem do bem-estar pessoal, que recebessem coisa alguma em troca de seus ensinamentos, de suas preces, que se preocupassem com o bem-estar, de qualquer natureza que fosse.

Como procederam os que interpretaram ou aplicaram as palavras do Mestre? Como ousaram, desde o momento em que se tiveram por herdeiros dos poderes que Jesus conferira a seus discípulos, transgredir suas vontades ao ponto de passarem a vida no fausto e na voluptuosidade, ligando e desligando do alto de seus tronos, pregando o desprendimento, a abstinência, do seio do luxo e da abundância, lavando os pés de alguns desgraçados e consentindo (cheios de humildade) que lhes beijem os seus? OS QUATRO EVANGELHOS (II) 221

Por vergonha sua, o homem não compreende que a única maneira de erigir para si um trono consiste em assentá-lo no exemplo de uma vida austera e humilde, esforçando-se por trilhar as pegadas do Cristo, por imitar seus apóstolos e discípulos, praticando os ensinos e a doutrina moral do Mestre.

Quão maior seria o poder desses homens que se dizem herdeiros dos apóstolos, quão mais persuasivas e escutadas seriam suas vozes, quão mais obedecidos e respeitados seriam eles se, pelo exemplo, pregassem as virtudes que apenas lhes caem dos lábios rosados, como uma ironia atirada à face dessas pobres, macilentas e miseráveis criaturas, a quem pregam o desprendimento dos bens deste mundo!

Não está, porém, dentro deste quadro a nossa tarefa atual, por isso encerramos aqui as nossas observações. A cada dia basta o seu labor. As virtudes que hão de atrair os homens virão um dia assentar-se, ativas e benevolentes, no cume da montanha.

Somente os que em tudo se esforçam por seguir os passos do Cristo, os que imitam seus apóstolos e discípulos, os que praticam sinceramente suas lições, sua doutrina moral, têm o direito, sejam o que forem, padres ou leigos, Judeus, ou Gentios, de se dizerem discípulos de Jesus, herdeiros dos apóstolos e de aplicarem a si mesmos estas palavras suas: "Aquele que vos escuta a mim me escuta; aquele que vos despreza a mim me despreza; e o que me despreza a mim despreza aquele que me enviou".

Essas palavras do v. 16 também se aplicam hoje a vós outros, novos discípulos de Jesus, que, guiados e inspirados pelos Espíritos do Senhor, sois chamados a divulgar a nova revelação, a pregar em espírito e em verdade e a desenvolver, de acordo com essa revelação, a lei do Cristo, seus ensinamentos, sua moral. Sede os legítimos descendentes e herdeiros dos após- OS QUATRO EVANGELHOS (II) 222

tolos, caminhando constantemente nas suas pegadas, pela prática constante do dever e de todas as virtudes. Que nenhuma nódoa venha a sujar a branca túnica de que vossas almas se revestiram. OS QUATRO EVANGELHOS (II) 223

LUCAS, Cap. X, v. 17-20

Regresso dos setenta e dois discípulos. Seus nomes escritos nos céus

V. 17. Os setenta e dois discípulos voltaram cheios de alegria, dizendo: Senhor, até os demônios se nos submetem em teu nome. — 1S. E Jesus lhes disse: Eu via satanás caindo do céu como relâmpago. — 19. Vedes que vos dei o poder de esmagar as serpentes, os escorpiões e todo o poder do inimigo; nada vos causará dano. — 20. Contudo, não vos alegreis por vos estarem os espíritos submetidos, alegrai-vos antes por estarem os vossos nomes escritos nos céus.